Água Verde, Curitiba, 1947
Guido Viaro (Itália-Brasil, 1897 – 1971)
óleo sobre tela
Água Verde, Curitiba, 1947
Guido Viaro (Itália-Brasil, 1897 – 1971)
óleo sobre tela
Sábio nenhum há completo
Neste mundo, assim entendo:
Por mais que seja correto,
O sábio morre aprendendo…
(Sabino de Campos)
O relógio de pêndulo, 1881
De Scott Evans (EUA, 1847–1898)
óleo sobre tela, 116 x 73 cm
Coleção Particular
Joaquim José Teixeira
A um relógio dava corda
Chavinha de áureo metal,
E mui vaidosa do impulso
Parar não quis afinal.
Forçou, pois, e desta força
Dentro a mola arrebentou,
E do tempo o mecanismo
Sem movimento ficou.
Resolvam, mandem governos
Nas raias do seu poder,
Vejam bem nesta chavinha
Que não basta o só querer.
Em: Poetas cariocas em 400 anos, ed. Frederico Trotta, Rio de Jnaeiro, Editora Vecchi: 1965, p. 143
Joaquim José Teixeira nasceu no Rio de Janeiro em 27 de agosto de 1811 e faleceu também no Rio de Janeiro em 1º de janeiro de 1885. Foi advogado, poeta, romancista, dramaturgo,teatrólogo, tradutor, conferencista, oficial da Ordem da Rosa, sócio-fundador do Instituto dos Advogados Brasileiros e sócio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Colaborou em vários jornais e revistas. Traduziu Goethe, Molière, Fontaine entre outros.
Obras:
Elogio dramático, 1840
Fábulas, 1865
Versos, 1865
Pensamentos, (versos) 1878
Antecipação
Victor Gabriel Gilbert (França, 1847 – 1933)
óleo sobre tela, 54 x 45 cm
No teatro, 1928
Prudence Heward (Canadá, 1896 – 1947)
óleo sobre tela, 101 x 101 cm
Uma curiosidade literária: famosa personagem teatral que nunca foi vista no palco, torna-se tão popular que passa para a história da língua inglesa, como personagem que lembra decência, propriedade, disciplina, mais tarde considerada como autoridade de censura e tirania social.
Mrs. Grundy foi apresentada ao público inglês pela primeira vez por Thomas Morton, (1764-1838) famoso dramaturgo britânico, na peça Speed-the-plough, (1798) cuja melhor tradução para o título seria Seguindo em frente. Procurei por uma tradução desta comédia em 5 atos no Brasil, não encontrei de pronto. Para essa postagem não valeria a pena procurar muito além da internet. Nesta comédia, Mrs. Grundy é um personagem a quem outros personagens se referem, mas que nunca aparece, desde a primeira cena, quando Dame Ashfield, coberta de inveja, chega em casa e comenta com o marido que, a vizinha, Mrs. Grundy conseguiu melhor preço do que eles na manteiga e no trigo. Daí por diante, passa a ter uma obsessão com a vizinha achando que até o sol sempre parece brilhar mais na terra alheia do que na dela.
“Why don’t thee letten Mrs. Grundy alone? I do verily think when thee goest to t’other world, the vurst question thee’ll ax ‘ill be, if Mrs. Grundy’s there?” [Por que não deixas Mrs. Grundy de lado? Na verdade, acho que quando chegares no outro mundo, a primeira pergunta que farás, se Mrs. Grundy está lá?]
Durante o século XIX Mrs. Grundy cresceu em sua importância, adquiriu algumas outras características de disciplina, defensora da moral aparecendo como autoridade dos costumes sociais e censura. Quase quarenta e cinco anos depois de sua estreia na peça de Morton, Mrs. Grundy volta ao mundo das letras, no romance Phineas Quiddy (1842) de outro dramaturgo inglês, John Poole (1786–1872). E em 1869, John Stuart Mill, filósofo inglês, publica o livro Sujeição das mulheres, em que defende igualdade para as mulheres, e menciona “quem tem mulher e filhas, tem reféns de Mrs. Grundy. Daí por diante, ela é mencionada como árbitra dos costumes sociais em grande número de obras:
A feira das vaidades (1848), William Makepeace Thackeray
Tempos difíceis (1854), Charles Dickens
Mulherezinhas (1868), Louisa May Alcott
Erewhon (1871), Samuel Butler
A arte de ganhar dinheiro (1880), P.T. Barnun
Lobo do mar (1904), Jack London
Music at Night, (1931), Aldous Huxley
That Hideous Strength, (1945) C.S. Lewis
Entre muitos outros Aimée Crocker, Oscar Wilde, William Gilbert, G. K. Chesterton, James Joyce, Robert A. Heinlein, Philip José Farmer, Mohandas Gandhi, Thomas Hard também se referem a Mrs Grundy.
Ficou famosa e nunca esteve no palco. Famosa sem mostrar a cara. Definitivamente outros tempos, sem redes sociais.
Citação do diálogo da peça,
Em: The Reader’s Handbook of Allusions, References, Plots and Stories, E. Cobham Brewer, London, s/d (possivelmente 1919)
Moça lendo num barco, 1889
Géza Polgáry (Hungria, 1862 – 1919)
óleo sobre tela
Flores, 1966
Enrico Bianco (Itália/Brasil, 1918 – 2013)
óleo sobre chapa de madeira, 73 x 49 cm
Um jogo de damas
Francis Coates Jones (EUA, 1857 – 1932)
óleo sobre tela
Rio de Janeiro visto da estrada Rio-Petrópolis, década 1930)
Pablo Shouboe (Dinamarca 1874 – 1941)
óleo sobre tela, 62 x 84 cm
Jovem lendo
Vishalandra Dakur (India, contemporâneo)
óleo sobre madeira, 24 x20 cm
Na geometria projetiva duas linhas paralelas se encontram no infinito. No livro A distância entre nós de Thrity Umrigar elas não só se encontram como colidem por volta da página trezentos. Trata-se da história de duas famílias lideradas por mulheres viúvas, na maior e mais importante cidade indiana, Bombaim. Sera Dubash é uma mulher de classe média alta, parsi, que vive confortavelmente num apartamento na zona residencial da metrópole. Tem uma filha, casada, passando pela primeira gravidez e cuida da sogra idosa e acamada. Sera tem uma empregada doméstica há mais de vinte anos, Bhima, com mais de sessenta anos, cujas dores do corpo maltratado precisa ignorar para trabalhar e manter a neta estudando. Bhima é extremamente pobre. Vive numa favela na cidade, numa casa sem banheiro próprio. Necessita usar o sanitário comum do local e, sem móveis, dorme no chão.
Ainda que Sera e Bhima vivam em mundos distantes, cada qual, à sua maneira, trata da outra, conhecendo os segredos que cada uma esconde, a vergonha social que as domina. Sera foi protagonista de casamento violento e foi constantemente maltratada pela sogra que hoje depende de sua assistência. Bhima foi abandonada pelo marido, que ao sair de casa levou com ele o filho, deixando para trás a pequena irmã do menino. Ao longo das décadas de serviço as duas mulheres vieram a se solidarizar com os sacrifícios que sabiam a outra fazia. Bhima perde a filha e o genro para a AIDS e cria, agora, nos últimos anos de vida a neta, que, recipiente da generosidade de Sera, estuda na universidade, o que seria impossível de outra forma. No entanto, quando o livro inicia, sabemos que uma grande desgraça acontece com Maya, neta de Bhima. Ela engravida ainda solteira, enquanto cursa a faculdade e Bhima se vê sem meios de resolver o problema a não ser com a ajuda de Sera e sua família. A solução e as razões evocadas para tal são fonte de grande conflito interior para Bhima e Maya e só no final, entendemos perfeitamente os motivos de tanto sofrimento.
Temos, portanto, uma prato cheio de emoções conflitantes. agravadas por preconceitos sociais, pobreza, intolerância e separação de castas sociais culturalmente mantidas, a despeito da constituição indiana de 1947, que as abole.
Thrity Umrigar é excelente escritora. Mantém bom ritmo na narrativa, descreve, através dos pensamentos dos personagens, ambientes à sua volta. Diálogos e linhas de pensamento, reflexões sobre eventos passados abrem a porta para vislumbramos conflitos presentes. O texto corre solto, sem soluços, visita cada família esboçada, e reflete das dúvidas às ações nem sempre dignas dos personagens. Em menos tempo do que se imagina, é possível ver que as duas famílias se espelham e o paralelismo entre as realidades é conduzido com maestria.
Há leitores e leitores. Nos meus grupos de leitura A distância entre nós teve aprovação quase unânime. O livro foi considerado repleto de questões relevantes, uma entrada para a cultura milenar da Índia, reflexivo sobre as emoções humanas mais conhecidas, arrebatadoras. Amor, traição, decepção, esperança, sacrifício, felicidade são todas emoções fortes, tratadas no desenvolver da história. Sinto revelar que fui a voz da discórdia. Justamente porque há leitores e leitores. A mim, agradam textos mais sutis. A meia palavra fere mais do que a altercação. Querelas sentimentais me cansam. Não sou adepta da novela, muito menos das explosões emotivas tradicionalmente retratadas nos seriados mexicanos, por exemplo. Arroubos de emoção (seja ela a que for) me distanciam. Acho-os de difícil empatia. E a escrita de Thrity Umrigar, neste livro, detalha as fortes emoções que levam a decisões extremas. Um pouco fora da minha preferência.
Mas, se você acredita nas emoções violentas, nas emoções mais básicas do ser humano, do amor à traição e não se incomoda com os dramalhões. Se você é noveleiro, se entende e simpatiza com o sofrimento escancarado dos personagens, este livro é para você. Boa história, resolução final esperançosa. Vá em frente. Você vai gostar.
NOTA: este blog não está associado a qualquer editora ou livraria, não recebe livros nem incentivos para a promoção de livros.