Saladino…

12 08 2022
Representação do século 13 mostra o encontro entre Ricardo I e Saladino

 

“Saladino, príncipe do exército dos pagãos, enviou muitas vezes aos reis da França e da Inglaterra peras de Damasco e uma grande abundância de todos os frutos que tinha, com outros pequenos presentes, para levá-los a fazer a paz com ele. De fato, fez a eles frequentes propostas de paz e de entendimento, por causa do temor que lhe inspiravam os filhos de Nuredin: reclamavam todas as terras do pai, ocupadas por Saladino. Apoiados pelo senhor de Mosul, seu tio, entraram nas terras de Saladino com  um grande exército, e ocuparam todas elas, até o Eufrates. Saladino também queria libertar seu povo sitiado na cidadela, mas não queria dar satisfação aos reis. Queria, de fato, conservar em seu poder Jerusalém e o krak*  de Montreal na Palestiina.  Os reis recusaram o entendimento com ele.”

 

*Conjunto fortificado construído pelas Cruzadas na Palestina e na Síria (do árabe, Karak). N.T.

 

Em: Ricardo Coração de Leão: história e lenda, de Michèle Brossard-Dandré e Gisèle Besson, tradução de Monica Stahel, São Paulo, Martins Fontes: 1993,p 123.





Parentes no século XIII ?

18 11 2021

Árvore de Jessé, 1499

Absolon Stumme (Ativo na Alemanha, ? –1499)

têmpera e folha de ouro sobre painel de madeira

Museu Nacional de Varsóvia

Interessante programa da BBC, titulado Who do you think you are?,  estabeleceu, entre outros assuntos, que uma pessoa nascida na Inglaterra em meados do século XX  tem 80% de chance de ter  sua ancestralidade conectada até início do século XIII. E que árvores genealógicas estão sempre se interconectando, o que nos permite verificar que no fundo, somos todos parentes.

Quando leio sobre história, tento imaginar o que meus antepassados faziam no século XIV,  XVI,  ou outros, e fico feliz de ver que houve, através dos séculos, pessoas que sobreviveram até idade de poderem se reproduzir, numa cadeia sequencial inimaginável, chegando a mim, meus pais, meus filhos, às pessoas que conheço.  Somos frutos desses bem-aventurados que não morreram de gripe, de pandemia, de doenças na primeira infância.  Vinte a trinta por cento de todas as crianças nascidas na Idade Média, morriam antes dos sete anos de idade.  Morria-se de tuberculose, de infecções de um corte, de  queimadura.  Somos frutos de pessoas que não morreram, em guerras, em embates armados, nem de fome ou de frio.  Antepassados que não morreram de perseguição religiosa, ou  ambientes insalubres, que não morreram nas garras de animais que caçavam e que chegaram aos treze, quatorze, quinze anos saudáveis bastante para ter filhos que por sua vez tiveram sucesso em seu próprio crescimento, e foram capazes de gerar filhos saudáveis que os criaram ou encontraram alguém que os criasse, em sequência, de geração em geração.  O índice de mortalidade dos séculos anteriores ao nosso era muito alto.

 

Somos preciosos.  Batemos a morte em sequências que não conhecemos, para chegarmos até aqui.

 

BBC, artigo, clique aqui.

 





Mais um ângulo da colonização brasileira, Francisco Antonio Doria

22 10 2020

 

 

 

Nuremberg_chronicles_f_58v_1 The city of Genoa in a woodcut from the Nuremberg Chronicle, 1493Vista da cidade de Gênova, encontrada nas Crônicas de Nuremberg, 1493, 58 v 1, xilogravura policroma Afonso a.

 

 

“…Gênova comercia com Bizâncio, possui interesses em Creta e em Chipre, onde os genoveses competem em constantes escaramuças com os venezianos. Associam-se os genoveses aos normandos na Sicília, onde são, apenas os genoveses, senhores feudais — e comerciantes. E dominam sem contestação, o Mediterrâneo ocidental.

Os genoveses revoam, por sobre o Mediterrâneo ocidental, também desde fins do século XI. Sua presença na península ibérica é muito antiga; devemos lembrar que em  1092, Afonso VI o bravo de Castela fez uma aliança com Sancho Ramírez, rei de Aragão, e com este convidou Gênova e Pisa para, todos juntos, atacarem Valência.  As duas cidades italianas teriam fornecido 400 navios à empresa, e teriam participado de um cerco infrutífero a Tortosa. Em 1147 Afonso VII o imperador, por sua vez, conquista Almeria com a ajuda dos genoveses.

Exploram, enfim, o Atlântico e buscam as Índias. Em 1291, os irmãos Guido e Vadino Vivaldi partem de Gênova à busca do caminho das Índias costeando a África.  Atingem a costa da Guiné onde naufragam, segundo nos deixa em seu testemunho Antoniotto Usodimare, mercador e cronista.  Mais ou menos ao mesmo tempo certo messer Emmanuele Pezagno, mercador também, também genovês, organiza a pedido de D. Diniz o lavrador (n. 1261, f.1325; rei em 1281) a marinha portuguesa.  Todos Usodimare, como o diz o nome desta família: têm o hábito das coisa do mar. Nos Pezagno fica hereditário o posto de almirantes de Portugal; são os almirantes Peçanhas.

 

City by the sea, a view of Lisbon, 1548, Spanish woodcut.Vista da cidade de Lisboa em 1548.  Xilogravura espanhola.

 

Chegam à Madeira. Em 1446, Bartolomeu Perestrelo, português, neto de um lígure ou lombardo, messer Gabriele Palastrelli, mercador sempre, recebe a donatária da ilha de Porto Santo.  Sua filha caçula, Filipa Perestrelo Moniz, casa-se com mais um genovês, Cristoforo Colombo, o descobridor. Concentrados em Sevilha e em Cádiz, os genoveses espraiam-se de vez, na segunda metade do século XV, por sobre o Atlântico. Giovanni Usodimare fixa-se na Madeira; e também Urbano Lomellini, junto com o parente de ambos, o banqueiro de Cádiz que financiará Colombo, Lodisio d’Oria.  Lodisio d’Oria esteve comprovadamente na Madeira em 1480, onde possui engenhos de açúcar em Santa Cruz, Santana e Porto de Seixo.

Por que este avanço por cima do Atlântico? Os genoveses espalham o cultivo da cana de açúcar, que viera do oriente e fora primeiro cultivada em Creta.  Usodimare, Lomellini, d’Oria, são todos senhores de engenhos açucareiros na Madeira. O dinheiro das casas bancárias de Gênova é sacarino, e vem do mel da cana. Colombo fora, provavelmente, agente comercial destes potentados da Ligúria, assim como os filhos segundos, bastardos, os parentes pobres. Cristoforo d’Oria, nascido em Faro no Algarve e filho de Lodisio d’Oria, leva a cana de açúcar às ilhas São Tomé e Príncipe, cuja governança recebe, e onde morre, talvez no mesmo naufrágio no qual provavelmente morrem seus primos os mercadores, e genoveses, Lazzaro e Lorenzo d’Oria.

Os Dorias da ilha da Madeira descendem de Leonor Doria, “filha de um Cavalheiro Doria, genovês,” conforme se indica no título “Velloza” do Nobiliáriosa Ilha da Madeira, de Henrique Henriques de Noronha.  Os da Bahia descendentes de Clemenza Doria filha de Lorenzo ou Lorenzino d’Oria, conforme Ferlgueiras Gayo no seu Nobiliário, título “Silvas”.”

 

Em: Herdeiros do poder, Francisco Antonio Doria, e outros, Rio de Janeiro, Revan: 1994, pp 91-92





Grifo: divino e protetor da riqueza

2 08 2020

 

 

398px-Statue_of_a_Griffin,_Parliament_building_(Vienna)Escultura de um grifo, em bronze, protegendo o edifício do Parlamento Austríaco.

 

Grifos são monstros fabulosos, cujo corpo é composto de duas parte: a de cima, cabeça e asas de águia; a debaixo, patas e corpo de leão. Eles eram supostamente os guardiães  das minas de ouro, e estavam em briga perpétua com os Arimaspos, um povo guerreiro de Cítia, portadores de um único olho, que roubavam as minas para encontrar ouro com o fim de adornar os cabelos, de acordo com a mitologia grega.

Em Dante, Purgatório, XXIX, de 1308, o Grifo é simbólico da união do divino e do humano na figura de Jesus Cristo. Parte águia e parte leão levou Dante a vê-lo no Purgatório, puxando a carruagem da Igreja.

Em 1665, ele reaparece no Paraíso Perdido de Milton, no seu papel original grego de guardião da riqueza, do ouro.  Milton: Paraíso Perdido, II, 943.





Os portugueses na época da colonização, Francisco Antonio Doria

9 07 2020

 

 

 

tumblr_a3488f721d0454090b7eefee465976f9_25304cc8_640Sala dos brasões, Palácio Nacional de Sintra

 

 

“As genealogias tradicionais portuguesas, todas dos séculos XIII e XIV, o Livro Velho de Linhagens, o Livro de Linhagens do Deão e o Nobiliário do conde d. Pedro, deduzem a origem da nobreza de Portugal a partir de meia dúzia de famílias, velhas então de dois ou trÇes séculos; as investigações, hoje em dia, de José Mattoso revelam, nos século X e XI, alguns poucos mais troncos familiares, de modo que podemos supor que a classe dominante de Portugal, no século XI, cristalizou-se em boa parte à volta de um grupo de não mais que cem indivíduos que viviam no antigo Condado Portucalense (ou junto às suas fronteiras), entre o Douro e o Minho, e sobretudo nos arredores do Porto.

Pulemos uns séculos. Thales de Azevedo estima em 1.200.000 indivíduos a população portuguesa em 1530, quando começam a exploração e colonização sistemáticas do Brasil. Destes, 20% eram judeus ou cristãos-novos, alguns provindos de Castela e da Andaluzia, expulsos em 1492 pelos reis católicos, mas o restante autóctones  (ou pelo menos residindo na região lusitana da península desde o tempo dos visigodos). A elite, no começo do século XVI, era pequena: qualitativamente, víamos no seu topo o rei e sua família imediata, os infantes; depois, a família real extensa, que incluía os duques de Bragança e de Vizeu,  bastardos reais, e mais a respectiva parentela. Seguiam-se uma dúzia de titulados, como os condes de Marialva, de Atouguia ou de Vila Real, e o barão de Alvito, e o resto da nobreza, sem título, até, na base deste grupo que formava a elite, as duas ordens de fidalgos da casa real (ordem que conferia nobreza hereditária), e os cavaleiros fidalgos, escudeiros fidalgos e moços de câmara da casa real (ordem que conferia apenas um foro pessoal, sem caráter hereditário). Se juntarmos a estes os grandes comerciantes de Lisboa e do Porto, e mais os letrados e bacharéis sem origem fidalga que serviam à máquina judiciária, e ainda alguns poucos funcionários administrativos, teremos que a classe dominante portuguesa, por volta de 1530, era constituída de 10.000 indivíduos.”

 

Em: Herdeiros do poder, Francisco Antonio Doria, e outros, Rio de Janeiro, Revan: 1994, pp 20-21





Gemas da Arquitetura Carioca: Casa da Fazenda do Engenho D’Água

11 01 2020

 

 

 

Fotografada em 25 de setembro de 2014 por Eddie CordFotografada em 25 de setembro de 2014 por Eddie Cord

 

Exemplar representativo dos engenhos de açúcar do século XVIII, pertenceu  a um grande proprietário de terras da região, o Visconde de Asseca, Martim Correa de Sá, ( O rei do açúcar da velha baixada de Jacarepaguá). É uma construção localizada no bairro de Gardênia Azul, em Jacarepaguá, RJ, RJ.  Apesar de tombada pelo Patrimônio Histórico (IPHAN) em 1938, ainda é propriedade particular.

Trata-se de um casarão branco de dois andares de portas e janelas azuis. Bom exemplo de construção colonial rural. Note-se o alpendre colunado.  Era, provavelmente, uma construção simétrica, que perdeu os traços originais, como vemos hoje, com a adição de uma capela para a família à esquerda da fachada original.  Note também escada que se abre em forma de curva e azulejos que decoram o espelho da escada de acesso.

Só os jardins podem ser acessados pelo público, já que a propriedade é particular.

 

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Esmerado: coroa de ouro, dinastia Tang

30 09 2019

 

 

2019_NYR_18338_0573_000(a_very_rare_gold_headdress_7th-9th_century)Raro adorno para a cabeça (grinalda)

Dinastia Tang, séculos VII-IX Era Comum,

ouro, 31 cm

China

 

Este é um exemplo da confluência de duas culturas em um único objeto, produzido na China, entre os séculos VII e IX. Além disso, esta coroa mostra alto grau de artesanato.

O cavalo galopante, que faz parte do design em cada ponta deste adorno de cabeça, mostra a influência de uma cultura nômade, de uma tribo, das estepes da Asia Central. As patas deste bravo animal praticamente não tocam o chão.  Parecem cavalos elevados a um status mítico, com chifres e ancas em chamas. Por outro lado, os desenhos de flores remetem à dinastia Tang, das linhas entrelaçadas que as sustentam.

É aí que encontramos o casamento de duas culturas em um único objeto.

 

 





Leitura silenciosa, conosco a partir da Idade Média

28 09 2019

 

 

 

4b Benson, Ambrosius Benson - Young Woman in Orison Reading a Book of Hours, 1520sJovem em oração lendo o Livro de Horas, 1520

Ambrosius Benson ( Itália, 1495 – Flandres, 1550)

óleo sobre madeira, 21 x 13 cm

Museu do Louvre, Paris

 

 

Uma das consequências inesperadas do IV Concílio de Latrão, também chamado de O grande Concílio, em 1215,  sob liderança do papa Inocêncio III, foi o nascimento da leitura silenciosa, individual.

Neste concílio, o maior concílio  ecumênico  da  Idade  Média,  a Igreja decidiu que as confissões de pecados seriam mandatórias para o povo, para as massas.  E que todo cristão que tivesse atingido a idade de discrição (primeira comunhão) deveria, pelo menos uma vez ao ano, confessar seus pecados ao padre de sua paróquia. (cânone 21, conhecido como Omnis utriusque sexus).

Até então a catequese tinha base no ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna, na fração do pão e nas orações.  Seguia-se os passos da Igreja nos seus primórdios em que fiéis passavam seus bens para  a causa cristã e dividiam tudo entre eles. Com esse espírito houve maior adesão de leigos à Igreja e, entre outros hábitos,  a leitura da Bíblia  era comunitária.  O sistema feudal muito colaborou  para a manutenção de atitudes comunitárias.

A Igreja sempre considerou importante manter domínio sobre a  interpretação dos Evangelhos, portanto, não foi sem controvérsia, que aceitou os hábitos comunitários, baseados nos primórdios do desenvolvimento cristão. O concílio de 1215, tentou colocar um fim nisso, trazendo, entre outras modificações, a leitura para o âmbito individual.  Enquanto a confissão individual foi uma tentativa da Igreja  de se aproximar do povo, conhecer as verdadeiras preocupações do indivíduo,  na intimidade do confessionário pessoal, íntimo e velado.

 

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Com esta decisão o conceito de moralidade na Europa passou de externo, comunitário, onde todos eram responsáveis por todos;  para ser pessoal, ou seja, moralidade dependente do caráter, do juízo pessoal  e não mais dependente do julgamento da comunidade.  O nascimento da responsabilidade individual, que dois séculos depois fomentou o humanismo da Renascença, no século XIII deu espaço a hábitos solitários, como a leitura individual.

Mais tarde, esse individualismo na leitura,  foi auxiliado  com a invenção dos tipos móveis de Gutenberg que permitiu a publicação de livros com custo muito menor.

Mesmo assim, a leitura, silenciosa, individual, crescendo no íntimo do leitor, só passou a ser comum em meados do século XVIII.  Até então, a leitura pública era comum.





Esmerado: Globo Celeste, 1579

19 08 2019

 

 

 

17.190.636 #3 022Globo celestial com movimento , 1579

Gerhard Emmoser (Alemanha, ativo 1556 – 84)

Local de origem: Viena,  Áustria

Prata e latão dourados na caixa, e movimento em aço.

Dimensões: No todo 27 × 20 × 19 cm

Diâmetro do globo: 14 cm

Metropolitan Museum, Nova York

[Item não está na exposição permanente]

 

Há algum tempo atrás este globo rodava, mostrando as constelações. É um objeto único, extraordinariamente complexo como a tecnologia mecânica demonstra.  Tem também grande beleza estética.  Pertenceu ao Santo Imperador  Romano, Rodolfo II da Áustria, (reinou de 1576 a 1612) que o mantinha no seu Gabinete de Curiosidades.  Era considerado valioso tanto pela sua função como objeto científico, como por sua forma elegante. Pégaso segura o que aparenta ser um globo leve nas suas asas abertas.  A astronomia foi uma ciência que cresceu bastante nessa época graças aos conhecimentos de aritmética e geometria consideradas “as asas da mente humana”.

 

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A América no século XX

8 08 2019

 

 

 

Columbia wearing a warship bearing the words World Power as her Easter bonnet, cover of Puck (April 6, 1901). It was published from 1871 until 1918.jpg

Columbia usando um chapéu para a Páscoa com as palavras “Poder Mundial”, na capa da Revista Puck em abril de 1901.  Puck foi publicada entre 1871 e 1918.

 

 

“Nos anos 1950, a América ergueu o globo pelos tornozelos e sacudiu o troco de seus bolsos. A Europa tinha se tornado um primo pobre – só brasões, porém nenhum serviço de jantar. E os indistinguíveis países da África, da Ásia e da América do Sul tinham apenas começado a surgir nas paredes das nossas salas de aula como salamandras ao sol. Certo, os comunistas estavam por lá, em algum lugar, mas, com Joe McCarthy no túmulo e ninguém na Lua, por enquanto os russos apenas se esgueiravam pela páginas do romances policiais.”

 

Em: Regras de Cortesia, Amor Towles, tradução de Léa Viveiros de Castro, Rio de Janeiro, Rocco: 2012, página 9