Primavera II, poesia de Augusto Frederico Schmidt

13 12 2023

Primavera no campo, 1967

Zé Inácio (Brasil, 1911-2007)

[José Inácio Alves de Oliveira]

óleo sobre tela, 33 x 41 cm

 

 

Primavera II

 

Augusto Frederico Schmidt

 

Dia para quem ama

Dia límpido e claro!

O azul do céu, o azul da terra, o azul do mar!

Dia para quem é feliz e sem tormento

Dia para quem ama e não sofre de amor!   

Dia para as  felicidades inocentes!

 

Em mim a mocidade acordou violentamente

Porque o sol expulsou as trevas e inundou-me!

Uma pulsação de vida enche meu ser doentio e incerto.

 

Veja as água correndo

Vejo a vida e o espaço

Vejo as matas e as grandes cidades líricas

Vejo os vergéis em flor!

É a primavera! É a primavera!

Desejo de tudo abandonar e sair cantando pelos caminhos!

 

 

Em: Eu te direi as grandes palavras, Augusto Frederico Schmidt, Editora Nova Fronteira, 2ª edição, Rio de Janeiro: 1977, p. 56

 





“Meus avós portugueses”, soneto de Augusto Frederico Schmidt

27 10 2022

Leitor, 1986

Gregório Gruber (Brasil, 1957)

aquarela e pastel, 70 x 100 cm

 

 

Meus avós portugueses

 

Augusto Frederico Schmidt

 

Meus avós portugueses no meu sangue

Estão falando há muito, e é assim somente

Que, por vezes, as vozes dos outros sangues

Não se fazem ouvir e não comandam.

 

Meus avó portugueses são teimosos

E procuram vencer-me transformando

Essas  minhas volúpias de erradio,

De vagamundo, em nobres sentimentos.

 

Querem-me esses avós, do Minho e Douro,

Um ser capaz de amar a terra à antiga,

E nesse amor construir toda uma vida;

 

Querem-me um crente em Deus e um fiel exemplo

De constância no amor: e, é certo, às vezes,

Isso acontece, mas somente às vezes.

 

Em: Eu te direi as grandes palavras – seleção poética, Augusto Frederico Schmidt, Rio de Janeiro, José Aguilar:1975, p. 76-77





Soneto à lua, Augusto Frederico Schmidt

20 03 2015

 

 

luar, moonlight-and-you, Gene Pressler (1893 – unknown)Ilustração de Gene Presler (EUA, 1893-?)

 

 

 

Soneto à lua

 

Augusto Frederico Schmidt

 

 

Vens chegando de longe, tão cansada,

Tão frágil e tão pálida vens vindo,

Que pareces, ó doce Lua amiga,

Vir impelida pelo vento leve.

 

Pelo vento gentil que está soprando

Tu pareces tangida, como um barco

Com as suas louras velas enfunadas,

E vens a navegar nos altos mares…

 

Atravessando campos e cidades,

Quantas artes e sortes não fizeste,

Ó triste Lua dos enamorados!

 

Quantas flores e virgens distraídas

Não seduziste para a estranha viagem

Por esse mar de amor, cheio de abismos!

 

 

Em: Eu te direi as grandes palavras – seleção poética, Augusto Frederico Schmidt, Rio de Janeiro, José Aguilar:1975, p. 76





As flores do jambeiro vão caindo, poesia de Augusto Frederico Schmidt

21 02 2015

 

Olímpia Couto,Composição c árvore vestse,1989, 90 x 70cmComposição com árvore, 1989

Olímpia Couto (Brasil, contemporânea)

vinil sobre tela colado em eucatex, 90 x 70 cm

www.olimpiacouto.com.br

 

 

As flores do jambeiro vão caindo

 

 

Augusto Frederico Schmidt

 

As flores do jambeiro vão caindo.

E aos poucos reina em sangue a madrugada.

Deste alto, o olhar domina ao longe

O mar tranquilo e azul.

E no mar, um veleiro vai fugindo

E o vento o afasta para longe,

para o reino que não sei.

 

Foge o veleiro e foge o tempo,

Para onde vão?

Não sei.

Vejo apenas as sombras

E as estrelas,

E mesmo a magra lua

Se esconderam;

E que no mar,

As asas claras de um veleiro

Fogem para um reino que não sei.

 

Em: Eu te direi as grandes palavras – seleção poética, Augusto Frederico Schmidt, Rio de Janeiro, José Aguilar:1975, p. 134