Resenha: Orbital, Samantha Harvey

8 09 2025

Terra vista da Lua

Veronika Zubareva (Rússia, contemporânea)

óleo sobre tela, 50 x 60 cm

 

 

Há muito tempo um livro não me encanta tanto quanto Orbital de Samantha Harvey, tradução de Adriano Sacandolara [Editora DBA, 2025]. A obra, vencedora do Booker Prize em 2024, é uma cuidadosa ponderação sobre a vida, a Terra, nosso lugar no Universo. Ainda que acompanhemos seis astronautas que orbitam a terra, não há diálogos, não há trama.  Em seu lugar, somos convidados a compartilhar com a autora a visão, o encantamento e o privilégio de, com ela, viajarmos em volta do nosso planeta e nesse trânsito refletir sobre a grandeza do espaço, a pequenez do planeta azul, a fragilidade de nossa existência. 

Não se trata de prosa poética.  Mas o livro é repleto de poesia e do encantamento que poesia provoca.  Com grande sensibilidade atravessamos as dezesseis órbitas que fazem um dia no espaço e que, por sua  vez, designam os dezesseis capítulos do livro. A cada um deles voltamos ao nascer do dia numa parte do planeta, diferente da anterior, ou ao acender das luzes quando a noite chega em algum continente.  Essa forma circular, de voltar e voltar a um ponto semelhante ao do início é usada desde a antiguidade para a meditação.  O círculo sempre esteve ligado à ponderação e introspecção. Os conhecidos labirintos meditativos, desenhados no chão, como o da Catedral de Chartres na França, assim eram para levar o pensamento do andarilho de volta  através de uma espiral circular a um ponto semelhante ao anterior.  É isso que acontece com o leitor em Orbital.  Junto à equipe de astronautas voltamos sempre mais ou menos ao mesmo ponto, mas um pouco diferente.  As ruminações são inescapáveis. 

 

 

 

 

Os continentes passam como as campinas e vilarejos na janela de um trem. Dias e noites, estações e estrelas, democracias e ditaduras. É só à noite, quando você vai dormir, que você se alivia dessa esteira perpétua. E mesmo ao dormir você sente a Terra girar, assim como sente uma pessoa deitada ao seu lado. Você a sente ali. Sente todos os dias que penetram sua noite de sete horas. Sente todas as estrelas efervescentes e os humores dos oceanos e o tropeço da luz contra a pele, e se a Terra parasse por um segundo na sua órbita, você acordaria de sobressalto, ciente de que há algo errado.

Difícil imaginar as incontáveis horas de pesquisa que Samantha Harvey deve ter dedicado a visões da Terra da perspectiva de quem a vê do espaço, nem muito longe, nem muito perto. Suas descrições, suas observações precisas e poéticas são imperdíveis e trazem a sensação de verdadeira experiência. E nos deixam extasiados. Outras tantas horas devem ter sido dedicadas ao estudo da rotina dos astronautas antes e durante os voos, assim como os tipos de pesquisas que são executadas em voo.

Samantha Harvey

Esse livro é uma homenagem à Terra mas é também uma austera e enigmática reflexão sobre nosso papel nesse planeta, nesse Universo.  Ponderação sobre nossa inimaginável necessidade de ir além, de conquistar.  A prosa é belíssima e delicada.  Para os apreciadores da pintura há uma longa reflexão sobre Velazquez e menções sobre Turner.  Mas sobretudo essa ruminação poética sobre o ser humano e seu lugar no universo é profunda, toca a alma e faz pensar.

Com Anton, Roman, Nell, Chie, Shaun e Pietro, os astronautas de diversas nações aprendemos, como Harvey nos diz que:

“A humanidade não é esta ou aquela nação, é tudo junto, sempre juntos, venha o que vier.”

Leia.  Recomendo. 

 





Reflexões de astronauta, texto de Samantha Harvey

6 08 2025

 

 

“Eles navegam em sua distância intermediária de órbita terrestre baixa, sua visão a meio mastro. Pensam: talvez seja difícil ser humano, e talvez seja esse o problema. Talvez seja difícil fazer a transição entre pensar que seu planeta está seguro no centro de tudo e saber que ele é, na verdade, um planeta de tamanho e massa mais ou menos normais, girando ao redor de uma estrela mediana num sistema solar em que tudo é mediano numa galáxia de tantos outros, incontáveis, e a coisa toda vai explodir ou colapsar.”

 

Em: Orbital, Samantha Harvey, Editora DBA: 2025





A longa lista do Prêmio Booker foi anunciada…

1 08 2024

 

 

Quem acompanha este blog por algum tempo, nestes dezesseis anos de postagens diárias, sabe que tenho gosto pelos premiados pelo Booker (prêmio de literatura).  Em geral tenho mais afinidade com os premiados pelo Booker do que pelos premiados pelo Pulitzer ou pelo National Book Critics Award, ambos americanos, ou do que o Nobel de literatura.  Nem todos os livros do Goncourt, (França) nem do Jabuti (Brasil) me agradam.  Não sei explicar exatamente as razões.  Talvez seja uma questão dos livros que li na minha formação… Mas não importa, sempre aguardo com ansiedade a longa lista dos finalistas do Booker, que saiu hoje, para o prêmio de 2024.  São treze, ao todo.  A baker’s dozen.  [Uma dúzia de padeiro]  Desses treze, a lista se reduzirá em seis e desses então teremos o vencedor do ano.  Tento ler o maior número possível deles todos, tarefa que se tornou mais fácil depois que pudemos comprar esses livros em suas versões eletrônicas e ler… ler… ler…   Aqui vai a lista que saiu hoje.  Há alguns nomes bastante conhecidos.  Rachel Kushner parece estar já há uns dois ou três anos nos lábios de qualquer pessoa interessada nos livros lidos do momento.  Apesar de interessante, ela não faz parte do meu grupo de grandes favoritos.

 

 

    Wild Houses by Colin Barrett 

    Headshot by Rita Bullwinkel

    James by Percival Everett

    Orbital by Samantha Harvey 

    Creation Lake by Rachel Kushner 

    My Friends by Hisham Matar

    This Strange Eventful History by Claire Messud

    Held by Anne Michaels

    Wandering Stars by Tommy Orange

    Enlightenment by Sarah Perry

    Playground by Richard Powers

    The Safekeep by Yael van der Wouden

    Stone Yard Devotional by Charlotte Wood

 

Há muito poucos desses escritores que conheço de outros livros.  Nenhum desses títulos já se encontra publicado no Brasil.  Mas conheço Rachel Kushner, Percival Everett, e Anne Michaels e conheço de nome, sem nunca ter lido, Hisham Matar, Claire Messud. 

 

E vocês?  Gostam do Booker?  Preferem os escritores no Nobel?  Do Goncourt?  Do Jabuti?    Conhecem alguns desses escritores selecionados entre os melhores para serem finalistas do prêmio deste ano?