Imagem de leitura — Tatiana Rhinevault

11 09 2011

Menina lendo, s/d

Tatiana Rhinevault ( Rússia, contemporânea)

óleo sobre tela, 50 x 72 cm

www.tatianarhinevault.com

Tatiana Rhinevault nasceu em Moscou  e passou a maior parte de sua infância em Sokolniki Park, vendo artistas pintarem todos os dias.  Vivendo em Moscou foi exposta a muitos museus, ao teatro e a estúdios de arte que abundam na capital russa.  Estudou arte no Instituto de Moscu, onde completou o mestrado.   Trabalhou como restauradora e visitou muitos países europeus familiarizando-se com as artes.  Casou-se com um americano e mudou-se para os Estados Unidos onde vive e continua sua carreira como pintora.  Pinta retratos, paisagens e principalmente dedica-se à pintura de gênero.  www.tatianarhinevault.com





Como o onze de setembro mudou a minha vida…

11 09 2011

Nova York, lembrança dos dez anos do ataque ao World Trade Center.

Nos últimos anos, muitos amigos perguntaram a mim e a meu marido porque resolvemos de fato vir morar no Brasil.  A minha volta — a vinda dele — já estava mais ou menos no ar, um sonho para o futuro, parte de uma vida confortável de dois profissionais bem sucedidos que imaginavam uma aposentaria, anos e anos à frente, numa vida carioca mais ou menos idílica.  Vínhamos ao Brasil todos os anos às vezes por um a dois meses.  Houve anos em que viemos mais do que uma vez.  Meu marido gostou do Brasil desde sua primeira visita.  Gostou do Rio de Janeiro e da minha família.  E a cada visita de volta sempre sonhávamos em nos estabelecer no Rio de Janeiro.  Mas, tínhamos uma vida confortável, calma, cheia de projetos  e o futuro parecia algo meio longínquo.  Nossas vidas familiar, social e profissional estavam nos Estados Unidos, e apesar de sonharmos em vir para o Brasil, íamos ficando, ficando, porque tudo estava bem.  Até  vivermos o 11 de setembro de 2001.

Fomos avisados do que acontecia em Nova York por minha mãe, que nos telefonou daqui do Rio de Janeiro,  pedindo que ligássemos a televisão.  Minha mãe estava sempre conectada aos mais diversos acontecimentos, acompanhava os noticiários com atenção e soube junto com os primeiros jornalistas, pela CNN, do ataque à primeira torre do World Trade Center.  Meu marido e  eu estávamos nos aprontando para ir trabalhar.  Ele,  como diretor dos cursos de pós-graduação/mestrado da universidade onde ensinava e eu como dona de uma galeria de arte-antiguidades.  Não morávamos em Nova York.   Na verdade cabiam e ainda sobravam uma Espanha e um Portugal inteiros entre nossa casa e Manhattan.  Mas o tempo parou para nós.  Foi o único dia, que não abri a galeria sem dar explicações.  Fechamos na verdade por dois dias, até podermos entender o que acontecia.  Meu marido foi à universidade, mas voltou logo e plantados em frente à televisão por horas e horas tentávamos compreender a enormidade do ataque que o país havia sofrido.

Não perdemos nem amigos, nem familiares no WTC.  Nem no Pentágono.  Nem no vôo 93.

No entanto o mundo mudou à nossa volta, ou melhor, a nossa percepção do mundo mudou assim como a realidade à nossa volta.  Setembro de 2001 foi o primeiro mês em 12 anos que a galeria não teve vendas que cobrissem todas as suas despesas.  O comércio caiu.  Desapareceu.  As ruas ficaram praticamente desertas por pelo menos uma semana.  Já havíamos sobrevivido a um enorme furacão que havia devastado a cidade alguns anos antes.  Mas dessa vez era pior.  Faltava o som das serra elétricas cortando as árvores nas ruas,  que anteriormente haviam dado impressão de progresso para a normalidade.  Faltava a solidariedade dos vizinhos, que no caos pós-furacão ficou evidente.   Havíamos também sobrevivido à uma tremenda borrasca, com neve acumulada bem alta e as ruas completamente fechadas, nessa cidade hospitaleira.  Dessa vez, ninguém podia ajudar a ninguém, não se sabia o que fazer.  Não era uma calamidade normal.

Não é que precisássemos dar um litro de leite, um pacote de biscoitos para as crianças do vizinho, que não podiam sair de casa…  Não é que alguém conseguisse chegar até o supermercado e se oferecesse para comprar alguma coisa para você durante uma borrasca de neve que havia paralisado a cidade.  Era diferente.  Houve uma quietude total, todos passaram uma semana, mais ou menos trancafiados, sem saber para onde se virar.  O perigo poderia estar em qualquer lugar.  De repente, um continente, um país gigantesco, havia sido atacado da maneira mais covarde do mundo e nós, os inocentes moradores, não sabíamos nem porque éramos ou poderíamos ser os alvos de tanta fúria.  E na minha cidade, todos se sentiram vulneráveis, sem saber de onde nos proteger.  E o comércio parou, os compradores desapareceram.    Principalmente aqueles que mantinham o comércio de luxo, como era o meu, pinturas, esculturas, contemporâneas, modernas e antigas, móveis de 200 a 300 anos: tudo que ninguém precisa para sobreviver.   E depois veio outubro, uma repetição precisa de setembro.  Um ar de irrealidade a toda volta.    É claro que depois de 12 anos no mundo dos negócios aprende-se que há momentos ruins.  E a minha galeria poderia sobreviver por ainda seis meses ou mais sem vendas…  Experiência já havia me ensinado a manter tudo sob controle financeiro estrito.  Não foi isso que me levou a fechar a galeria em dezembro de 2001.  Mas ajudou.

Meu marido, que já flertava com uma aposentadoria antecipada, por si só chegou à conclusão de que iria deixar a universidade  e um dia, no final de outubro, decidiu se aposentar.  Estava no ar, nas nossas preocupações, no nosso dia a dia a brevidade da vida, a certeza de que precisávamos colocar ordem nas nossas prioridades.  Era o momento de mudar de vida.  De correr atrás dos sonhos.   Estava na hora de fazermos o que queríamos, de dar corda aos nossos desejos, ainda que eles pudessem parecer tolos aos olhos dos outros.  Estava na hora de virmos para o Brasil. Em dezembro, fechei a galeria e em março seguinte, chegávamos ao Rio de Janeiro à procura de um lugar para morar.  A vinda, de verdade, sem compromissos deixados para trás, só aconteceu em dezembro de 2002.  Mas o ponto de partida, o momento propulsor da mudança, foi sem dúvida o dia 11 de setembro de  2001.  Fazem hoje dez anos!

©Ladyce West, 2011