
Laurentino Gomes
Acabo de ler esta passagem que transcrevo:
Os portugueses, europeus? — Riu-se com mansidão.
— Nunca foram. Não o eram antes e não o são hoje. Quando conseguirem que Portugal se transforme sinceramente numa nação européia o país deixará de existir. Repare: os portugueses construíram a sua identidade por oposição à Europa, ao Reino de Castela, e como estavam encurralados lançaram-se ao mar e vieram ter aqui, fundaram o Brasil, colonizaram a África. Ou seja, escolheram não ser europeus.
[Um estranho em Goa, José Eduardo Agualusa, Gryphus: 2001, Rio de Janeiro, p. 46]
E me lembrei de ter aprendido, agora com as comemorações dos 200 anos da chegada da corte portuguesa ao Rio de Janeiro, que um plano de fuga, para a corte, de Lisboa para o Brasil, já existia há muitos anos. Laurentino Gomes, no seu brilhante livro 1808, mostra que tal plano já existia desde 1736, quando o então embaixador português em Paris, Luiz da Cunha, escrevia num memorando secreto a D. João V que Portugal não passava de “uma orelha de terra”, onde o rei “jamais poderia dormir em paz e em segurança”. A solução sugerida por Cunha era mudar a corte para o Brasil, onde D. João V assumiria o título de “Imperador do Ocidente” e indicaria um vice-rei para governar Portugal.
[1808, Laurentino Gomes, Planeta: 2007, São Paulo, p. 47]
Aliás será interessante lembrar que o ensaista e historiador acabou de ser agraciado com o prêmio Prêmio da Academia Brasileira de Letras na categoria ensaio por este livro que narra a vinda da família real para o Brasil em 1808. Um prêmio muito merecido.