Por sobre as ondas serenas,
a gaivota, em seu compasso,
é uma tesoura de penas,
cortando o pano do espaço.
(Onildo Campos)
Por sobre as ondas serenas,
a gaivota, em seu compasso,
é uma tesoura de penas,
cortando o pano do espaço.
(Onildo Campos)
Bijin lendo
Hirezaki Eiho (Japão, 1881-1968)
xilogravura policromada sobre papel
Hubert Aquin (1929-1977)
Três moças passeando com sombrinhas
Torii Kiyonaga ( Japão, 1752-1815)
Xilogravura policromada
da Série: Modos modernos na Brocado Leste
(Mundo flutuante)
“De fato, as três irmãs juntas constituíam um espetáculo único de beleza: eram parecidas, é verdade, mas de forma indefinida. Cada uma possuía uma característica que a transformava num tipo de beleza contrastante com as demais, mas, ao mesmo tempo, todas elas tinham pontos que lhes eram indiscutivelmente comuns. Para começar, a altura — que de Sachiko para Yukiko e desta para Taeko diminuía aos poucos de acordo com a idade — já consistia em interessante detalhe a chamar atenção dos que as viam passar juntas. Pelo tipo de vestuário e complementos que usavam, assim como pela aparência geral, Yukiko teria gosto genuinamente nipônico, e Taeko, gosto ocidentalizado. Já Sachiko seria considerada um meio-termo entre as duas irmãs. Taeko tinha nariz e olhos bem definidos num rosto arredondado e físico robusto com ele condizente, enquanto Yukiko, ao contrário, possuía rosto fino e corpo esguio. Quanto a Sachiko, constituía outra vez uma mistura das melhores características desses dois tipos físicos opostos. Taeko usava sempre roupas ocidentais, Yukiko, quimonos, enquanto Sachiko vestia roupas ocidentais no verão e quimono nas demais estações. No aspecto semelhanças, Sachiko e Taeko, ambas parecidas com o pai, tinham um tipo de beleza exuberante. Yukiko era a única diferente. Mas apesar de possuir uma beleza algo sombria, ficava bem apenas em quimonos de crepe de seda com estampas vistosas, do tipo usado pelas antigas cortesãs. Os listrados de tonalidade suave, tão ao gosto das mulheres de Toquio, não lhe eram indicados.”
Em: As irmãs Makioka, Jun’ichiro Tanizaki, tradução de: Leiko Gotoda, Kanami Hirai, Neide Hissae Nagae e Eliza Atsuko Tashiro, São Paulo, Estação Liberdade: 2005, p. 47

Nissaka-shuku, estação 25, das 58 estações da Estrada Tokaido, 1834
Ando Hiroshige (Japão, 1797-1858)
Xilogravura policromada
Ruth Ozeki
[da série Cinco Tons de Tinta na área norte (Hokkoku goshiki Zumi)]
Utamaro Kitagawa (Japão, 1754-1806)
xilogravura policromada, tinta e cor sobre papel
Metropolitan Museum of Art, Nova York
Em: A terra inteira e o céu infinito, Ruth Ozeki, Rio de Janeiro, Casa da Palavra:2014,tradução de Daniela P. B. Dias e Débora Landsberg, página 18.
Três mulheres japonesas, c. 1793
Kitagawa Utamaro (Japão, 1786-1864)
xilogravura policromada, 54 x 94 cm
2016 trouxe-me alguns livros pequeninos e impactantes. Belos e sucintos. Simples na aparência, complexos no que entregam. O fuzil de caça do escritor japonês Yasushi Inoue é um deles. Uma pequena obra prima, um diamante facetado pelas cinco vozes que o constroem.
Um poeta publica numa revista de caça, um poema-prosa, baseado na figura de um homem desconhecido que viu um dia numa paisagem de inverno com um fuzil nas costas. Ele dá ao poema-prosa o nome: O fuzil de caça. (Curiosamente o mesmo título da obra que temos em mãos.) O poema pouco tem a ver com a temática da revista em que apareceu. O tempo passa. Eis que o poeta recebe uma carta de um leitor se identificando como o personagem daquele poema. A carta e sucinta e direta não deixando muita informação sobre seu autor. No entanto, ele recomenda ao poeta que leia as cartas num pacote que mandará em futuro próximo. para que entenda o que pensava naquela manhã de inverno. Dias depois o poeta recebe um pacote com cartas de três mulheres diferentes que endereçadas ao caçador descrevem-no de acordo com cada uma de suas visões: a sobrinha,a amante e a esposa.
É um jogo de espelhos. Primeiro temos a visão do poeta sobre um homem desconhecido. Lemos o poema-prosa e nós mesmos construímos um personagem, vagamente baseado no poema. Depois alguém se reconhece naquele poema. E assim como o poeta, cujo nome não é revelado, fazemos novos conceitos sobre esse caçador através primeiro, de sua formalidade ao se comunicar depois nas vozes de três mulheres distintas, que a ele se dirigiam. O jogo epistolar é fascinante e Josuke Misugi, personagem principal, emerge multifacetado. Que isso seja compreendido em 102 paginas é fenomenal.
Yasushi Inoue
Esse foi o primeiro livro do autor que li. E agora Yasushi Inoue irá para a lista de autores que preciso ler. É autor de quase cinquenta obras e poucas estão traduzidas para o português, mas há muitas em inglês. Não só ele me seduziu pela complexa construção dessa obra, pela ambiguidade deixada entre o texto publicado na revista e aquele que lemos, pelas vozes individuais de cada uma das mulheres; como ele também me impressionou pela beleza da linguagem e pelas elipses necessárias para construir em três dimensões o enigmático caçador.
Recomendo com prazer essa pequena obra.