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Tibicuera, 1937
Ernst Zeuner, (1895-1967)
Ilustração: As aventuras de Tibicuera
Neste Dia do Índio, tão próximo do Dia de Tiradentes, nada melhor do que nos lembramos do mártir da independência através dos olhos de Tibicuera. Para quem não sabe quem é Tibicuera, posso adiantar que ele é um indiozinho, criação do grande escritor gaúcho, Érico Veríssimo. Tibicuera nasceu no século XV e presenciou a chegada dos portugueses. Como seu amigo Pajé lhe ensinou um segredo, Tibicuera viveu muito tempo, sendo capaz de acompanhar a história do Brasil de seu descobrimento até 1940. Assim, foi testemunha grande parte da nossa história.
Aqui está o que ele testemunhou da Inconfidência Mineira.
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A CONSPIRAÇÃO
Uma noite os conspiradores se reuniram na casa de Tiradentes. Tive o prazer de lhes fazer um bom café. Enquanto eles discutiam, fiquei junto da porta, indo de quando em quando passear pelo corredor e espiar pela fresta da janela, a ver se se aproximava algum vulto suspeito.
As pessoas que lá estavam eram Joaquim José da Silva Xavier, o meu querido chefe; Alvarenga Peixoto, o tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrada, José Álvares Maciel, o padre Carlos Correa de Toledo e Melo, o coronel Domingos de Abreu… e não me lembro mais de nenhum outro nome.
O plano era simples. Quando o governo fizesse a cobrança dos impostos – a “derrama” – explodiria o movimento. A senha era esta: Hoje faço o meu batizado.
O povo se revoltava, conseguia a adesão dos dragões, que seriam influenciados por Tiradentes e pelo seu comandante Paula Freire de Andrada. Prenderiam as autoridades portuguesas. Libertariam os escravos. Instalariam muitas fábricas importantes – todas as fábricas que um decreto recente de Portugal proibira de funcionar no Brasil. E a nova nação teria uma bandeira com este dístico: Libertas quæ sera tamen. Quando os incofidentes falaram nisto, não gostei. Eu não entendia. Fiquei sabendo depois que era uma frase latina do poeta Virgílio. Queria dizer: Liberdade, ainda que tarde.
O padre Toledo junto com Alvarenga Peixoto conseguiu convencer o desembargador Tomás Antônio Gonzaga e o dr. Cláudio Manuel da Costa a aderirem ao movimento. Gonzaga era poeta. Estava apaixonado por uma moça, Dorotéia. Fazia versos em que lhe dava o nome de Marília. Sempre impliquei com este costume que os poetas têm de não darem o nome verdadeiro às coisas. Mas eu gostava de Gonzaga, que era um homem melancólico de ar sonhador. Muita vez levei recados seus à noiva. Foi um romance bonito mas que não teve aquele final dos romances antigos: Casaram-se e foram muito felizes.
A idéia marchava. Tiradentes resolveu ir até o Rio a serviço da revolução. Acompanhei-o montado num burro emprestado. Foi uma viagem dura. Chegamos à capital do Brasil e uma tarde percebi que estávamos sendo seguidos. Disse de minhas desconfianças a Tiradentes. Ele sorriu e troçou:
— Tibicuera está vendo fantasmas…
Mas eu sentia a nosso redor a sombra de espiões. Passei a andar inquieto e de olho alerta.
Tiradentes parava na casa de um amigo na rua dos Latoeiros, que hoje se chama Gonçalves Dias. Um dia ouvimos barulho de passos na rua. Devia ser uma patrulha, a julgar pela cadência das batidas no calçamento. O dono da casa foi à janela e empalideceu. Voltou-se para o hóspede e não teve voz para lhe dizer que a casa estava cercada. Tiradentes compreendeu tudo num relance. Gritou:
— Foge, Tibicuera!
E precipitou-se para a porta dos fundos. Era tarde. Prenderam-no cinco soldados. Mais dois caminhavam para mim. Dei um salto de tigre e desandei a correr pelo corredor… Derrubei o primeiro homem que encontrei pela frente. Escalei-o com a agilidade de um … de um homem perseguido. Poucos segundos depois eu entrava na varanda de uma casa desconhecida onde duas mulheres se puseram a gritar. Ganhei o pátio dessa casa, saltei por cima de novo muro e me vi noutra rua. Comecei a andar com naturalidade. Caminhei durante meia hora. Estava fora de perigo. Mas um pensamento tomara conta de mim: Era preciso avisar os inconfidentes de Vila Rica. Com as economias que tinha comprei um burro e me pus a caminho. Quando, dias depois, cheguei a Vila Rica foi para saber que todos os inconfidentes estavam presos.
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Ernst Zeuner (1895 — 1967) foi um pintor, desenhista e ilustrador alemão, radicado no Brasil. Zeuner estudou na Academia de Artes Gráficas de Leipzig e veio para o Brasil em 1922, mais especificamente, para Porto Alegre, onde realizou um trabalho de orientação e formação de muitos artistas gráficos gaúchos. Notabilizou-se pela contribuição dada à Revista do Globo, onde atuou como ilustrador.
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