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Dia de Finados, 1859
William Bouguereau (França,1825-1905)
óleo sobre tela, 147 x 120cm
Museu de Belas Artes de Bordeaux
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Os mortos
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Alph. Karr
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A vida muda-se completamente no dia em que se vai depor na cova o corpo de uma criatura amada; que de coisas até então estranhas nos inquietam! É uma imagem que não nos acompanha, mas que nos aparece, quando menos a esperamos,para gelar-nos no meio de um prazer ou de um festim, para quebrar um sorriso que apenas vai desabrochar nos lábios.
Para evocá-la basta ouvir uma palavra familiar ao morto, um som, uma voz, uma canção longínqua, que o vento nos traz nas asas; basta o aspecto e o cheiro de uma flor, para que essa triste e querida imagem nos apareça, e para que o coração se doa, como uma ponta aguda, a dor da eterna separação.
Desde esse dia uma parte de nós mesmos está na sepultura; desde esse dia prazeres e distrações são intervalos de rosa, de que nos poderá tirar uma lembrança levando-nos ao cemitério outra vez.
E com efeito, na sepultura, no fundo da cova, lá jaz tudo o que nós amávamos e tudo o que amava ali conosco; flores cultivadas juntos, canções cantadas de comum, prazeres e tristezas recíprocas, tudo isso que nos faz lembrar os mortos e nos fala deles ao coração.
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Jean-Baptiste Alphonse Karr (França, 1808-1890)
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Em: O Espelho: revista de literatura, modas, indústria e artes, n. 19, 8 de janeiro de 1860, p.12. da edição em facsímile, Rio de Janeiro, MEC:2008, p. 242.