A pesca do Salmão no Dee
Joseph Farquharson (Escócia 1846-1935)
óleo sobre tela
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Quem anda à procura de um romance leve, muito diferente e com um bom senso de humor não deve deixar de ler A Pesca do Salmão no Iêmen do escritor inglês Paul Torday [Record:2008]. O mínimo que posso dizer é que este romance é muito original. A começar pela forma com que a história é contada. Lembra, em muitos aspectos, os romances epistolares, pois é feito de cartas, e-mails, páginas de diário, relatórios da Câmara dos Deputados na Inglaterra (House of Commons), programas de entrevistas, até emails relacionados a Al Qaeda fazem parte dessa “pilha” de documentação que conta a história. Cada capítulo traz à tona uma nova faceta do desenvolvimento de um projeto ambicioso, imaginado por um xeique iemenita, de trazer a cultura do salmão para o seu país a fim de propiciar aos seus habitantes o esporte a que ele se dedicava em sua propriedade na Escócia: a pesca do salmão. A engenharia social que atrai o abastado xeique seria proporcionar ao Iêmen uma das únicas atividades em que todos, de quaisquer classes sociais, poderiam participar de igual para igual, lado a lado à beira do rio.
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Este é um livro construído como uma sátira aos governos, a toda a burocracia governamental, que aqui aparece retratada na Inglaterra, mas que com pequenos ajustes é universalmente insana. O projeto de se fazer a pesca do salmão – um peixe de água doce muito fria– no Iêmen, um país no deserto é considerado desde o primeiro capítulo como uma loucura, um projeto sem pé nem cabeça. Mas, por razões diversas e principalmente para favorecer ao primeiro-ministro, este projeto começa a crescer e toma vida própria. Não só cresce como se torna um projeto imprescindível para o governo inglês. E ganha mais combustível ainda depois que Alfred Jones, nosso herói, um cientista do Departamento de Pesca do governo, contrário ao projeto, vê-se frente a frente e seduzido pela filosofia do xeique em questão. O resultado é imprevisível.
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Nesse meio tempo, entre “provas” escritas – emails, diários, cartas, entrevistas – temos uma das mais divertidas narrativas que ironizam e satirizam a vida contemporânea, os casamentos de conveniência, o discurso político. O que nos resta, por incrível que pareça, é uma mensagem sóbria, gratificante: a esperança é imprescindível para nos dar direção a nossas vidas. A gente vive, sonha e faz planos, os mais diversos. Mas mesmo que o que planejamos não venha a se concretizar, aquela esperança que nos ajudou a tentar construí-lo já é o suficiente para dar sentido à nossa vida. Por trás disso há uma diferença importante entre dois conceitos e quem nos ensina é o xeique: há religião e espiritualidade. Ás vezes elas se misturam, às vezes não. Mas a espiritualidade, quando somos íntimos dela, pode ser encontrada nos recantos mais exóticos, onde jamais esperaríamos encontrá-la. E é ela quem nos salva.
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Recomendo a leitura de A pesca do salmão no Iêmen. Principalmente se você anda desiludido com os seus políticos, com a falência dos seus sonhos. Há muito material aqui, para dar uma outra vida ao cotidiano, para ver um problema por um outro ângulo. Achei que esse romance perde um pouco o ritmo no meio das suas 360 páginas. Mas devo alertar o meu leitor que esta pode ser uma observação só minha. Ultimamente tenho tido a impressão que na maioria dos romances que leio p texto poderia ter sido cortado, editado, para melhoria do ritmo da narrativa. Talvez seja um problema meu e não do autor neste caso. Fica de qualquer maneira, aqui, a minha forte recomendação a esta divertida leitura.



O edifício do Senado Brasileiro, ná época do Segundo Império.




