Morcego, ilustração sem autoria da década de 1920.
–
–
O morcego
–
Da Costa e Silva
–
–
Como uma borboleta escura e desconforme,
Suspenso pelos pés com o instintivo emprego
Das garras que o sustém, o mórbido morcego,
Tonto de sono e luz, durante o dia dorme.
–
Dorme durante o dia; e à noite, ei-lo, conforme
É costume, senhor do pávido sossego,
Abrindo o membranoso e elástico refego
Das asas que-lhe dão um todo demiforme.
–
Rasgando, em largo voo, a treva ampla e uniforme,
O noturno avejão guincha em desassossego,
A pupila incendida a arder na noite enorme.
–
E é de ver-se, depois, em lânguido aconchego,
As asas a abanar sobre o animal que dorme,
O sanguinário egoísmo em forma de morcego.
–
–
Em: Poesias Completas, Da Costa e Silva, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1985 [edição do centenário]
–
–
Antônio Francisco da Costa e Silva ( Brasil, [PI] 1885 — [RJ] 1950) poeta, jornalista. Advogado, cursou a Faculdade do Direito do Recife. Trabalho no Ministério da Fazenda.
Obras:
Sangue (1908),
Elegia dos Olhos, s/d
Poema da Natureza, s/d
Clepsidra, s/d
Zodíaco (1917),
Verhaeren (1917),
Pandora (1919),
Verônica (1927),
Alhambra (1925-1933), obra póstuma inacabada,
Antologia (coleção de poemas publicada em vida – 1934),
Poesias Completas (1950) (1975) (1985), coletânea póstuma.