Madrugada na roça, soneto de Luiz Guimarães

15 02 2024

Paisagem, década de 1920

Alfredo Volpi (Itália-Brasil, 1896-1988)

têmpera sobre tela, 20 x 26 cm

 

Madrugada na roça

 

Luiz Guimarães  (Brasil, 1847-1898)

 

Dentro da sombra matinal os campos

Riem-se ao fresco pranto da Alvorada,

Sobre a planície verde e perfumada

Voa o bando dos tardos pirilampos.

 

O arrieiro, tonto de preguiça,

Desperta apenas: — ao bulir das matas

Vem misturar-se o eco das cascatas

E os lentos dobres da primeira missa.

 

Sob o véu orvalhado os olhos dela

Brilham fitando os meus: ao divisá-los,

Cuido que Deus perdeu mais de uma estrela.

 

Rincham, pulando os nossos dois cavalos,

E através da manhã, cheirosa e bela,

Ouve-se o canto festival dos galos.

 

Em: Lírica, Sonetos e Rimas, Luiz Guimarães, Lisboa, Tavares Cardoso e Irmãos, 1886, 4ª edição, p.48





O lago e a estrela, poesia de Luiz Guimarães

6 01 2014

ISABEL PONS (1912 - 2002 )Reflexo da lua, P.E. 35 x 22Reflexo da lua, s/d

Isabel Pons (Brasil, 1912-2002)

Gravura, 35 x 22cm

O lago e a estrela

Luiz Guimarães

Disse a vaidosa estrela quando viu

De um lago azul a débil transparência:

— Por que te deu a sábia providência

Um corpo tão monótono e sombrio?

Comigo teve Deus maior clemência

E do esplendor eterno me vestia!

Que vales, pois, ó lago humilde e frio,

Perto da minha deslumbrante essência?

Nos céus eu moro! O meu destino zomba

De ignota força que reparte as mágoas!

Tenho a ventura de desconhecê-la.

— Mas quando a noite vagarosa tomba

É no seio fiel das minhas águas

Que vens dormir, ó luminosa estrela!

Em: Poetas cariocas em quatrocentos anos, Frederico Trotta, Rio de Janeiro, Vecchi:1965, pp. 230-231.