Cartas de viagem: Espanha V

30 09 2009

girassolCampos de girassóis dominam a paisagem rural da Alta Andaluzia, de Jaen a La Carlota.

 

 

25 de outubro

 

Meus queridos,

Deixamos Córdoba em direção a Portugal, ontem à tarde.  No caminho me lembrei que tinha duas cartas e quinze cartões postais para colocar nos Correios.  Já estávamos a caminho. De modo que decidimos parar na primeira cidade que encontrássemos.  Paramos afinal num lugar chamado La Carlota.  Lá, tive uma experiência muito interessante.

La Carlota é cortada em duas pela estrada em que viajávamos.  Depois de ter ido ao lado errado da cidade, finalmente me disseram que eu tinha que atravessar a estrada para lá  achar os Correios, dentro da prefeitura.  Na prefeitura eu os achei do outro lado de um enorme jardim interno cheio de laranjeiras, escondido por filas e filas de pessoas umas indo para a enfermaria da cidadezinha (parecia fila de atendimento médico brasileiro); outras indo para uma caixa receber pensões: uma longa fila de senhoras idosas vestidas de preto.  Havia outras filas, mas com franqueza não me lembro para que, só que o reboliço era enorme, crianças chorando, balbúrdia geral.  Nos Correios eu me deparei com um senhor bem redondinho, que olhou muito intrigado para a minha pilha de cartões, olhou bem para os endereços, coçou a cabeça e apanhou um livro grande, que mais parecia um dicionário do século XIX e pôs-se a procurar por alguma coisa.  Alguns momentos depois ele me disse que não tinha ali os selos necessários para as tarifas das cartas para o Brasil, nem dos cartões postais.  Mas que ele achava que a tabacaria do outro lado da praça talvez tivesse.

 

campiña, la carlota

Região de La Carlota, Espanha. 

 

Esse homenzinho, então, calmamente tirou o avental que trazia por sobre a roupa normal, saiu detrás do balcão,  fez um aceno com a mão para que eu saísse da sala também, colocou um cartaz na porta, “Correios Fechados” e me levou, quase pela mão, até o outro lado da praça à tabacaria em questão.   Na loja eu tive que comprar setenta selos e precisei colá-los lá mesmo.  Cada carta levou cinco selos, cada postal quatro.  Os donos da loja se colocaram à minha disposição imediatamente e nós três começamos a lamber os selos ( que já vêm com cola) e colá-los, tudo na mais perfeita comunhão de interesses.  Conversamos um pouco com o meu brasinhol e depois de dizerem que era bom mesmo que eu estivesse escrevendo para minha mãe “porque mãe é a coisa mais preciosas que temos no mundo”, eles se candidataram a me levar de volta aos Correios onde eu teria que depositar a correspondência numa caixa amarela.   Eu garanti que sabia voltar, e eles relutantemente me deixaram ir.

Quando estou para colocar as cartas na caixa amarelíssima, bem na entrada dos Correios, de lá, sai depressa num passo de jato o homenzinho redondinho, tomou os postais e as cartas de minhas mãos, segurou-os com firmeza e cuidado e me garantiu de uma maneira bem importante que iria “tomar conta dessa correspondência pessoalmente”.

Sabem agora por que eu adoro a Espanha?

 

Saudades e beijinhos, a próxima carta já será de Portugal.  Já quase dá para ver a fronteira! H. se anima, adora Portugal e sente saudades da comida portuguesa!   L.