Muhammad Yunus — quem é segundo mais votado intelectual?

12 08 2008

Este é o segundo da série de perfis das pessoas votadas como os maiores pensadores do mundo de hoje em pesquisa feita pelas revistas Prospect da Inglaterra e Foreign Policy dos EUA no primeiro semestre deste ano.

 

Veja:

Fethullah Gülen – quem é o intelectual n° 1 do mundo?

Você conhece os 10 mais importantes intelectuais de 2008?

 

 

 

 

  Muhammad Yunus, (Chittagong, 28 de junho de 1940) é um economista e banqueiro de Bangladesh.

 Em 2006 foi laureado com o Prémio Nobel da Paz. É autor do livro Banker to the poor (em Portugal, O banqueiro dos pobres, sem edição no Brasil). Pretende acabar com a pobreza através do banco que fundou, do qual é presidente.  O governo de Bangladesh é o principal acionista deste banco [Grameen Bank], que oferece ativamente microcrédito para milhões de famílias. Yunus afirma que é impossível ter paz com pobreza.

 

Muhammad Yunus formou-se em Economia em Bangladesh, doutorou-se nos EUA e foi professor na Universidade de Dhaka. Em 1976, constatou as dificuldades de pessoas carentes em obter empréstimos na aldeia de Jobra, em um Bangladesh empobrecido e recém-separado do Paquistão. Por não poderem dar garantias, os bancos recusavam-lhes as pequenas quantias que permitiriam comprar materiais para trabalhar e vender, e os usurários taxavam os empréstimos com juros altos.

 

Muhammad Yunus criou então o Banco Grameen, que empresta sem garantias nem papéis.O banco tem 7.500.000 (sete milhões e meio de clientes) em mais de 70 mil aldeias em Bangladesh.  Mulheres são a maioria de sua clientela: elas são 97% dos beneficiários. A taxa de crédito paga de volta, sem danos, sem insolvência é de 98,5%.

 

O seu lema é: Dê poder aos pobres.  [ Empower the poor ].  Ele acredita, por exemplo, que as mudanças na vida cotidiana mundial conseqüentes dos avanços em tecnologia, estão trazendo mais modificações na vida de todos do planeta que não se pode comparar com qualquer tipo de desenvolvimento do passado.  Por isso é imprescindível que a tecnologia mais avançada esteja ao alcance de todos inclusive dos mais pobres entre os pobres.  Um exemplo do avanço da tecnologia que ele dá, é uso dos telefones celulares que trouxeram grande revolução no modo de vida de milhões e milhões de pobres no mundo.

Mohammad Yunus

Mohammad Yunus

 

 

 

 

 

 

Yunus criou uma variedade enorme de negócios todos sob o domínio das Companhias Grameen. A maioria destas companhias  tem a ver com tecnologia: a maior companhia de telefones celulares de Bengladesh, que também é a maior companhia privada do país, um provedor de internet, uma companhia de produtos eletrônicos, uma companhia de consultoria de negócios na internet, e uma construtora de edifícios com escritórios de alta tecnologia.   Yunus ajudou também a criar aproximadamente 25 companhias e instituições tanto em Bengladesh, como em outros países, cujo intento é ensinar aos pobres como saírem da pobreza, como melhorarem seu modo de vida.  Entre os muitos negócios que construiu com esta finalidade estão companhias de criação de peixes em tanques, companhias de tecelagem em malha e planos de saúde.   Sua maior preocupação no mundo da tecnologia é a invenção de ferramentas tecnológicas que possam vir a ajudar os pobres diretamente, principalmente ajudar às mulheres pobres de países do terceiro mundo.  

 

Quando perguntado por que esta preocupação de colocar alta tecnologia a serviço dos pobres ele responde que não é um seguidor de C.K. Prahalad, autor do livro: The Fortune at the Bottom of the Pyramid. [ traduzido para o português como: A Riqueza na base da pirâmide, publicado pela Editora Bookman: 2005, 391 páginas, acompanhadas por CD].   Porque “os pobres não são os meios de se fazer dinheiro; eles são um mercado que necessita de ajuda.  Os ricos não devem enriquecer a custa dos pobres”.

 

Por outro lado ele nega veementemente que queira acabar com as companhias que trazem lucro.  “Elas precisam existir”, ele diz “mas um outro tipo de comércio precisa existir”. E então ele menciona o projeto que Bill Gates lançou no último Encontro de Davos, chamado “capitalismo criativo”.

 

Ele acredita que empreender é parte da natureza humana. E que sua maior contribuição seria em mostrar que “as empresas sociais podem e devem fazer negócios com objetivos sociais”. Essa é a grande lição a que se dedica.

 





Pensando sobre imigração e emigração *

25 07 2008

 

 

Neste ano em que comemoramos o centenário da chegada dos imigrantes japoneses no Brasil é interessante ver o que está acontecendo no Japão de hoje, em termos de crescimento populacional.  Para que isto não pareça só um caso do Japão vou primeiro mencionar cinco tendências demográficas mundiais, que não podemos deixar de reconhecer.  Elas certamente afetarão as nossas vidas, mesmo aqui no Brasil, nem que indiretamente.  Vale lembrar: estima-se que atualmente a população do nosso planeta esteja por volta de 6.200.000.000 (seis bilhões e duzentos milhões).

Monobloco em Copacabana, 2007.

Monobloco em Copacabana, 2007.

 

 

 

 

Cinco tendências demográficas mundiais.

 

A migração de povos de um continente para o outro só deve aumentar nos próximos 50 anos.   Há 5 tendências demográficas mundiais que colocarão em cheque todas as medidas contra e a favor da migração de certos povos para longe de suas terras natais, assim como, colocarão maior pressão numa educação de qualidade para qualquer família, estado ou país  que queira que seus cidadãos tenham a chance, a possibilidade de melhorarem relativamente de status social.  As pressões se farão sentir também no meio ambiente, na medicina mundial, na produção de alimentos. 

 

Vejamos estas tendências:

 

1 – Europa e Ásia envelhecem: Itália, Espanha e Japão, por exemplo, têm taxas de natalidade baixas.  Itália e Espanha: 1,3 crianças por mulher;  o Japão, 1,2 .   Isto é muito abaixo dos 2,1 filhos por mulher considerados necessários para a manutenção de qualquer população, sem crescimento.  Em 2050, ou seja, em 40 anos, a população destes países acima dos 60 anos representará 39% na Itália e na Espanha e 44 % no Japão.    Estas mudanças são muito sérias e afetarão tanto o sistema de saúde como o de aposentadoria nestes países.

 

2 – A África continua com crescimento populacional sem limites.  Mulheres que vivem em países pobres e mulheres que não receberam muita educação têm a tendência de ter maior número de filhos.   De acordo com projeções das Nações Unidas, a Etiópia por exemplo, crescerá muito até 2030 e a Uganda terá mais habitantes em 2040 do que toda a população da Alemanhade hoje.  A fome deve aparecer ainda mais violenta nestes países e no continente africano em geral.  O crescimento populacional desordenado está concentrado principalmente na Nigéria, Congo e Eritréia.  Além destes países, Burkina-Faso, Angola, Uganda, Somália, Libéria terão suas populações triplicadas até meados deste século, ou seja nos próximos 40 anos.  

 

3 – A AIDS acabará com 9% da população em idade de trabalho na região do Sub-Saara.  São 23 países africanos que devem perder entre 9 e 10% de suas populações em idade produtiva.  Infelizmente esta tragédia, é o único freio populacional efetivo nas populações africanas. [ World Population Prospects – The 2002 Revision, 2/ 2003]

 

4 – Faltam mulheres na Ásia.  Por uma preferência cultural por filhos homens, a China e a Índia, sofrerão ainda mais do que sofrem hoje com um desequilíbrio populacional extremamente preocupante: China: 18 homens para cada mulher.  Índia: 12 homens para cada mulher.   Em 2020, ou seja, daqui a 12 anos, haverá 30 milhões de homens em idade produtiva sem poderem se casar.  Na Ásia, os países cujas populações mais crescem são:  Índia, Paquistão, China, Indonésia.

 

5 – O sul emigra para o norte.  As populações mais pobres do norte e do sul da África migrarão para os países mais ricos, ao norte do Equador:  Estados Unidos e países da Europa serão seus alvos.   Note-se que a população hispânica nos EUA, se continuar a crescer nos níveis em que cresce hoje, deve representar 24% da população em 2050.

 

As conseqüências óbvias destes problemas são: maior pobreza – nível de vida baixando nestes países de grande crescimento populacional, maior índice de analfabetismo.  Faltará alimentos e faltará água.  Não haverá como manter um nível mínimo de saúde publica sem intervenção de fora.  Problemas ambientais, já em níveis perigosos só aumentarão. 

 

Veneza, Itália.  Praça deserta.  Foto Marilynn.

Veneza, Itália. Praça deserta. Foto Marilynn.

 

O curioso caso do Japão mostra o que os países com decréscimo populacional enfrentarão.   O declínio demográfico do Japão já estava previsto há tempos.   A curiosidade é que ele já é o país com a maior população acima de 65 anos: 20%.   Simultaneamente, tem a menor população jovem do mundo, só 14% de japoneses estão com idade abaixo de 15 anos.  Seu índice de reprodução é um dos mais baixos do  mundo: 1,3 por mulher em idade fértil.  Hoje com 127.700.000 de habitantes, espera-se que tenha 121.100.100 em 2025, ou seja uma diminuição de 8.000.000 em 17 anos.   Desde 2005 que o Japão tem mais mortes do que nascimentos.

 

O ministério da Saúde do Japão desde 2005 não deixa de alertar aos japoneses as drásticas conseqüências econômicas para o país destes números:  o crescimento econômico ficará parado; o peso das aposentadorias apoiado na população ativa causará uma baixa nos salários para poder financiar as aposentadorias.  

 

As causas destes números de esvaziamento populacional são muitas, mas entre elas estão as mulheres se casando cada vez mais tarde, as mulheres se recusando ao antigo modelo familiar de permanecer em casa sem o privilégio de uma carreira e o custo de uma família numerosa ser muito elevado alem de precários meios de apoio à guarda das crianças quando as mães trabalham fora de casa.  Outra curiosa conseqüência do esvaziamento populacional é o aumento de emprego para pessoas acima de 60 anos.  Há empresas como, por exemplo, a Mystar 60, que não emprega ninguém com menos de 60 anos de idade.

 

Há dois caminhos para o Japão e outros países com a Itália e a Espanha que provavelmente serão usados simultaneamente:  1) criarem uma melhor condição de apoio às mulheres que trabalham fora, para assim poderem aumentar de novo a população nativa. Esta é uma solução  2) abrir as portas para a imigração: esta solução seria a maneira mais rápida de contornar os problemas imediatos.  Esta solução, no entanto, nem sempre é bem-vinda.  Não necessariamente por preconceito.  Mas porque para que a Europa possa manter o nível de crescimento populacional em simples reposição, ou seja, 2,1 filhos por mulher, seria necessário que sua população fosse aumentada de pelo menos 500.000.000 de pessoas.  Ou seja, os nativos, os espanhóis, italianos, irlandeses e outros seriam minorias em seus próprios rincões.

 

Financial Times

Milhões de chineses parados na volta das férias. Foto: Financial Times

 

Será que ainda mais brasileiros estarão migrando para o Japão?  A emigração brasileira continuará e provavelmente aumentará.  Principalmente se não educarmos melhor os nossos cidadãos, se não providenciarmos meios de boa sustentabilidade de empregos.  Infelizmente, o que espera a maioria dos brasileiros lá fora, não só hoje, mas no futuro, são de fato os pequenos trabalhos, os trabalhos manuais, serviçais, de baixo conhecimento, de baixo nível intelectual.  Estaremos exportando, como muitos países da África e do Oriente mão de obra não qualificada.  Esta realidade não é muito atraente, ainda mais quando levamos em consideração que para mão de obra não qualificada, competimos com orientais, africanos e outros latino-americanos que trabalham e trabalharão felizes por muito menos dinheiro que nós.   Este é um problema sério a ser enfrentado hoje.  Não amanhã, ou no futuro.  Suas conseqüências são muito mais imediatas do que imaginamos.

 

* os dados mencionados aqui vieram das ONU, da pesquisa feita pela revista americana, Foreign Policy, em setembro de 2007 e  pelo IBGE.   Todos dados de livre acesso online.





Fethullah Gülen – quem é o intelectual n° 1 do mundo?

16 07 2008
Fethulah Gülen

Fethulah Gülen

Este é o primeiro da série de perfis das pessoas votadas como os maiores pensadores do mundo de hoje em pesquisa feita pelas revistas Prospect da Inglaterra e Foreign Policy dos EUA no primeiro semestre deste ano. 

O primeiro colocado foi o filósofo e líder religioso Fethullah Gülen. 

 Fethullah Gülen nasceu na Turquia. É um líder islamita que desde 1999 mora no estado da Pensilvânia, nos EUA, onde sua permanência até meados deste ano poderia ter sido considerada como um asilo político, já que, até então, encontrava-se acusado pelo Tribunal de Segurança da Turquia, por supostamente estabelecer uma organização cujo objetivo seria corromper a estrutura secular do governo e estabelecer uma sólida base corânica no país.  Mas, no dia 24 de junho de 2008, a Suprema Corte de Apelações rejeitou a objeção da Procuradoria Geral da Turquia à absolvição do intelectual.  Assim, absolvido, Fetullah Gülen poderá voltar à Turquia e ser recepcionado por seus muitos seguidores não só para comemorar a decisão da Suprema Corte, mas também a votação na pesquisa mencionada acima.

Não é de hoje que Gülen se tornou uma das mais influentes mentes muçulmanas no mundo, com milhões de seguidores, não só na sua terra natal, como em todos os países muçulmanos da Ásia Central à Indochina; da Indonésia à África.   Suas posições que levaram ao chamado Movimento Gülen, são baseadas em três dogmas: a advocacia da tolerância; a crença no diálogo e a procura sistemática da reconciliação entre os povos.  Sua incessante requisição para diálogo, tem-se tornado ainda mais urgente à medida que as comunicações internacionais se ampliam e o mundo torna-se a grande aldeia prevista pelo filósofo canadense Marshall McLuhan.   De acordo com Gülen os muçulmanos não podem, nem devem, construir uma identidade baseada em qualquer valor destrutivo, como o conflito e a confrontação.  Estes não estariam de acordo com os valores humanos e universais do Islã.

  

 
 

 

Freqüentemente mal compreendido, este movimento não se considera um movimento político ou ideológico.  Trabalha principalmente na ação social, próxima da filosofia sufi, e, como tal, é bastante diferente de todos os outros movimentos islâmicos.  Muito moderno, não faz parte de nenhuma ordem religiosa — numa definição, mais restrita, mais histórica da palavra — não é uma fraternidade e nem mesmo uma ordem sufi (uma tarica).  É um movimento que demonstra uma capacidade imensa de organização e um dinamismo em geral não associados ao Islã.  Estas características já germinaram respostas entusiasmadas no campo cultural e social.  Tolerância e relações amistosas entre diferentes comunidades são a demonstração, para muitos, de que o movimento Gülen pode ter sucesso.   Pregando a abnegação e o altruísmo, que na visão sufi de Gülen, fazem a essência da religião muçulmana, sua filosofia prega idéias bastante democráticas, considerando que os povos devem escolher seus governantes, ao invés de serem governados por uma autoridade superior.  Para Gülen, o indivíduo tem prioridade sobre a comunidade e cada ser humano deve ser livre para escolher seu próprio estilo de vida.

 

 

 

Mas este individualismo não é para ser levado a extremos.  O ser humano tem melhor qualidade de vida no seio de uma sociedade e para isto precisa adaptar seus desejos e sua liberdade aos critérios da vida social do grupo a que pertence.  Então aquele que quiser reformar o mundo deve primeiramente olhar para si próprio e se reformar, se remodelar.  É seu dever mostrar aos outros o caminho para um mundo melhor.

Rodopio Dervixe, de Maria Taurus, Unesco

Rodopio Dervixe, de Maria Taurus, Unesco

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Gülen diz que um dos problemas de se falar, hoje em dia, em cultura islâmica, vem da associação que muitos fazem do Islã a um sistema político. Quem vê o Islã como um sistema político, é quem precisa admitir que o que o leva a agir é uma raiva pessoal, até social, uma hostilidade, incompatível com o verdadeiro Islã.  Porque esta é uma religião que tem o ardor da verdadeira crença, uma forte essência espiritual e valores morais profundamente enraizados.  Estas qualidades que dão aos muçulmanos grande retidão de caráter permitem que eles possam absorver a supremacia científica, tecnológica, econômica e militar do ocidente, sem que estas os corrompam. O Islã, ele defende, trata da alma das pessoas, do que é sentida por dentro, como conseqüência, as vantagens materiais desenvolvidas pelo ocidente não poderiam corromper a verdadeira alma muçulmana.   Mas, alguns muçulmanos e políticos ao invés de verem o Islã como uma religião, fazem dele uma ideologia política, sociológica e econômica.  Esquecendo-se de que o muçulmano é aquele protege os outros contra o mal; de que é o verdadeiro representante da paz e da segurança. 

Por mais de 1400 anos o ocidente e os muçulmanos se combatem.  Agora, nesta aldeia global, é necessário que estes dois lados se entendam.  E que aceitem que o ocidente não conseguirá eliminar o Islã, assim como o Islã não conseguirá dominar o ocidente.   Ambos terão que fazer concessões.

 

 

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NOTA: O nome de Fethullah Gülen, também pode aparecer com dois “ll” como em Güllen.

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