Cumbuca de terracota parcialmente cinzelada, vitrificada
número 3/150
[Christie’s]
Em 12 de maio de 2020 coloquei aqui neste blog uma pequena postagem sobre Picasso e a coruja de Antibes. Corujas foram um tema contínuo na obra do artista espanhol desde os anos 40 até o anos 60 do século passado. Ontem vi que mais uma coruja de Picasso entrava no mercado com venda em leilão, resolvi portanto postar algumas das corujas de Picasso que venho colecionando. Não, ainda não esgotei minha coleção de fotos desse tema na obra dele. Espero que gostem.
“… quando minha professora da escola tinha dado uma aula sobre Picasso e seu período azul. Os quadros que ela nos mostrara com a régua sobre um livro tinham me deixado sem fôlego, e eu decidira que o resto da minha vida seria azul.”
Em: Água fresca para as flores, Valérie Perrin, Rio de Janeiro, Intrínseca: 2022, p. 60
Oscar Wilde é autor da frase, “A imitação é a forma mais sincera de adulação que a mediocridade pode render à excelência” [“Imitation is the sincerest form of flattery that mediocrity can pay to greatness.”]. A cópia, e com ela a reinterpretação de uma obra de arte, é tradição nas escolas de belas artes, modo de se aprender técnica, uso de cores, composição, resolução do espaço observando os grandes mestres. Para pintores, por exemplo, há também a possibilidade de verem-se encaixados na tradição de um mestre. Desde os tempos nas guildas que aprende-se a pintar, a fazer a mistura de pigmentos, a usar diferentes pinceis ou técnicas. Ninguém poderia exercer a profissão de pintor se não tivesse passado alguns anos como aprendiz de algum mestre, reconhecido pela guilda.
Para nós apreciadores das artes plásticas é sempre interessante ver que obras de arte foram escolhidas por um artista para serem copiadas. Às vezes é surpreendente as conexões entre artistas de diferentes gerações.
Dora Maar com gato, 1941
Pablo Picasso (Espanha, 1881-1973)
óleo sobre tela, 128 x 95 cm
Roy Litchenstein, artista americano trabalhando na segunda metade do século passado, escolheu algumas obras de Pablo Picasso. Mulher com chapéude flores, 1963, é baseado no retrato Dora Maar com gato, 1941, por Pablo Picasso como vemos acima e abaixo:
Outra tela de Lichenstein baseada em Picasso é Reflexões no Interior com moça desenhando, 1990, que reconfigura a tela de Picasso de 1935, Interior com moça desenhando.
Reflexões no Interior com moça lendo, 1990
Roy Lichtenstein (EUA, 1923 -1997)
Magna* sobre tela, 191 x 274 cm
The Broad, Los Angeles
Interior com moça desenhando, 1935
Pablo Picasso (Espanha, 1881 – 1973)
óleo sobre tela, 130 x 195 cm
MOMA, Nova York
São as Reflexões, dele, Lichenstein sobre a tela de Picasso? Ou estaria ele assumindo que a moça desenhando está na verdade fazendo um autorretrato olhando para sua imagem num espelho, na tela de Picasso? A interpretação está aberta ao espectador.
Mais curioso ainda, é ver Mulher da Argel, 1963 momento em que Roy Lichenstein fez uma releitura da obra de Picasso, Mulher daArgel, 1954, obra (uma série de quinze telas) que já era releitura do quadro de Delacroix Mulheres da Argel em seu apartamento, 1834.
A revista da casa de leilões Sotheby’s de 21 de março de 2017 publicou artigo de Ben Gentilli sobre a corujinha que Pablo Picasso socorreu e que virou tema de muitas de suas telas além de dezenas e dezenas de trabalhos em cerâmica.
Coruja num interior, 1946
Pablo Picasso (Espanha, 1881 – 1973)
óleo sobre tela
A história é conhecida. Em 1946, enquanto Picasso trabalhava no Palácio Grimaldi, hoje Musée d’Antibes, ao sul da França, acompanhado por Françoise Gilot, a musa do momento, uma pequena coruja machucada na pata perdeu o equilíbrio e caiu do telhado do ateliê do pintor. Picasso e Gilot colocaram bandagem na pata machucada e a adotaram, levando-a até mesmo numa gaiola, para Paris.
Coruja num interior, 1947
Pablo Picasso (Espanha, 1881 – 1973)
óleo sobre tela
Logo o tema da coruja apareceu na obra do pintor. Como aconteceu muitas outras vezes, Picasso teve uma verdadeira fascinação com o pássaro. No final da década de 40, depois da adoção da coruja, há uma série de telas com o tema da coruja e uma cadeira.
Coruja numa cadeira, 1947
Pablo Picasso (Espanha, 1881 – 1973)
óleo sobre tela
Mas a coruja se torna tema principalmente na cerâmica do artista, onde toma forma de jarros, decora pratos, vasos, é assunto para escultura e aparece em todo tipo de trabalho tridimensional.
Coruja numa cadeira, 1947
Pablo Picasso (Espanha, 1881 – 1973)
óleo sobre tela
A sequência de quadros acima é bastante didática. Mostra como o mesmo pequeno tema, uma cadeira e uma coruja, pode ser explorado, por composição, cores, ângulos e também pela simplificação geométrica da essência de uma coruja.
Vemos nestas cinco corujas como Picasso brincou com as formas geométricas para achar em cada uma delas a estrutura do animal. Como tornar aparente para o espectador com o mínimo de informações aquilo que ainda seria reconhecível como a representação de uma coruja.
“Quando Picasso morreu, há 43 anos e aos 91 de idade, deixou um número surpreendente de obras — mais de 45.000 ao todo. (“Nós teríamos que ter que alugar o Empire State Building para acomodar todas as obras”, disse Claude Picasso quando o inventário terminou.) Havia 1.885 quadros, 1.228 esculturas, 7.089 desenhos, 30.000 gravuras, 150 cadernos de desenhos, 3.222 trabalhos em cerâmica. Havia um vasto número de livros ilustrados, gravuras, e tapeçarias.”
Ninguém pode dizer que Picasso não trabalhou. Frequentemente sou perguntada sobre quantos quadros um pintor pode pintar por dia. É muito pessoal. Picasso não só trabalhou incessantemente, como teve uma vida produtiva muito longa.