Despedida, poesia de Maria Braga Horta

11 01 2021

À luz de lampião, 1890

Harriet Backler (Noruega 1845-1932)

óleo sobre tela, 55 x 66 cm

 

Despedida

 

Maria Braga Horta

 

Não levarei comigo nada meu

nem de ninguém.

Devolvo a todos o quinhão da vida

que viveram comigo e por mim

e os liberto

do ritual das flores no jazigo

que nada mais (depois) contém

que os vestígios de um corpo

que em verdade jamais me pertenceu.

 

 

Simples sombra (invisível) chegarei

diante do espelho

em que foi o meu tempo refletido

e inserido em gradações de forma e cores.

 

 

Do que era teu em mim –

separados os lados –

sepultarás o morto.

 

 

O vivo ficará perdido

nos teus olhos

procurando o infinito.

 

Em: Caminho de Estrelas, Maria Braga Horta, São Paulo,  Massao Ohno Editor: 1996, p. 122





O tempo passa, soneto de Maria Braga Horta

31 10 2020
Ilustração, Clara M. Burd
         V

 

Maria Braga Horta

 

O tempo passa.  E passam sol e lua

tantas vezes no céu, que perco a conta

do tempo que, passando, se insinua

na vida que a velhice hoje defronta.

 

O tempo passa, a história continua.

É uma história de amor que se reconta.

Uma história de amor que perpetua

a vida: ora uma acaba, outra desponta.

 

Venho outra vez com bruxas e dragões

e princesas e príncipes e anões

para o mundo irreal dos dois netinhos.

 

Vejo em seus olhos sempre o mesmo brilho

que pairava no olhar de cada filho

…e ainda vão passando os carneirinhos…

 

Brasília, 28-2-1968

 

 

Em: Caminho de Estrelas, Maria Braga Horta, São Paulo,  Massao Ohno Editor: 1996, p. 239