Esmerado: Caixa Cofre do Cardeal Guala Bicchieri, 1220-1225

6 09 2025

Caixa cofre do Cardeal Guala Bicchieri, 1220-1225

Medalhões esmaltados de Limoges com decoração profana

Palazzo Madama–Museo Civico d’Arte Antico

 

 

Peça do acervo permanente do Palazzo Madama–Museo Civico d’Arte Antiga em Turim, na Itália,  essa caixa cofre do Cardeal Guala Bicchieri é considerada uma das mais importantes peças medievais que traz esmaltação da melhor qualidade encontrada na era medieval.  Os esmaltes da cidade de Limoges na França eram conhecidos por toda Europa pela excelência na técnica champlevé.

Champlevé é o termo francês usado para significar a técnica conhecida desde a antiguidade, de esmaltação sobre um objeto de metal, ou uma folha de metal sobre madeira, em que depressões no metal, com formas específicas, são preenchidas até as bordas de seus limites, com esmalte vítreo, que exposto ao fogo se funde com o metal.  Mais tarde a peça é polida e as “paredes” de cada célula são expostas  fazendo uma moldura de cada cor aplicada.  Essa técnica esteve muito em voga no século XIII na Europa, para objetos de luxo e muitas caixas como essa do Cardeal Guala Bicchieri.  Já mostrei aqui no blog duas dessas caixas da mesma época: 

  1. Relicário francês, 1220 — 12/09/ 2014  
  2. Cofre Becket, c. 1180-1190 — 1/3/2017 

O Cofre do Cardeal Guala Bicchieri é uma das peças conhecidas mais importantes da famosa produção de Limoges.  Essa caixa é decorada com medalhões mostrando lutas de animais, cenas da corte. O proprietário original desse cofre Guala Bicchieri, foi um grande colecionador e diplomata experiente, membro de uma família proeminente de Vercelli no norte da Itália. 

 

Disco decorativo: Dois pequenos dragões devorando um peixe em esmaltação champlevé.





Volubilis, estive perto e não vi…

4 11 2024
Volubilis, cidade romana, no Marrocos.

 

 

 

Dividi uma casa e mais tarde um apartamento com uma colega de pós-graduação em história da arte, cujos verões eram passados em sítios arqueológicos em Israel, já que sua especialidade era arte do período romano tardio e bizantina. Nós duas, diferente dos amigos cientistas de The Big Bang Theory, apesar de muitas similaridades na nossa maneira de viver, sempre gostávamos de conversar sobre nossas respectivas áreas de estudo.

Eu achava muito romântico vê-la partir com pouquíssima bagagem, no início do verão, e voltar muitas semanas depois, com um deslumbrante tom acobreado na pele, graças ao sol do oriente médio, que ressaltava seus olhos azuis enormes. Chegava cheia de histórias de aventuras e novas descobertas nos pisos de sinagogas que escavava. Tornamo-nos muito amigas com alguns anos de convivência, só para deixarmos nosso convívio diário quando ela estava próxima a se casar com um promotor público em Washington DC.  Fui, junto a outras amigas, sua “dame of honor“.  Através desses anos de vida em comum aprendi muita coisa sobre mosaicos, variações de épocas em que foram feitos, o que observar neles, etc.

 

 

 

Piso de antiga habitação romana em Volubilis.

 

 

Por causa desse convívio acabei tendo persistente curiosidade sobre mosaicos antigos. E sempre que possível, se houvesse um local com ruínas da antiguidade grega ou romana, próximo ao local onde me encontrava viajando, fiz questão de visitá-lo, quer eu estivesse em Portugal ou na Grécia.  Quando morei em Oran, na Argélia, um dos passeios mais deslumbrantes que fiz foi às ruinas de Tipasa, conhecidas  na literatura pelo romance de Albert Camus, Bodas em Tipasa. Nesse mesmo período viajamos mais de uma vez pelo Marrocos, mas eu nunca soube de Volubilis.  Portanto, quando por acaso, como acontece na internet, caí numa série de artigos com profusão de fotografias sobre esse sítio.  Passo algumas fotos aqui porque achei os mosaicos de excelente qualidade.

 

 

 

Hércules e o leão, piso de uma residência em Volubilis.

 

 

Estive no Marrocos algumas vezes, porque moramos por um ano, mais ou menos próximo – três horas de carro – da fronteira com a Argélia, em Oran.  Marrocos era um local de maior liberdade social.  Por exemplo, um lugar onde eu e meu marido podíamos entrar em qualquer restaurante para uma refeição, juntos, enquanto em Oran, havia um único lugar onde homens e mulheres podiam se sentar para uma refeição, um restaurante chamado Mon Village, onde também encontrávamos quase todos os estrangeiros da cidade. Era um local de clientela duvidosa, onde jovens mulheres que faziam programas noturnos, podiam se encontrar com seus parceiros.  Não sei se a Argélia continua assim. mas nos anos 80 era um lugar com vida muito circunscrita para mulheres. Portanto, para nosso conforto, Oujda a cidade mais próxima da fronteira com a Argélia, foi um lugar favorito para nós, estrangeiros, naquela parte do mundo.

 

 

O acrobata, piso residencial em mosaico, Volubilis.

 

 

Fui outras vezes para o interior do país, visitei muitas cidades.  Mas não sabia de Volubilis.  Sei que há outros grandes centros arqueológicos com mosaicos na Líbia, todos datando do período de domínio romano do Norte da África. Mas naquela época, e me parece que isso continua até hoje, a Líbia era lugar perigoso de visitar e portanto esses locais repletos de belíssimos resquícios da antiga civilização romana era difícil de se visitar. Estou passando informações que acabo de encontrar na internet, ainda com os olhos de espanto de ver esses mosaicos tão bonitos e tão bem preservados, que se encontram em Volubilis no Marrocos.

 

 

 

Piso em mosaico, Volubilis.

 

 

 

Volubilis esteve sob domínio romano por 250 anos. Caiu nas mãos de tribos locais por volta do ano 285 da nossa era.  Hoje é tombada pela Unesco.  É um dois mais preservados sítios romanos das fronteiras mais distantes do império.

Acho que vou fazer uma viagem ao local. Dizem que dezembro é uma boa época para ir.  Não será em 2024.  Mas quem sabe, no ano que vem?





Saladino…

12 08 2022
Representação do século 13 mostra o encontro entre Ricardo I e Saladino

 

“Saladino, príncipe do exército dos pagãos, enviou muitas vezes aos reis da França e da Inglaterra peras de Damasco e uma grande abundância de todos os frutos que tinha, com outros pequenos presentes, para levá-los a fazer a paz com ele. De fato, fez a eles frequentes propostas de paz e de entendimento, por causa do temor que lhe inspiravam os filhos de Nuredin: reclamavam todas as terras do pai, ocupadas por Saladino. Apoiados pelo senhor de Mosul, seu tio, entraram nas terras de Saladino com  um grande exército, e ocuparam todas elas, até o Eufrates. Saladino também queria libertar seu povo sitiado na cidadela, mas não queria dar satisfação aos reis. Queria, de fato, conservar em seu poder Jerusalém e o krak*  de Montreal na Palestiina.  Os reis recusaram o entendimento com ele.”

 

*Conjunto fortificado construído pelas Cruzadas na Palestina e na Síria (do árabe, Karak). N.T.

 

Em: Ricardo Coração de Leão: história e lenda, de Michèle Brossard-Dandré e Gisèle Besson, tradução de Monica Stahel, São Paulo, Martins Fontes: 1993,p 123.





Esmerado: coroa de ouro, dinastia Tang

30 09 2019

 

 

2019_NYR_18338_0573_000(a_very_rare_gold_headdress_7th-9th_century)Raro adorno para a cabeça (grinalda)

Dinastia Tang, séculos VII-IX Era Comum,

ouro, 31 cm

China

 

Este é um exemplo da confluência de duas culturas em um único objeto, produzido na China, entre os séculos VII e IX. Além disso, esta coroa mostra alto grau de artesanato.

O cavalo galopante, que faz parte do design em cada ponta deste adorno de cabeça, mostra a influência de uma cultura nômade, de uma tribo, das estepes da Asia Central. As patas deste bravo animal praticamente não tocam o chão.  Parecem cavalos elevados a um status mítico, com chifres e ancas em chamas. Por outro lado, os desenhos de flores remetem à dinastia Tang, das linhas entrelaçadas que as sustentam.

É aí que encontramos o casamento de duas culturas em um único objeto.

 

 





Esmerado: cálice da Rainha Dona Urraca

25 03 2019

 

 

 

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Cálice da Infanta Urraca de Zamora (1033-1101), século XI
Ourives desconhecido
Bronze
Tesouro de San Isidro, León, Espanha

 

 

Mantido no Museu da Congregação de San Isidro em León, na Espanha, o cálice da Infanta Urraca de Zamora, filha mais velha de Fernando I de Leão ede sua esposa, rainha Sancha I de Leão. Urraca viveu entre os anos 1033 e  1101, tendo vida longa para este período, 68 anos.  Herdou, como determinado ainda em vida, os territórios de Zamora.

O cálice é composto por duas taças  muito antigas de  origem greco-romana anterior ao cristianismo.  Uma serve de base, outra de recipiente.  Feitas em pedra ônix,  elas apresentam algumas lascas anteriores à construção do cálice. Desconhece-se a origem destes dois copos assim como não se sabe porque Doña Urraca decidiu entregar aos ourives da corte algo que materialmente não tinha grande valor. Especula-se sobre uma possível consagração destas duas peças ao culto litúrgico, feito talvez por algum personagem venerável da primitiva Igreja Cristã, mas não existem documentos ou testemunhos escritos a este respeito. Mas os ourives de Leão fizeram um excepcional trabalho artístico.  E converteram o que na época era um objeto pagão, em uma taça digna de admiração.

As peças de ônix são cobertas em ouro: copo, haste e base, expondo parte do copo e quase toda a base. O interior da taça também é forrado em ouro. Os ourives fizeram com grande maestria e delicadeza as filigranas que formam desenhos, arcos, espirais e pequenos caracóis. Pérolas, esmeraldas, ametistas e safiras foram embutidos nos buracos. Incorporada também há uma máscara de vidro imitando uma camafeu,  adicionado após o trabalho da composição do cálice. Na base e antes do nó, vê-se a inscrição:  EM NOMINE DOMINI VRRACA FREDINANDI.

No século XI o reino de Leão teve um de seus momentos de maior esplendor. Fernão I, o Grande, tornou-se um dos reis mais importantes da cristandade na Europa, levando a cabo a reconquista, de Coimbra a Valência. Quando faleceu, Fernão I, entregou a seus filhos terras: a Alfonso, León; Sancho herdou Castela; Galícia a Garcia; Toro foi para as mãos de Elvira e Urraca foi feita Senhora de Zamora.

 

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Tesouro de Carambolo, um mistério resolvido

10 03 2019

 

 

 

1200px-El_Carambolo_Treasury_-_7th-5th_cent._b.C._-_Seville_-_Museo_Arqueológico_de_Sevilla3Tesouro de Carambolo, séculos VII a V aEC.  Museu Arqueológico de Sevilha.

 

 

Um mistério resolvido.  Em 1958 um tesouro foi descoberto por arqueólogos no Morro El Carambolo, a 2 km oeste de Sevilha, Espanha. Foram 21 peças de ouro de 24 quilates, trabalhadas: um colar com pingentes, duas pulseiras, dois peitorais de couro de boi e 16 placas que podem ter feito um colar ou um diadema. As joias foram enterradas dentro de um vaso de cerâmica, deliberadamente enterrado no século VI aEC.

Desde de sua descoberta, o Tesouro de Carambolo, como ficou conhecido, foi fonte de especulação para estudiosos.  As peças datavam de aproximadamente 500 anos antes da Era Comum, ou seja, tinham 2700 anos de idade.  Por causa de sua idade e da proficiência na manufatura, essas joias, pareciam ser prova de uma civilização conhecida unicamente por livros, uma cidade mítica, portuária, na foz do rio Guadalquivir, na Andaluzia, costa sul da península ibérica, cujo nome em grego seria Tartessos, que para os gregos, seria o ponto de nascimento da cultura europeia.

 

Does-the-Treasure-of-El-Carambolo-s4Tesouro de Carambolo, séculos VII a V aEC.  Museu Arqueológico de Sevilha.

 

Muitas fontes da antiguidade se referem a esse local, inclusive Heródoto que o descreve, assim como descreve os Pilares de Hércules (Estreito de Gibraltar) e até menciona um rei em Tartessos, chamado Arganthonios, cujo reinado compreendia os oitenta anos entre 625 –545 aEC.  Os tartessianos teriam fundado a cidade  de Tartessos 1000 anos antes e seu auge estaria nos trezentos anos entre os séculos IX e VI aEC.

De acordo com historiadores gregos a cultura Tartessiana se caracterizava pelo adiantado uso de metal.  O historiador Éforo de Cime (400 – 330 aEC) cita “um mercado muito próspero chamado Tartessos, com muito estanho transportado por rio, bem como ouro e cobre de terras celtas“.  O comércio de estanho era lucrativo na Idade do Bronze, pois é um componente essencial para a manufatura de bronze e não é um metal comum. O povo de Tartessos tornou-se importante parceiro comercial dos fenícios e sabemos que esses estavam presentes na península ibérica desde o século VIII aEC.  Diversos povoados ao longo do vale do Guadalquivir estão documentados.  Juntos formavam um todo, cuja capital talvez fosse Turpa, no lugar que hoje está o Porto de Santa Maria.  Com os fenícios houve aumento na exportação das minas de cobre e prata e Tartessos se tornou um dos portos mais importantes na exportação de bronze e prata para o Mediterrâneo.   Imperadores eram os chefes do sistema político desta civilização.  Eles também se utilizavam da escrita.  Suas leis eram registradas em placas de bronze. Mas no século VI aEC., Tartesso desaparece possivelmente destruída por Cartago

The Carambolo Treasure consists of 21 pieces of gold jewelry discovered by construction workers near Seville, Spain in 1958.Tesouro de Carambolo, séculos VII a V aEC.  Museu Arqueológico de Sevilha.

 

Nos anos 50 do século passado, muitos pensaram que o Tesouro de Carambolo representasse peças vindas do Leste do Mediterrâneo, ou dos fenícios ou pelos fenícios.

O mistério da origem do Tesouro Carambolo foi resolvido graças aos novos métodos de análises químicas e isotópicas que permitiu examinar minúsculos fragmentos de ouro que se separaram de uma das joias.  Esta análise revelou que o material veio das mesmas minas associadas a túmulos subterrâneos monumentais em Valencina de la Concepción, que datam do terceiro milênio aEC., também próximos a Sevilha. As joias encontradas no Tesouro Carambolo marcam o fim de uma tradição contínua de processamento de ouro que começou cerca de 2.000 anos antes com Valencina de la Concepción.

 

AAvHwGb.img©Jose Lucas, Alamy O tesouro inclui placas de ouro em forma de retângulos e peles de boi, e pesa mais de cinco quilos.

 

O tesouro inclui placas de ouro em forma de retângulos e peles de boi e pesa mais de cinco quilos. Embora o ouro fosse adquirido localmente, as joias foram fabricadas usando técnicas fenícias. Um templo fenício foi identificado na área onde a horda do Tesouro Carambolo foi encontrada, e o tesouro em si é provavelmente o produto de uma cultura mista de fenícios e tartessianos ou seja uma cultura que amalgamou povos nativos do Mediterrâneo Ocidental e marítimos do Oriente Próximo.

 

GettyImages-122316776-1200x943Tesouro de Carambolo, séculos VII a V aEC.  Museu Arqueológico de Sevilha.

 

 

270-0Exemplo da escrita Tartessiana.




12 de outubro 1492, descobrimento da América

11 10 2018

 

Vintage portrait of Christopher Columbus and the Santa Maria, lithograph, 1930Cristóvão Colombo, descobridor da América, em 1492, com a Nau Santa Maria ao fundo.

Litografia colorida de 1930

Anônima





Esmerado: pote chinês com tampa e ormolu

9 01 2018

 

 

 

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Pote de porcelana com acabamento em verde-jade [celadon] decorado com desenhos de pinheiro e bambu crescendo por entre pedras, uma corça e dois pássaros em azul cobalto sob o vidrado,  com acabamentos em bronze dourado no estilo de Luis XV e carrapeta final em forma de crisântemo.

Fabricado na China, e na França, 34 x 31 x 21 cm

Coleção Real da Inglaterra, [Royal Trust Collection]© Her Majesty Queen Elizabeth II, 2017

 

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Provavelmente esta é a mesma peça de porcelana listada em 1826 como pertencente ao Pavilhão Brighton, antiga residência real localizada em Brighton, Inglaterra. Depois de importado da China, foi ornamentado com bronze dourado [ormolu].

 

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Esmerado: bolsa militar, século IX

31 10 2017

 

 

00purseBolsa militar, c.  800-20

Couro

Museu Nacional da Hungria, Budapeste

 

 

Os magiares  das estepes da Europa do Leste, invadiram a Itália no século IX, antes de se estabelecerem na Hungria.  Aqui temos um ‘sabretache‘ ou bolsa militar usada na cintura dos oficiais da cavalaria, do início do século IX.

 





Todos os caminhos levam a Roma

25 04 2017

 

 

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O imperador Augusto (63 a. E.C. —  19 E. C.) era um homem que gostava de dados.  Colocou na cidade de Roma, capital do império, uma pedra com a distância de Roma a todas as cidades mais importantes do domínio imperial.  Mais tarde Constantino iria se referir a esta pedra como o “umbigo de Roma” [Umbilicus Urbis Romae].  Esta é a origem da expressão “todos os caminhos levam a Roma”.   Os romanos construíram 87.000 Km de estradas pavimentadas à volta do Mediterrâneo, no auge do império.

Para dar uma ideia da grandeza do império, estima-se que haja em todo o Brasil 212.798 km de estradas pavimentadas (dados de 2010).