5 de dezembro, dia de Krampus. Quem é aquela figura estranha ao lado de Papai Noel?

5 12 2011

Krampus moderno, art digital.

Se você ainda não ouviu falar no Krampus, não se preocupe, poucas pessoas o conhecem.  Mas quem o conhece, não esquece.  O Krampus [grafia alemã] é um ser mítico, fantástico  — definitivamente um ser do Mal —  muito conhecido das populações das aldeias e  cidadezinhas dos Alpes.  Ele também habita a imaginação européia através do folclore na Áustria, Alemanha, Alsácia,  Suíça, Eslovênia, e demais áreas  das montanhas alpinas.  Faz parte da cultura local desde tempos imemoriais.  Apesar de muito antigo e limitado geograficamente aos Alpes, sua influência afeta alguns costumes natalinos de outras terras, até hoje.

De acordo com as lendas, Krampus começa as festividades do Natal na noite do dia 5 de dezembro.  Ele é um companheiro de São Nicolau, ou como dizemos por aqui, de Papai Noel.  Ele é o contraponto ao Papai Noel, e ao invés de dar presentes às criancinhas das aldeias, Krampus invade as casas das pessoas e retira delas as crianças que foram más, que mentiram, que fizeram pirraça…  E ele as leva.  Nada de presentes para crianças más…

Cartão de Natal com as representações de Krampus e São Nicolau, século XX, década de 20-30.

Krampus não é nada mais nada menos do que a inserção nas festividades natalinas de um demônio bastante conhecido nessas regiões e já temido por todos, que foi incorporado pelo cristianismo.  Ele aparece lado a lado com o mais bondoso dos santos, aquele que distribui presentes às crianças.  Assim, ajuda a equilibrar as forças do bem e do mal, servindo como um freio social, como um lembrete de que  as  crianças precisam ser boazinhas e comportadas para ganharem presentes de Natal: presentes não vêm automaticamente .  Foi uma maneira inteligente de manter em cheque as crenças pagãs que teimavam em ressucitar.   Já no século IV da nossa era, o Papa Gregório, havia aconselhado Santo Agostinho a permitir que esse personagem pagão fosse incorporado às festividades desde que fosse rebatizado.  Krampus é o novo nome dessa entidade: Percht ou Perchta.  Bartl,  Ruprecht, Knecht Ruprecht, são alguns dos muitos outros nomes de Krampus.

Krampus e São Nicolau.

Perchta era uma deusa pagã da região alpina, que aparece em duas formas: ou sedutora belíssima, branca como a neve, ou como um demônio em trapos.  A ela cabia a vigilância dos animais no início do inverno e a visita às casas para se certificar de que a fiação da lã estava sendo feita corretamente.  Seu dia festivo era o dia 6 de janeiro e sua festa foi incorporad às festas da Epifania no calendário cristão.

São Nicolau acompanhado por Krampus, cartão postal 1901.

Até hoje, tradicionalmente, jovens rapazes das regiões Alpinas se vestem como Krampus – principalmente na cidade que é centro de comércio na Bavária, chamada Berchtesgaden, e desfilam acompanhando São Nicolau, durante as primeiras duas semanas de dezembro.

Procissão de São Nicolau acompanhado de seus ajudantes Krampus.  Região alpina da Alemanha.

Até 1969, quando a Igreja Católica Apostólica Romana retirou do seu calendário oficial a Festa de São Nicolau, celebrada no dia 6 de dezembro, grande ênfase dessa procissão e das travessuras feitas pelos rapazes vestidos de Krampus, era dada à noite do dia 5 de dezembro, véspera do dia da festa em que trocava-se presentes na região.

São Nicolau chega à cidade acompanhado de Krampus, cartão de Natal da Bavária.

Os rapazes reproduziam o que todos sabiam que Krampus fazia:  andavam sem objetivo nas ruas, alarmando as crianças, colocando medo naquelas que haviam se comportado mal e arrastavam pesadas correntes de ferro aumentando a algazarra.  A imagem de Krampus é aquele ser com uma longa língua vermelha, coberto de pelos, carrega correntes e tem na mão um freixo de galhos de madeira com o qual ameaça as crianças que se comportam mal ou que não sabem suas lições.

Krampus levando as crianças embora.

Na Áustria, Krampus pode mais comumente  ter chifres e cascos de cabra no lugar dos pés.  Sua aparência é a de um diabo, como é representado mais comumente.   Foi só no final do século XIX, por volta de 1890 que sua imagem começou a aparecer nos cartões de Natal acompanhando São Nicolau.   Aparecia frequentemente com os dizeres “Gruss vom Krampus” [Saudações de Krampus] ou com a frase “Brav Sein!” [Comporte-se!].

Menino ameaçado por Krampus.

No final do século XIX a popularidade de Krampus era grande e passou a fazer suas aparições também ao norte da Alemanha.

Krampus com as crianças.

Krampus estava sempre pronto a punir as crianças que não se comportavam.  E evidentemente colocava-as em fila e as levava para algum lugar.  Ainda não consegui descobrir para onde iam.

Visitas: São Nicolau e Krampus.  As crianças parecem apavoradas!

Saudações de Nicolau!

Krampus, São Nicolau, crianças e gatinho.

As visitas que Krampus fazia às casas das pessoas para verificar quem era bom e quem não era, não só fizeram algum sucesso nas artes gráficas como também, devidamente digeridas, sanitarizadas e embelezadas vieram a fazer parte do panorama cultural dos Estados Unidos, terra que acolheu imigrantes de todo o mundo cada qual com suas tradições e hábitos culturais.  O resultado são referências a tradições de outros lugares do mundo, no dia a dia americano.  No caso da celebração do Natal há uma evidente correspondência entre outros aspectos ao da letra de uma das músicas mais conhecidas de Natal, nos EUA: Santa Claus is coming to town. [Papai Noel está chegando].  Vejamos se não é uma referência a dupla alpina que ocupa as nossas atenções hoje?

You better watch out                                                  
You better not cry   
Better not pout 
I’m telling you why
Santa Claus is coming to town 
He’s making a list 
And checking it twice;   
Gonna find out Who’s naughty and nice 
Santa Claus is coming to town     
He sees you when you’re sleeping  
He knows when you’re awake 
He knows if you’ve been bad or good  
So be good for goodness sake! 
O! You better watch out!
You better not cry
Better not pout   
I’m telling you why
Santa Claus is coming to town 
Santa Claus is coming to town
——

É melhor tomar cuidado
É melhor você não chorar
Melhor não emburrar
Estou dizendo porque
Papai Noel está vindo para cá
Ele está fazendo uma lista
E verificando-a duas vezes;
Vou descobrir quem é levado e quem não é
Papai Noel está vindo para a cidade
Ele vê quando você está dormindo
Ele sabe quando  está acordado
Ele sabe se você foi mau ou bom
Então, seja bom pelo amor de Deus!
O! É melhor tomar cuidado!
É melhor você não chorar
Melhor não emburrar
Estou dizendo porque
Papai Noel está vindo para a cidade
Papai Noel está vindo para a cidade .

Não tenho mais informações sobre Krampus além de saber que  depois de quase desaparecer, voltou a ser invocado e a fazer suas trapalhadas na mesma região em que nasceu.  Krampus é hoje em dia um dos personagens que gera festas, eventos, e todo tipo de manifestação cultural na Áustria, na Bavária, na região alpina.

A seguir outras imagens de Krampus encontradas em cartões ou em postais de Natal.

São Nicolau e Krampus.

Menina implorando a Krampus.

Krampus entra em casa um pouquinho à frente de São Nicola…

Menina com boneco de Krampus na mão.

Papai Noel com boneco Krampus nas mãos.

Obra digital século XXI, Krampus no jardim, São Nicolau na casa.




Brinquedos, poesia infantil de Afonso Schmidt

7 12 2010

 

Joyeux Noel, cartão de Natal francês da virada do século XX.

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Brinquedos

                                 Afonso Schmidt

São Nicolau de barbas brancas,

de alto capuz beneditino,

nas costas levava um grande saco

e vai seguindo o seu destino.

—-

É muito tarde.  Nas janelas,

há sapatinhos ao sereno:

a cada espera corresponde

o sonho leve de um pequeno.

Súbito, estaca na calçada;

uma janela está vazia

e, pelas frinchas de uma porta,

chegam rumores de alegria.

O Santo pára; está amuado,

acha que o mundo é muito mau

e estas crianças já não querem

esperar por São Nicolau.

Mas, logo fica curioso,

quer descobrir porque naquela

casa não há um sapatinho

no canto escuro da janela.

Vai espiar pelo buraco

da fechadura…  – Pobrezinhos,

são os meninos do trapeiro,

nunca tiveram sapatinhos…

E vê, que à falta de bonecas,

eles divertem o casal,

enquanto o avô fuma num canto,

São Nicolau, mas de avental…

Todos estão muito contentes

o Santo ri de olhos molhados

e vai seguindo à luz branquinha

do plenilúnio nos telhados.

 Pisa de leve sobre as folhas,

diz a sorrir palavras mansas:

“Essas crianças são os brinquedos

 e esses papais são as crianças…”

Em: Poesia brasileira para a infância, Cassiano Nunes e Mário da Silva Brito, São Paulo, Saraiva: 1968.

VOCABULÁRIO

Beneditino – é o nome que se dá aos frades da Ordem de São Bento.  Na poesia a palavra é usada como adjetivo de capuz.

Plenilúnio — a lua cheia.

 

Afonso Schmidt (Cubatão, SP 1890 – SP, SP 1964) poeta, romancista, contista, biógrafo, jornalista.  Como jornalista trabalhou para  A Voz do Povo, em 1920, no Rio de Janeiro.  Para Folha da Noite,  Diário de Santos e A Tribuna, em Santos. Em São Paulo trabalhou na Folha da Noite e O Estado de S.Paulo.  Neste último trabalhou de 1924 até 1963.  Recebeu o prêmio da  revista O Cruzeiro em 1950 pelo romance Menino Felipe.   A União Brasileira de Escritores lhe premiou com o Juca Pato – Intelectual do Ano em 1963.  Foi sócio fundador do Sindicato dos Jornalistas do Estado de S. Paulo, membro da Academia Paulista de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo.

Obras: 

Lírios roxos, 1904

Miniaturas, 1905

Janelas Abertas (poesia), 1911

Lusitânia (ato em verso), 1916

Evangelho dos Livres (panfleto), 1920

Mocidade, 1921

Brutalidade (contos), 1922

Ao relento, 1922

Janelas Abertas (versos) – Edição Aumentada (Menção Honrosa da Academia Brasileira de Letras, 1923

Os Impunes (novelas), 1923

As Levianas (peça em três atos), 1925

O Dragão e as Virgens (romance, 1927

Cânticos Revolucionários (panfletos), 1930

A nova conflagração, 1931

Garoa, 1931

Os Negros (crônicas), 1932

Garoa (poesia), 1932

Poesias, 1934

Carne para Canhão (peça em três atos), 1934

Pirapora (contos), 1934

Curiango (contos), 1935

Zanzalás (uma novela de tempos futuros), 1936

A Vida de Paulo Eiró (biografia), 1940

A Marcha (Romance da Abolição), 1941

O Tesouro de Cananéia (contos), 1941

No Reino do Céu (novela), 1942

A Sombra de Júlio Frank (biografia),1942

A árvore das lágrimas, 1942

Colônia Cecília (Uma aventura anarquista na América), 1942

O Assalto (Romance do ouro e do sal), 1945

Poesias (edição definitiva), 1945.

O Retrato de Valentina (novela), 1947

A Primeira Viagem (viagem), 1947

Menino Felipe (romance), 1950

Saltimbancos (romance), 1950

Aventuras de Indalécio (romance), 1951

Os Boêmios (contos), 1952

Dedo nos Lábios (novelas), 1953

O Gigante Invisível (divulgação), 1953

Carantonhas (novela juvenil), s/d

São Paulo dos Meus Amores (crônicas), 1954

A Marcha (romance da Abolição,  história em quadrinhos), 1955

Mistérios de São Paulo (reminiscência), 1955

Bom Tempo (memórias), 1956

A Datilógrafa (romance), 1958

A Locomotiva (romance), 1960

Mirita e o Ladrão (romance), 1960

O Retrato de Valentina (novela), 1961

O Canudo, 1963

O enigma de João Ramalho, 1963

O passarinho verde, s/d

Zamir, s/d