O rei ordena aos príncipes que se casem. Desenho infantil.
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Maria Carrucá
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Um rei tinha três filhos, vendo-os em idade de constituírem família, chamou-os e disse-lhes: “Meus filhos, é chegada a idade em que se torna preciso constituir família, atendendo à elevada posição que tendes. Ide, pois, procurar esposas; porém, procedei de modo que eu não tenha que me envergonhar da escolha”.
Os três príncipes saíram do palácio e partiram por diferentes caminhos em demanda de esposa. Os dois mais velhos encontraram logo princesas que os quisessem para maridos e casaram-se. O mais moço, porém, por maiores esforços que empregasse, não encontrou quem julgasse digna de lhe oferecer a mão.
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Ilustração russa, o Príncipe vê uma sapa.
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Desalentado por não conseguir o que desejava, achava-se uma tarde à beira de uma lagoa, e pegando uma varinha, começou a rabiscar na areia. Impressionou-o, no entanto, estranhamente o fato de que embora quisesse escrever um pensamento qualquer, só conseguia rabiscar na areia a palavra – sapo.
Tudo o que escrevia era sapo, e tendo isto afinal o irritado, exclamou:
–“Ora, saia de lá dessa lagoa uma sapa, que quero me casar com ela!…”
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“Imediatamente saltou uma sapa…” — Ilustração infantil.
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Imediatamente saltou da lagoa uma sapa, que postando-se em frente do príncipe, lhe disse:
— “Aqui estou, meu adorado noivo”.
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Aqui estou! — ilustração de Yuri Vasnetsov (Russia, 1900 – 1973)
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O príncipe acompanhou a sapa, que era uma formosíssima princesa encantada, para o fundo da lagoa, onde ficou deslumbrado por encontrar o mais suntuoso dos palácios e as mais maravilhosas riquezas.
Realizado o casamento, o príncipe foi comunicar o ocorrido ao pai, que ficou muito desgostoso por saber que o filho havia se casado com um animal tão asqueroso.
Dias depois, o rei mandou a cada uma das noras uma lindíssima toalha de cambraia pedindo-lhes que as bordassem.
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O príncipe apresenta sua esposa ao pai. Ilustração russa.
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A sapa, logo que recebeu a toalha, chamou uma criada e disse-lhe:
— “Maria Carrucá, monta no pescoço do galo branco, vai à casa das senhoras princesas, e, dize-lhes que mando pedir um pouco de fio de barbante bem grosso, para bordar a toalha do rei”.
Maria Carrucá, assim o fez. As princesas, porém, que eram muito invejosas e estúpidas, responderam-lhe:
–“Vá dizer à senhora princesa D. Sapa que se temos barbante, é para bordar as nossas toalhas”.
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A princesa sapa e o seu príncipe.
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E assim disseram, melhor fizeram, bordando as toalhas que o rei mandara, com barbante grosso. A sapa, no entanto, bordou a sua com o mais delicado fio de ouro.
— “Ora vejam só, disse o rei, “ a sapa fez um trabalho tão mimoso, e no entanto as princesas estragaram-me as toalhas, com um barbante grosseiro, transformando-as em panos de cozinha”.
Daí a alguns dias o rei mandou a cada uma das noras um cãozinho, para que elas os criassem com todo o desvelo, pois esses animais pertenciam a uma excelente raça de caça.
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Maria Carrucá, xilogravura, autor desconhecido.
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Apenas a sapa recebeu o cãozinho, disse para a criada:
— “Maria Carrucá, monta no pescoço do galo branco, e vai à casa das senhoras princesas pedir-lhes da minha parte um pouco de cal para dissolver na água, a fim de lavar o cãozinho do rei e umas peles de toucinho para engordá-lo”.
Maria Carrucá foi desempenhar sua comissão, mas as princesas disseram:
— Vá dizer à senhora princesa D. Sapa, que se temos cal é para lavar os cãezinhos que o rei nos mandou, e se temos peles de toucinho é para alimentá-los”.
E assim fizeram de modo que os animais perderam quase todo o pelo, e emagreceram a tal ponto, que quase não podiam suster-se de pé.
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A princesa sapa.
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A sapa, no entanto, banhava o seu com água perfumada e alimentava-o com pão de ló e outras iguarias delicadas, de modo que e tornou um animal formosíssimo, o que muito admirou o rei, quando mandou buscar todos os três, e viu o deplorável estado em que se achavam os outros, parecendo-lhe incrível que uma triste sapa se avantajasse em tudo a princesas de sangue azul.
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O príncipe e sua esposa com o pai e os irmãos. Ilustração do desenho animado da Princesa Sapa.
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Daí a alguns dias, o rei, desejando conhecer pessoalmente as noras, mandou convidá-las para um baile no palácio.
A sapa, logo que recebeu o convite, voltou-se para a criada e disse-lhe:
— “ Maria Carrucá, monta no pescoço do galo branco, e vai à casa das senhoras princesas pedir-lhes da minha parte, uma navalha para raspar a cabeça a fim de ir ao baile do rei, pois é costume agora na corte, apresentarem-se as damas de cabeça raspada”.
As princesas, porém, que por inveja não queriam que a sapa se apresentasse na moda, mandaram dizer-lhe que, se tinham navalha, era para elas rasparem a cabeça.
E trataram de raspar a cabeça, apresentando-se no palácio como verdadeiras Fúrias, o que muito desgostou o rei.
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A princesa sapa desencanta-se.
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A sapa, no entanto, desencantou-se, e readquirindo a sua forma de mulher, apresentou-se com elegante toucado, fazendo toda a corte pasmar pela sua extraordinária beleza e pela riqueza do vestuário.
O rei ficou satisfeito com ela, ao passo que só tinha palavras de desdém para as duas invejosas.
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Em: Histórias do Arco da Velha, de Viriato Padilha, Rio de Janeiro, Editora Quaresma: 1947, 12ª edição
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NOTA: Esta história é uma adaptação de um conto folclórico russo muito popular e bastante traduzido e adaptado no século XIX por diversos autores, alemães, franceses, italianos (Ítalo Calvino em seu volume de Contos folclóricos da Itália, tem duas versões dessa história) e portugueses e aqui por Viriato Padilha. A cada tradução alguns detalhes e principalmente as demandas do rei foram adaptadas aos costumes mais familiares dos leitores. Por exemplo na versão russa o príncipe quase acerta a princesa sapa com uma seta enquanto caçava. Note nas ilustrações acima e abaixo que a seta figura quase sempre próximo à sapa.
Mas a popularidade desse conto na Rússia, explica a abundância de ilustrações russas sobre o tema. No século XX, com o domínio da indústria editorial americana e principalmente com o império Disney, este conto, apesar da sua grande lição sobre valores e inveja, foi esquecido, principalmente depois da popularização pelos próprios americanos da história da princesa que se casa com um sapo.
VEJA MAIS ILUSTRAÇÕES — Variantes do mesmo tema depois da nota biográfica abaixo.
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Viriato Padilha ( Aníbal Mascarenhas, MG 1866 – Fortaleza, CE 1924) Pseudônimos: Aníbal Demóstenes, Ticho Brahe de Araújo, Sancho Pança. Contista, poeta, autor de literatura infantil, historiador, professor, tradutor.
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Obras: [lista incompleta]
Histórias do arco da velha, 1897
Os roceiros, 1899
O livro dos fantasmas
OUTRAS ILUSTRAÇÕES:
Ilustração russa, desconheço a autoria.
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A princesa sapa de autoria da ilustradora Nancy Farmer.
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Ilustração russa, em bandeja de artesanato folclórico.
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Ilustração russa em livro publicado em 1930.
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Decoração pintada à mão em caixa de papier maché.
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Cartum humoristico, a princesa sapa estuda livros eróticos.
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Transparência de desenho animado.
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O príncipe encontra a princesa sapa, ilustração russa.
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Ilustração russa.
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Ilustração russa.
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Ilustração russa de N. Petrov.
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Ilustração russa, segunda metade século XX.
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Capa de livro russo para crianças da Princesa Sapa.
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Capa de livro para crianças da Princesa Sapa.
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