Tabac, 1928
Joaquin Torres Garcia (Uruguai, 1874 – 1949)
óleo sobre cartão, 52 x 73 cm
Museu de Artes Visuais do Uruguai
Há algum tempo coleciono pequenos romances, de preferência de cento e cinquenta a duzentas páginas, cuja brevidade narrativa não esvazia a densidade literária. A uruguaia, romance do argentino Pedro Mairal, preenche esses requisitos e depois de lido achou um lugar especial entre outras obras do gênero: O fuzil de caça de Yasushi Inoue e A vida peculiar de um a carteiro solitário, de Denis Thériault.
Talvez seja uma das narrativas mais masculinas que li nos últimos tempos. O que isso quer dizer? O ponto de vista e a maneira de contar são explicitamente masculinos. Trata-se da história de um homem, num casamento que perdeu a paixão, frustrado profissionalmente, mantido pela mulher, que usa um pagamento antecipado de editoras sobre dois de seus livros — ele é escritor — para sair de Buenos Aires, ir a Montevidéu, fazer uma operação de câmbio que só faz sentido na América Latina e mais ainda na volúvel economia argentina. Ele sai de manhã em direção a Montevidéu para efetuar a transação bancária programada, enquanto secretamente nutre o desejo de se encontrar com Magali, “Maga”, jovem que o encantara meses antes, num evento literário no Uruguai e que desde então tem preenchido suas fantasias românticas.

Volta para casa dezessete horas depois. Neste meio tempo, enquanto viaja, nós também somos levados por ele através do tempo, aprendendo sobre seu casamento, filho, profissão, Magali, o cotidiano em Buenos Aires e ausência de criatividade que o assola. Também ficamos cientes de suas fantasias sexuais e do que planeja fazer ao encontrar a jovem uruguaia que o enfeitiçara. Nem por isso deixamos de nos surpreender com os eventos. Há um pequeno gosto de mistério nesta história.
Pedro Mairal desenvolve uma narrativa densa, clara, direta que encanta o leitor, levado pela mão a acompanhá-lo. Repleto de referências à livros, escritores, à cena literária e cultural, à música, com fino humor e destro gerenciamento, ele enriquece em muito o que em mãos menos hábeis não passaria de uma pequena aventura, de uma malandrice literária. Apesar de trabalhar seu texto incessantemente para chegar à clareza apesar da complexa linha narrativa, a leitura de A uruguaia é rápida, agradável e insinuante.
Pedro Mairal
Por suas constantes referências aos escritores argentinos e de outros lugares, Pedro Mairal posiciona sua escrita dentro do panorama literário atual da América Latina e percebemos que é junto a Borges, Cortazar e outros de semelhante calibre que um dia pretende se encontrar. Muito justo se continuar assim.
Entendo este ser seu segundo romance. O primeiro Uma noite com Sabrina Love, que comprei depois de ler este livro, está na pilha para leitura próxima. Já foi transformado em filme. Sou fã do cinema argentino. Filmes argentinos, quase sempre, são maravilhosos com perspectivas únicas sobre casos corriqueiros. É justamente esse tom que permeia A uruguaia. Parece roteiro de filme argentino. E que roteiro! Excelente leitura. Recomendo.
NOTA: este blog não está associado a qualquer editora ou livraria, não recebe livros nem incentivos para a promoção de livros.





Parabéns Ladyce pela sua ótima resenha !
Eu também li a Uruguaia. Gostei e recomendo.
Ela consegue colocar de forma clara uma historia muito interessante e comum em nossos dias. No decorrer do texto consegui me envolver imaginando os fatos e torcendo pelos acontecimentos. Ainda põe a gente a elucubrar sobre pontos interessantes. Bom exercício para a imaginação.
Obrigada, Magali.