Saladino…

12 08 2022
Representação do século 13 mostra o encontro entre Ricardo I e Saladino

 

“Saladino, príncipe do exército dos pagãos, enviou muitas vezes aos reis da França e da Inglaterra peras de Damasco e uma grande abundância de todos os frutos que tinha, com outros pequenos presentes, para levá-los a fazer a paz com ele. De fato, fez a eles frequentes propostas de paz e de entendimento, por causa do temor que lhe inspiravam os filhos de Nuredin: reclamavam todas as terras do pai, ocupadas por Saladino. Apoiados pelo senhor de Mosul, seu tio, entraram nas terras de Saladino com  um grande exército, e ocuparam todas elas, até o Eufrates. Saladino também queria libertar seu povo sitiado na cidadela, mas não queria dar satisfação aos reis. Queria, de fato, conservar em seu poder Jerusalém e o krak*  de Montreal na Palestiina.  Os reis recusaram o entendimento com ele.”

 

*Conjunto fortificado construído pelas Cruzadas na Palestina e na Síria (do árabe, Karak). N.T.

 

Em: Ricardo Coração de Leão: história e lenda, de Michèle Brossard-Dandré e Gisèle Besson, tradução de Monica Stahel, São Paulo, Martins Fontes: 1993,p 123.





Ricardo Coração de Leão na Áustria

22 06 2022

Ricardo Coração de Leão

Iluminura, MS Royal 14 C VII f.9

Data do manuscrito !250-1259

Biblioteca Britânica

 

 

 

“…Mas, depois de sua partida, o senhor de Zara enviou um emissário secretamente a seu irmão avisando-lhe que detivesse o rei quando ele chegasse às suas terras. Quando o rei chegou e entrou na cidade onde morava o irmão daquele senhor, este imediatamente convocou um homem em quem tinha toda confiança, Rogério, um normando de Argenton, que estava junto dele havia vinte anos e a quem dera sua sobrinha em casamento; ordenou-lhe que inspecionasse atentamente todas as casas onde houvesse visitantes alojados, e que tentasse identificar o rei por sua maneira de falar ou por qualquer outro detalhe. Prometeu dar-lhe a metade da cidade se conseguisse capturar o rei.

O homem localizou e examinou todas as casas onde havia viajantes; Ricardo ocultou por bastante tempo  sua identidade, depois, vencido pelas súplicas e pelas lágrimas do leal investigador, confessou sua identidade. Imediatamente o outro exortou-o , chorando, a fugir às escondidas, e ofereceu-lhe um cavalo excelente. Pouco depois, voltando para junto de seu senhor, disse que aquilo que se contava  a respeito da chegada do rei não tinha fundamento, mas que se tratava de Balduíno de Béthune e de seus companheiros, voltando da peregrinação. O senhor, furioso, mandou prender todos eles.

O rei deixou a cidade às escondidas com Guilherme de Etang e um jovem servidor que falava o alemão; viajou três dias e três noites sem se alimentar. Depois, compungido pela fome, foi até uma cidade chamada Viena, na Áustria, às margens do Danúbio, onde, por cúmulo de infelicidade, naquele momento  encontrava-se o duque da Áustria. O jovem servidor do rei foi trocar dinheiro; tirou muitos besantes , mostrando-se arrogante e pretensioso. Então os habitantes da cidade apoderaram-se dele imediatamente e lhe perguntaram quem era; respondeu que estava a serviço de um mercador muito rico que chegaria à cidade três dias depois. Foi libertado e voltou discretamente para junto do rei, em seu refúgio, exortando-o a fugir o mais depressa possível e contando-lhe o que acontecera. Mas o rei, ainda sob o efeito da fatiga causada por sua dura navegação, desejava descansar alguns dias naquela cidade. O servidor ia com frequência ao mercado para comprar o necessário, e certa vez, no dia de São Tomé Apóstolo, enfiara inadvertidamente sob seu cinto as luvas do patrão.Vendo-as, os magistrados da cidade voltaram a deter o servidor, maltrataram-no rudemente, infligiram-lhe muitas torturas, feriram-no e ameaçaram arrancar-lhe a língua se não se apressasse em dizer a verdade. O servidor, vencido por um sofrimento insuportável, contou-lhes tudo. E eles informaram o duque imediatamente, cercaram o alojamento do rei e instaram-no a entregar-se voluntariamente.

O rei permaneceu marmóreo em meio ao alarde de todas aquelas pessoas que palravam; deu-se conta de que sua bravura não poderia defendê-lo contra tantos bárbaros, e exigiu a presença do duque, garantindo que só se entregaria a ele. O duque chegou imediatamente e o rei deu alguns passos em sua direção, depois colocou sua espada e sua pessoa  em suas mãos.  O duque,muito satisfeito, levou o rei com ele, com grandes honras. Depois entregou-o à guarda de bravos cavaleiros que, noite e dia, vigiaram-no estreitamente em todos os lugares, de espada na mão.” *

 

* Narrativa baseada em diversos relatos da época de Ricardo I, de Inglaterra, conhecido como Ricardo Coração de Leão. 

 

Em: Ricardo Coração de Leão; história e lenda, Michele Brossard-Dandré e Gisèle Besson, tradução de Monica Stahel, São Paulo, Martins Fontes: 1993, pp: 224-6