Flash!

1 08 2025

Os poetas Emílio Moura e Carlos Drummond de Andrade, andando na rua, 1932.





Trova do pai

1 08 2025
“Só nós dois1” ilustração de Harry Anderson (1906 – 1996)

 

 

Amigo está sempre a fim

de amparar, se a gente cai;

eu tive um amigo assim:

– esse amigo era meu pai!

 

(Albertina Moreira Pedro)





Na Mantiqueira, poesia de João Guimarães Rosa

31 07 2025

Paisagem Primaveril em São Conrado, RJ

Pedro Bruno (Brasil,1888-1949)

óleo sobre madeira, 32 X 41cm

 

 

Na Mantiqueira

 

João Guimarães Rosa 

 

Por entre as ameias da cordilheira

dormida,

a lua se esgueira,

como um lótus branco

na serra de dorso de um crocodilo,

brincando de esconder.

Dá para o alto um arranco,

repentino,

de balão sem lastro.

E sobe, mais clara que as outras luas,

quase um sol frio,

redonda, esvaindo-se, derramando,

esfarelando luz pelos rasgões,

do bojo farpeado nas pontas da montanha.

 

 

Em: Magma, primeiro livro de João Guimarães Rosa, 1936, premiado em concurso pela Academia Brasileira de Letras, mas só publicado seis décadas mais tarde: em 1996, pela Nova Fronteira.





O brasileiro: Eça de Queirós, duas definições

29 07 2025

Recebe o afeto que se encerra, Ordem e Progresso

J. Carlos (Brasil, 1884-1950)

aquarela e nanquim sobre papel, 40 x 33 cm

 

 

“Porque, enfim, o que é o Brasileiro? É simplesmente a expansão do Português.”

 

Eça de Queirós

 

“O Brasileiro é o Português – dilatado pelo calor.”

 

Eça de Queirós

 

Ambas as definições do ‘brasileiro’ vêm da publicação, Uma campanha alegre, um apanhado de crônicas publicadas em dois tomos nos anos de 1890-1891.





Trova do orgulho do pai

28 07 2025
Ilustração, Jessie Willcox Smith.

 

 

Discreta, naturalmente,

minha ternura se trai,

ante um tiquinho de gente

que me chama de “Papai”!

 

(Cesídio Ambrogi)





Dia a dia…

28 07 2025

 

 

Hoje foi dia de me encontrar com o pessoal do grupo de leitura Preciosa, que tem direção de Rose Nobre. Na berlinda estava o livro da moda, O colibri.  Eu já o havia lido e não reli para o encontro.  Foi interessante perceber que as passagens de que me lembrava eram totalmente diferentes das passagens que mais marcaram outros leitores.  E por qualquer razão, parecia que tínhamos visto passarinho verde, porque nos rimos muito nesse encontro.  Como sempre um prazer.





Sobre a solidão, Rosa Montero, (trecho)

19 07 2025

Moça lendo, 1947

Francesc Domingo Segura (Espanha-Brasil, 1893-1974) 

óleo sobre tela, 73 x 60 cm 

 

 

“A característica essencial do que chamamos de loucura é a solidão, mas uma solidão monumental. Uma solidão tão grande que não cabe na palavra solidão e que não podemos nem imaginar se não estivemos lá. É sentir que você se desconectou do mundo, que não vão conseguir te entender, que você não tem #palavras para se expressar. É como falar uma língua que ninguém mais conhece. É ser um astronauta flutuando à deriva na vastidão negra e vazia do espaço sideral. É desse tamanho de solidão que estou falando. E parece que na dor verdadeira, na dor-avalanche, acontece algo parecido. Embora a sensação de desconexão não seja tão extrema, você tampouco consegue dividir nem explicar seu sofrimento.”

 

Em: A ridícula ideia de nunca mais te ver, Rosa Montero, tradução de Mariana Sanchez, Todavia: 2019





Resenha: A Fábrica, Hiroko Oyamada

18 07 2025

 

Faço questão de escrever minha avaliação sobre esse livro: ou a tradução não está boa, ou a escrita é falha. Não dá nem para decidir qual desses problemas é o maior. Sou leitora de muitos anos de literatura japonesa contemporânea e clássica.  Encontrei nesse campo livros fenomenais, mas esse foge dessa experiência, por completo.

Ler um livro em que chego ao final sem saber: 1) quem está narrando, 2) é um homem? 3) é uma mulher?  Não sei.  E de repente achar que foram mais de um narradores…  não faz sentido.  O livro não tem inicio nem fim claros.  Sei que deve ser um tipo realidade distópica.  Mas  distópico ficou o meu cérebro querendo saber exatamente por que?  Por que estava lendo esse texto? Um livro pequeno que pareceu interminável.

E ganhou prêmios!  E há resenhistas dando 5 estrelas!  Meu palpite: não leram  Dizer como a editora diz: uma literatura semelhante a do escritor checo Franz Kafka, mas atual e do Japão, é intencionalmente apontar para farsa. Tenho certeza de que se possível Kafka está revoltado em seu túmulo com essa comparação.  Não gastem o seu dinheiro com esse livro.  Li porque foi o livro escolhido por votação no meu grupo de leitura.  Todos os participantes não gostaram inclusive aqueles que, como eu, chegaram até o fim.  Porque a maioria abandonou no caminho.

O que ganhei com esse livro? Aprendi sobre um rodente sul-americano: núria.  Acho que poderia ter vivido o resto de minha vida sem conhecê-lo.  NOTA ZERO





Resenha: Línguas, Domenico Starnone

17 07 2025

Moça lendo à janela, 1928

Albert André (França, 1869-1954)

óleo sobre tela, 73 x 61 cm

 

 

 

Línguas, de Domenico Starnone, com tradução de  Maurício Santana Dias, foi o terceiro livro do autor que li. Posso dizer que gostei de sua escrita desde que o encontrei em Assombrações (2018) e Laços (2017). Gosto imensamente de sua voz narrativa: calma, nostálgica, reflexiva.  Sua escrita é de nuances. Ele não precisa abrir o jogo, contar tudo, tintim por tintim. Ele nos deixa espaço para imaginar e sonhar; ar para respirar e tempo para absorver o lugar, os sons, as memórias do autor que se imiscuem com as nossas.

Línguas é um pouco diferente dos outros que li.  Menos fluido. Tem breque. É uma obra em dois tempos. Primeiro vemos o delicioso despertar do primeiro amor de um menino de oito ou nove anos, em Nápoles.  Ele se apaixona por uma menina do edifício em frente ao dele. Ela é bem mais arrojada que ele, flerta com a morte, dançando no peitoril da varanda.  Ela é diferente. Diferente de tudo que ele conhece. Ela não é como ele, do sul da Itália. Vem do norte e por isso, para surpresa do apaixonado garoto, ela fala com outro sotaque, usa vocabulário diverso, demonstra maneira de se expressar inesperada.  A paixão dele, só aumenta.  É o fascínio do outro, do desconhecido.  Mas, para atrapalhar, no horizonte, há Lello, um amigo, que também se apaixona pela milanesa.  Com o triângulo amoroso formado, a briga pela atenção da menina se desenvolve.  Irão às vias de fato?  Deixo isso para descoberta do leitor…  Depois… temos a segunda parte dessa história. Os dois, que em criança haviam sido apaixonados por Emanuela, se encontram, são jovens adultos.  Continuam a não se gostar e nesse encontro, e só então, Lello, o rapaz que sabe tudo de tudo, revela o verdadeiro destino da jovem bailarina de Milão.

 

 

 

Além da fascinante arte narrativa de Starnone, aprecio as diversas referências à literatura clássica em suas obras.  Da mera alusão à mitologia greco-romana, aos contos medievais, vamos nos informando, circundando assuntos cujas menções ecoam e enriquecem o texto.  Em Línguas, a própria abertura, o primeiro parágrafo ele já se refere ao trágico mito grego de Orfeu e Eurídice.  A leitura atenta, já vislumbra, nas primeiras frases que abrem o texto, por causa dessa referência,  um desfecho trágico, uma morte, quem sabe?  

Entre os oito e os nove anos de idade, decidi encontrar a fossa dos mortos. Tinha acabado de aprender nas aulas de italiano da escola a fábula de Orfeu e Eurídice debaixo da terra, onde ela havia ido parar por causa de uma picada de cobra. Eu planejava fazer o mesmo com uma menina que infelizmente não era minha namorada, mas que poderia vir a ser caso eu conseguisse tirá-la das profundezas da terra, enfeitiçando baratas, gambás, ratos e musaranhos.” [7]

 

Domenico Starnone

Línguas apresenta reflexões sobre dois temas constantemente ligados na literatura e no nosso emocional: amor e morte. Desde da Grécia antiga, e até antes disso, a relação entre essas duas profundas experiências fascinou poetas, escritores e filósofos. Por isso, não é surpresa que Starnone os considere, mesmo ao falar do primeiro amor — aquela paixão emocional que nasce na infância dos personagens, vista pelos olhos de quando eram crianças. Mas o texto é mais rico ainda, como complemento há contrastes entre juventude e velhice, línguas faladas tão próximas umas das outras e ainda assim estranhas.  A riqueza do  texto encanta e seduz.

Esse é um livro que aflora a sensibilidade do leitor.  Não é repleto de fortes emoções ou de diálogos arrebatadores. Starnone é mais fino, dedica-se a tênues paralelos. As observações desse menino de nove anos são curiosas, engraçadas, trazem um leve humor para o texto, mas nem por isso deixam de ser perspicazes, deixam de elaborar complexos argumentos. Boa leitura.  Dessas que adicionam. Recomendo sem restrições. 

 





O escritor no museu: Stéphane Mallarmé

11 07 2025

Stéphane Mallarmé, 1876

Édouard Manet (França, 1832-1883)

óleo sobre tela, 27 x 36 cm 

Museu d’Orsay, Paris