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A Arlesiana, 1888
[Retrato de Mme Ginoux]
Vincent Van Gogh (Holanda, 1853-1890 )
óleo sobre tela, 92 x 73 cm
Metropolitan Museum of Art, Nova York
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Nos últimos anos tivemos uma verdadeira onda de descobertas de novos quadros de Vincent Van Gogh. Em 2010, um quadro que se suspeitava falso, provou ser verdadeiro: uma pequena paisagem, de 1886, retratando o moinho Le Blute-fin em Paris. A história curiosa, ainda que comum, do colecionador apaixonado que acredita ter em mãos um verdadeiro Van Gogh, defendendo-a mesmo quando muitos estudiosos não acreditavam, deu a Dirk Hannema (1895-1984), dono da pintura e fundador de um pequeno museu na cidade de Zwolle, uma grande vitória sobre seus contemporâneos descrentes, quando o quadro foi considerado um verdadeiro Van Gogh sem qualquer suspeita de dúvida, pelo Museu Van Gogh de Amsterdam… Pena que tenha sido uma vitória posterior à morte de Hannema. Uma vitória póstuma!
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O moinho Le Blute-fin em Paris, 1886
Vincent Van Gogh (Holanda, 1853-1890 )
óleo sobre tela
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Quando, ainda em 2008, outro quadro de Van Gogh – dessa vez : o rosto de uma camponesa — foi descoberto adormecido sob outra pintura dele mesmo, uma tela com de um terreno com capim, foram poucas manchetes a respeito. Mas o incidente lembrou outro, de 2007, ano anterior, quando especialistas em Van Gogh descobriram também debaixo da tela A Ravina, 1889, outra tela retratando uma vegetação nativa. É fato conhecido que muitos pintores, e Van Gogh está incluído entre esses, re-utilizaram telas quando o trabalho inicial não se mostrou satisfatório para o próprio pintor. Preferindo não abandonar uma tela, que pode ser dispendiosa para tantos, o pintor simplesmente pinta por cima de um quadro ou inacabado ou que ele considera fraco.
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A ravina, 1889
Vincent Van Gogh (Holanda, 1853-1890 )
óleo sobre tela
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No caso de A Ravina houve motivo para grande alegria com a descoberta, já que a existência de um quadro retratando uma vegetação selvagem já havia sido preconizado por um desenho de vegetação selvagem, bem conhecido dos especialistas.
Hoje, os jornais estão cheios de notícias sobre a “novas telas” de Van Gogh. As novas telas são duas: uma, a Natureza morta com flores do campo e rosas cuja autoria estava em debate, e a outra, a tela de dois lutadores, sobre a qual Van Gogh pintou a natureza morta. Sabia-se da existência da tela com lutadores pois ela havia sido mencionada por Vincent em carta ao seu irmão Theo. Mas sabê-la sob a natureza morta, ajuda a autenticação desta.
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Natureza morta com flores do campo e rosas
Vincent Van Gogh (Holanda, 1853-1890 )
óleo sobre tela
Museu Kröller-Müller em Otterloo, Holanda.
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Realmente é excitante termos a clara autenticação de algum quadro cuja autoria possa estar em debate. Também é bom sabermos da localização de um quadro que o pintor menciona em suas cartas ao irmão. Mas tenho muitas dúvidas quanto à divulgação dessas imagens que estão sob as pinturas conhecidas. A pergunta que preciso levantar é sobre a ética de fazermos públicas imagens que o próprio pintor escolheu deletar de seu acervo. Não será o mesmo que ir na lata de lixo de um escritor examinar os trechos de um romance que ele desistiu de escrever? De que serve isso além de satisfazer o nosso voyeurismo, a nossa curiosidade?
Quando Vincent Van Gogh decidiu cobrir com uma natureza morta a tela dos lutadores, e não outra das dezenas de telas que ele tinha em seu quarto, é porque de todas aquelas essa era a que menos o satisfazia. Ele, assim como dezenas e dezenas de outros pintores escolheu “apagar” aquele trabalho. Que direito temos nós de revelarmos o que ele escolhera descartar?
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A Arlesiana com luvas e guarda-chuva, 1888
[Retrato de Mme Ginoux]
Vincent Van Gogh (Holanda, 1853-1890 )
óleo sobre tela, 92 x 73 cm
Museu d’Orsay, Paris
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Assim como respeitamos o direito a que ele se deu de manter à vista de todos os diversos retratos de Mme Ginoux, conhecidos com A Arlesiana, sem considerar tapá-los com uma nova pintura, apesar de serem, muito parecidos, variações sobre o mesmo tema, pergunto se não é um invasão de seus desejos fazer com que essas imagens — com as quais ele não estava satisfeito o suficiente para mantê-las “vivas” ao alcance do olhar alheio — sejam feitas públicas.
Acredito que os especialistas, os curadores dos museus e os donos dessas telas tenham o direito de saber o que está por trás. Mas fica aquele sentimento de que eles são mais ou menos como médicos que têm um paciente nas mãos e o dever de não divulgar dados publicamente das doenças que o aflige. É como se estivéssemos olhando Van Gogh se despir pelo buraco da fechadura. É voyeurismo. Há uma discrição que se faz necessária. Ou não? Após a morte vale tudo?





































