Rapaz lendo em poltrona junto à janela, 1914
Arthur A Drummond (EUA, 1891-1977)
óleo sobre tela, 28 x 20cm
“Walden de Thoreau, o único livro em que a infinidade pode ser encontrada em cada página.”
Amor Towles
Rapaz lendo em poltrona junto à janela, 1914
Arthur A Drummond (EUA, 1891-1977)
óleo sobre tela, 28 x 20cm
Amor Towles
“Nos anos 1950, a América ergueu o globo pelos tornozelos e sacudiu o troco de seus bolsos. A Europa tinha se tornado um primo pobre – só brasões, porém nenhum serviço de jantar. E os indistinguíveis países da África, da Ásia e da América do Sul tinham apenas começado a surgir nas paredes das nossas salas de aula como salamandras ao sol. Certo, os comunistas estavam por lá, em algum lugar, mas, com Joe McCarthy no túmulo e ninguém na Lua, por enquanto os russos apenas se esgueiravam pela páginas do romances policiais.”
Em: Regras de Cortesia, Amor Towles, tradução de Léa Viveiros de Castro, Rio de Janeiro, Rocco: 2012, página 9
A ponte de Brooklyn: variação sobre um tema antigo, 1939
Joseph Stella (Itália/EUA, 1877 – 1946)
óleo sobre tela, 178 x 107 cm
The Whitney Museum of American Art, Nova York
Encantada com Um cavalheiro em Moscou, do escritor americano Amor Towles, procurei seu primeiro livro, Regras de Cortesia, publicado sem grande fanfarra, no Brasil, em 2012, pela Editora Rocco, com tradução de Léa Viveiros de Castro. Temerosa dessa leitura não chegar aos pés do feitiço da anterior, fui devagar à fonte, li outros autores no intervalo, para poder apreciar a obra de maneira mais distante. Levei um pouco mais de tempo para sucumbir ao charme da voz narrativa de Amor Towles neste livro. Mas acabei a leitura tão encantada quanto com o livro anterior. E hoje, não consigo me decidir qual deles mais me agrada.
Amor Towles traz para seus textos imagens novas em linguagem sedutora. Regras de Cortesia se passa em um único ano. Cobre do Ano Novo de 1937-38 a dezembro de 1938. A personagem principal, aquela que me fascinou, com a qual reconheci o verdadeiro espírito da nova-iorquina típica, cavadora, trabalhadora, desenvolta, diligente, buliçosa, filha de imigrantes que acredita na possibilidade de crescer e subir na vida, é Katey Kontent que, vinda de Brighton Beach em Brooklyn, trabalha como secretária numa firma de advocacia em Wall Street e mora na pensão da Sra. Martingale, junto a outras jovens como ela. Katey está alerta para todas as oportunidades de crescimento. Neste fim de ano de 1937, está acompanhada da amiga, Eve Ross, jovem do interior do país, filha de pequenos fazendeiros, que também sonha em escapar do destino que lhe parece inevitável na cidade natal, fugindo para Nova York, a tentar sorte e fortuna. Juntas passam uma das mais interessantes comemorações de Ano Novo, quando conhecem Theodore (Tinker) Grey, rapaz de família abastada, que ambas reconhecem como um bom partido, ainda que provavelmente fora de suas possibilidades sociais. Temos aí o trio de personagens que constrói a história de Regras de Cortesia.
Mais do que a trama entre esses personagens, Amor Towles delineia uma Nova York excitante e cheia de possibilidades para quem consegue, como Katey Kontent, navegar Manhattan de cima abaixo, dos bairros boêmios aos ricos fronteiriços ao Central Park. Jovem e energética, Katey nos leva aos quatro cantos da ilha, passando por mais de um emprego, por uma gama de conhecidos das classes abastadas, através das quatro estações do ano. Ao final de 1938 encontramos Katey no alto escalão de sociedade nova-iorquina como secretária da Condé Nast. Um ano extraordinário para os três personagens cujas vidas se entrelaçam.
Regras de Cortesia é um retrato de uma época, o retrato vibrante da grande cidade americana, no desenvolvimento que viria a torná-la a capital mundial depois da Segunda Guerra. Através de Katey, Ema, Tinker e seus companheiros temos a sensação de rever o final da década de 1930, pós-Depressão e testemunhar o espírito que melhor define a maneira de ser nova-iorquina. Um excelente retrato do espírito da época, ou Zeitgeist. Leitura fartamente recomendada para quem gostaria de presenciar o espírito do que levou ao desenvolvimento de Nova York, da segunda metade do século XX e dos EUA.
NOTA: este blog não está associado a qualquer editora ou livraria, não recebe livros nem incentivos para a promoção de livros.
Reflexões, 1921
Ethel Porter Bailey (GB, 1872-1944)
óleo sobre tela
“Pode-se dizer o que quiser sobre a nuance psicológica de Proust ou sobre a extensão da narrativa em Tólstoi, mas não se pode negar o prazer que a Sra. Christie proporciona. Seus livros são tremendamente gratificantes.
Sim, eles são formalistas. No entanto, essa é uma das razões pelas quais eles são gratificantes. Com cada personagem, cada aposento, cada arma do crime dando a impressão de ser ao mesmo tempo algo novo e familiarmente rotineiro (o papel do tio pós-imperialista chegado da Índia sendo desempenhado aqui pela solteirona de Gales do Sul, e os suportes de livro que não combinam no lugar do vidro de veneno na última prateleira do barracão de ferramentas do jardim), a Sra. Christie distribui suas pequenas surpresas com o ritmo cuidadosamente calibrado de uma babá distribuindo balas para as crianças sob seus cuidados.
Mas acho que existe outro motivo para eles agradarem tanto – um motivo que é pelo menos tão importante, se não mais, que é o fato de que no universo de Agatha Christie todo mundo, no fim, recebe o que merece.
Riqueza ou pobreza, amor ou perda, uma pancada na cabeça ou a corda do enforcado, nas páginas dos livros dela, homens e mulheres, não importa sua idade, não importa seu nível social, são colocados cara a cara com o destino condizente. Poirot e Marple não são na verdade personagens centrais no sentido tradicional. Eles são simplesmente os agentes de um complicado equilíbrio moral que foi estabelecido pelo Todo Poderoso no início dos tempos.”
Em: Regras de Cortesia, Amor Towles, tradução de Léa Viveiros de Castro, Rio de Janeiro, Rocco: 2012, p. 239.
NOTA: Nesta tradução, de Léa Viveiros de Castro, logo na primeira frase do segundo parágrafo mostra a palavra “formulaic” traduzida por formalista, quando na verdade, a melhor tradução teria sido formulaico, que vem de fórmula e não formalista cuja conotação é de seguir regras estritas. Deve haver alguma razão para esta tradução, já que esta é uma das mais conhecidas tradutoras do inglês. Noto isto porque li originalmente o texto em inglês e o anotei porque havia a rotulação das obras de Agatha Christie seguirem uma fórmula e me surpreendi com a tradução quando procurei essa passagem na edição brasileira.
UM CAVALHEIRO EM MOSCOU
Amor Towles
Intrínseca: 2018, 464 páginas
SINOPSE
Nobre acusado de escrever uma poesia contra os ideais da Revolução Russa, Aleksandr Ilitch Rostov, “O Conde”, é condenado à prisão domiciliar no sótão do hotel Metropol, lugar associado ao luxo e sofisticação da antiga aristocracia de Moscou. Mesmo após as transformações políticas que alteraram para sempre a Rússia no início do século XX, o hotel conseguiu se manter como o destino predileto de estrelas de cinema, aristocratas, militares, diplomatas, bons-vivants e jornalistas, além de ser um importante palco de disputas que marcariam a história mundial. Mudanças, contudo, não paravam de entrar pelo saguão do hotel, criando um desequilíbrio cada vez maior entre os velhos costumes e o mundo exterior. Graças à personalidade cativante e otimista do Conde, aliada à gentileza típica de suas origens, ele soube lidar com a sua nova condição. Diante do risco crescente de se tornar um monumento ao passado até ser definitivamente esquecido, o Conde passa a integrar a equipe do hotel e a aprofundar laços com aqueles que vivem ao seu redor. Com sua perspectiva única de prisioneiro de duas realidades distintas, o Conde apresenta ao leitor sua sabedoria e sensibilidade ao abandonar certos hábitos e se abrir para as incertezas de novos tempos que, mesmo com a capacidade de transformar a vida como a conhecemos, nunca conseguirão acabar com a nobreza de um verdadeiro cavalheiro.