Havana, Cuba, pintura de Anette Power.
De Graham Greene eu só havia lido Viagens com minha tia, [Travels with my aunt], que li em inglês nos primeiros tempos de moradia nos Estados Unidos há anos. Boas recordações associadas a essa leitura — personagens fora do comum, como tia Augusta com uma vida não muito límpida — seu sobrinho, o monótono gerente bancário, aposentado, Henry Pulling, e sobretudo as aventuras europeias fora do esperado, não foram suficientes, no entanto, para que eu retornasse a Graham Greene até agora. Mas meu grupo de leitura votou neste clássico para discussão mensal. E foi, portanto, com prazer que abri as primeiras páginas de Nosso Homem em Havana. No início a narrativa pareceu de difícil engajamento. Passei para o original em inglês considerando que talvez fosse a tradução, neste caso de Brenno Silveira. Mas o início do original em inglês foi lido com tão pouco entusiasmo quanto seu correspondente em português. Até que a história, pequenina, não chegando mesmo a 280 páginas, toma um embalo, lá por um terço e daí por diante fluiu sem obstáculos, tornando-se uma das mais interessantes narrativas que li nos últimos tempos. E devo acrescentar, escrita com grande humor, uma sátira muito bem feita que chega, em ocasiões, a trazer o riso solto ao leitor. Realmente muito engraçado.
Publicado em 1958, o livro tem trama elaborada. Passa-se em Cuba, ainda no governo de Batista, mas já com rebeldes agindo nas montanhas, precursores da revolução cubana liderada por Fidel Castro e seus associados. Interessado no que pode vir a acontecer, o serviço secreto britânico, por falta de melhor solução, contata James Wormold para mandar notícias sobre o que se passava na ilha. Wormold, cidadão inglês radicado em Cuba, vendedor de aspiradores de pó, figura apagada e insossa que nenhum de nós pode imaginar como personagem principal de uma aventura de espionagem, precisava reforçar o conteúdo de seu bolso para dar à filha, manipuladora sem limites, as necessidades de luxo que ela desejava. Aceita o trabalho, desconhecendo como proceder. A necessidade, dizem ser a mãe das invenções. Sabedoria popular que se afirma neste caso. Que mal poderia acontecer, se desta longínqua ilha no Atlântico, mais de 7.000k de Londres, Wormold colorisse a realidade? Nada, ele pensa. Quem vai saber? A situação toma caminhos inimagináveis quando na capital inglesa o serviço secreto leva a sério os relatórios assinados por Wormold.
Graham Greene
Farsa, comédia rasgada são termos comumente associados ao teatro, mas podem descrever a sátira feita por Graham Greene, que baseia seu sucesso — como o melhor do humor inglês — nas pequenas frustrações que seus personagens, verdadeiramente humanos, imperfeitos, ingênuos sofrem, e de como são incapazes de impedir as consequências inevitáveis de suas ações. Paródia, crítica sobre o serviço secreto inglês e métodos da política mundial, do final da década de 1950, não tornam a história datada. Ao contrário, ela é atemporal, clássica no sentido mais largo da palavra, porque é baseada não em circunstâncias de época mas no registro das emoções e do caráter de seus personagens. Sensível, Graham Greene brinca com o que rotulamos importante. E explora com destreza as fraquezas humanas. Sim, é um clássico que pode ser lido e relido inúmeras vezes. Excelente leitura. Leve e curta.
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