Primeira Missa no Brasil, 1861
Victor Meirelles (Brasil 1832- 1903)
Óleo sobre tela, 268 x 358 cm
Museu Nacional de Belas Artes
Rio de Janeiro
Estampa da Primeira Missa
Murilo Araújo
Na terra amanhecida,
entre as ondas a rir jubilosas de luz
e as árvores em flor, se ergue a árvore da Vida –
a Cruz.
Entre os tupis a marujada ajoelha.
Uma legião de beija-flores passarinha.
Então “no ilhéu chamado a Coroa Vermelha”
Frei Henrique de Coimbra se aparelha
e em paramentos de ouro beija o altar…
A alma argentina de uma campainha
se une aos gorjeios da manhã solar.
Junto aos altos pendões do palmar nunca visto
treme um pendão mais alto, o estandarte de Cristo.
Longe um som de clarim morre em glória no ar.
As resinas do mato, onde em onde,
erguem incenso
turibulando pelos troncos bons.
Frei Henrique celebra e é Deus quem lhe responde
na voz do oceano, seu harmônio imenso,
rolando ao longe um turbilhão de sons.
As campânulas trêmulas nos galhos
tlintam à brisa
sua matina aos pingos dos orvalhos;
e a várzea que se irisa
oferenda ao Senhor
nas passifloras roxas os martírios
e na água em sono as ânforas dos lírios…
Há um repousório em cada moita em flor.
São candelabros de ouro os ipês flamejantes!
E ascenderam ao sol corolas delirantes
como se fossem círios
em louvor.
Quando a hóstia se eleva angelical
sobe com ela o sol no firmamento.
As borboletas – que deslumbramento! –
com os tucanos e arás de tom violento
pintam no azul policromias vitral…
Canta a araponga na floresta longa
como um sino a tanger, dominical.
As naus florem de branco o deserto marinho.
Lembram virgens trazendo, em túnicas de linho,
na alva das velas uma cruz cristã;
e a patena dos sol as consagrou com o vinho
aéreo da manhã.
Oh hora ingênua da Fé! Oh primeiro evangelho!
Pero Vaz escreveu que “um índio já bem velho
apontou para a cruz…” Oh gesto anunciador!
Cabral e os que domaram os sete mares
Unem as mãos tremendo de fervor.
E na luz recém-vinda
em bênçãos tutelares,
a terra em flor se alegra em jubileus…
“a terra graciosa” e tão nova e tão linda! –
a terra desde então desposada de Deus.
Em: Poemas Completos de Murillo Araújo, com introdução de Adonias Filho, Rio de Janeiro, Irmãos Pongetti: 1960, 3 volumes.
Murilo Araújo – ou Murillo Araújo — (MG 1894 – RJ 1980) jornalista, formado em direito. Poeta, escritor, teatrólogo, ensaísta.
Obras:
Poesia:
Carrilhões (1917)
A galera (escrito em 1915, mas publicado anos depois)
Árias de muito longe (1921)
A cidade de ouro (1927)
A iluminação da vida (1927)
A estrela azul (1940)
As sete cores do céu (1941)
A escadaria acesa (1941)
O palhacinho quebrado (1952)
A luz perdida (1952)
O candelabro eterno (1955)
Prosa:
A arte do poeta (1944)
Ontem, ao luar (1951) — uma biografia de Catulo da Paixão Cearense
Aconteceu em nossa terra (pequenos casos de grandes homens)
Quadrantes do Modernismo Brasileiro (1958)
———
Victor Meirelles; ou Victor Meireles; ou Vitor Meirelles, ou ainda Vitor Meireles
Victor Meirelles de Lima (Nossa Senhora do Desterro, atual Florianópolis SC 1832 – Rio de Janeiro RJ 1903). Pintor, desenhista, professor. Inicia seus estudos artísticos por volta de 1838, com o engenheiro argentino Marciano Moreno. No ano de 1847, muda-se para o Rio de Janeiro e se matricula na Academia Imperial de Belas Artes – onde, em 1849, inicia o curso de pintura histórica. Em 1852 ganha o prêmio de viagem ao exterior e no ano seguinte segue para a Itália. Em Roma freqüenta, em 1854, as aulas de Tommaso Minardi (1787 – 1871) e, posteriormente de Nicola Consoni (1814 – 1884), com quem realiza uma série de estudos com modelo vivo. Com a prorrogação da pensão que lhe fora concedida continua sua formação estudando em Paris onde, em 1857, matricula-se na École Superiéure des Beaux-Arts [Escola Superior de Belas Artes], freqüentando as aulas de Leon Cogniet (1794-1880) e, em seguida, recebendo orientações de seu discípulo Andrea Gastaldi (1810-1889). Durante o período em que permanece no exterior corresponde-se com Porto Alegre (1806 – 1879). Retorna ao Brasil em 1861 e, um ano depois, é nomeado professor de pintura histórica da Aiba. Entre os anos de 1869 e 1872 executa duas grandes telas, Passagem do Humaitá e Batalha de Riachuelo. Em 1879 participa da Exposição Geral de Belas Artes, expondo a Batalha dos Guararapes ao lado da Batalha do Avaí de Pedro Américo (1843 – 1905). A apresentação das duas obras gera grande polêmica e um intenso debate no meio artístico. A partir de 1886 passa a se dedicar à execução de panoramas. Entre eles destacam-se: o Panorama Circular da Cidade do Rio de Janeiro, feito na Bélgica, juntamente com Henri Langerock (1830 – 1915) e Entrada da Esquadra Legal no Porto do Rio de Janeiro em 1894, produzida nesse mesmo ano.