Sinagoga Kahal Zur Israel, Recife, Século XVII
Na penúltima vez que estive em Recife esta sinagoga ainda não estava aberta ao público. Mas recentemente, visitando o nordeste, pude verificar este grande marco do Brasil colônia que foi a primeira sinagoga oficial de todas as Américas: Sinagoga Kahal Zur Israel (ou Congregação Rochedo de Israel). Aberta no Período em que Recife era o centro do governo holandês. A foto mostra o nome da Rua dos Judeus, onde ela está localizada. Este era o antigo nome da rua. Hoje em dia chama-se Rua do Bom Jesus.
Diz-se que foi a primeira sinagoga oficial porque sabemos da existência de uma sinagoga anterior: Maguen Abraham (Escudo de Abraão). Tudo indica que esta ficava na antiga ilha de Antônio Vaz, que depois se chamou Maurícia. Mas até hoje ainda não foram encontrados vestígios arqueológicos desta sinagoga. Há relatos também de sinagogas formadas em pequenas comunidades na Paraíba e na Bahia.
No século XVI é certo houve um grande número de judeus vindo para o Brasil. Quando as prisões portuguesas foram esvaziadas e seus presos trazidos para o Brasil com a intenção de popular a terra, muitos dos que se encontravam presos eram novo-cristãos que haviam sido presos por continuarem praticas judaizantes. Ainda que Portugal estivesse sob orientação da Inquisição, havia um grande problema nas mãos do reinado: a necessidade de popular a terra descoberta, com terras costeiras de perímetro generoso e defendê-las mesmo assim contra invasores. Isto tudo para um dos menores países europeus com uma população também pequena.
Rua do Bom Jesus antiga Rua dos Judeus, Recife, PE
Com a invasão holandesa, o Nordeste brasileiro passa a ser regrado pelas leis e costumes dos invasores. Assim um grupo de judeus vem se estabelecer no Novo Mundo, contando com a liberdade religiosa já existente no país flamengo. Foi só nesta época que a sinagoga Kahal Zur Israel esteve ativa sendo sustentada por 180 famílias de judeus brasileiros e europeus no Recife.
Junto a esta sinagoga havia duas escolas religiosas: Etz Hayim e Talmud Torah. Mas estas não foram recuperadas. O que se tem hoje é o edifício onde o templo exercia suas funções religiosas. Ocupava duas casas, como pode ser visto na foto da fachada postada anteriormente. A comunicação entre as duas casas era feita por uma única pequena porta bem na frente; enquanto que o acesso ao segundo andar era feito exclusivamente por uma das casas, através de uma bela escada de madeira nos moldes do mobiliário vistos aqui.
Interior da sinagoga; segundo andar.
Hoje o andar térreo desta sinagoga está dedicado a uma exposição permanente da história desta comunidade judaica que construiu e estabeleceu este templo. Pode-se ver as escavações do local, que passou para as mãos de João Fernandes Vieira, em 1656. Podemos ver os alicerces da construção e examinar o piso original holandês, a descoberto depois de terem sido encontrados 8 diferentes níveis, principalmente porque a história do edifício inclui diversas funções. Em1679 o prédio foi doado aos padres da Congregação do Oratório de Santo Amaro. Daí por diante há uma troca constante de funções sendo que até recentemente era uma casa de material elétrico. No térreo pode-se observar também o muro de contenção das águas do rio Beberibe, a fundação do Micvê, assim como vitrines com pedaços de louça, cachimbos, faiança, utensílios de barro esmaltado trazidos tanto pelos colonizadores portugueses como pelos holandeses.
Fragmentos de louça encontrados nas excavações
No primeiro andar está a sala de orações. Esse espaço está hoje destinado ao publico participante de conferências e seminários sobre a cultura judaica que fazem parte dos estudos realizados no centro de pesquisa localizado no andar de cima. O mobiliário desta parte foi construído de acordo com os moldes usados nos Países Baixos na época. Enquanto que o formato e o material do teto da sinagoga são baseados nas sinagogas da península ibérica do século XVII. A arca que contém a Torah está em frente ao púlpito. O salão do serviço religioso se encontra na direção leste, como requerido. No mezanino ficava a parte reservada às mulheres, que acompanhavam as cerimônias religiosas, separadamente. No segundo andar encontra-se a sede do Centro de Documentação da Memória Judaica de Pernambuco.
Com a retomada portuguesa do território sob Maurício de Nassau muitas das famílias judias pernambucanas, temendo a volta dos processos da Inquisição, saíram da cidade de Recife. Algumas delas vieram para o sul do Brasil, para Minas Gerais, onde se juntaram aos bandeirantes na procura por metais e pedras preciosas. Outras 150 famílias decidiram retornar à Holanda. 23 destas famílias, que se encontravam a bordo do navio Valk, de regresso aos Países Baixos, foram deixadas presas na Jamaica depois que a embarcação sofreu um ataque de piratas espanhóis. Quando liberadas, tomaram um navio francês que seguia para a America do Norte e chegaram ao vilarejo de Nova Amsterdam, com 1500 habitantes, no coração da ilha de Manhattan, em setembro de 1654.
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A sinagoga encontra-se aberta ao público desde 2001.