Canal do Mangue, Rio de Janeiro, década de 1930. Flickr — Rio antigamente
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Se me coubesse a votação para um prêmio nacional de literatura — melhor livro do ano — ele iria para Traduzindo Hannah de Ronaldo Wrobel [Record:2010]. O livro já foi um dos finalistas, este ano, do Prêmio São Paulo, nessa mesma categoria, quando o vencedor foi Passageiro do fim do dia de Rubens Figueiredo. Mesmo assim, continuo convencida de que o romance de Ronaldo Wrobel, escancara as portas para novos rumos da literatura brasileira contemporânea. O que faz esse livro merecer tanto entusiasmo? Tema, estilo, narrativa, leveza, humor, ironia e pesquisa.
O tema é um retrato de grupos de imigrantes judeus que chegaram ao Brasil nas primeiras décadas do século XX, fugidos de desastrosas realidades: guerra, fome, desemprego, perseguição. Tais como milhares de outros imigrantes, que ao longo dos séculos vieram se estabelecer no país. Acentuando a narrativa, trazendo-a para o nível de deleite literário, está o estilo de Ronaldo Wrobel, leve e solto, com uma refrescante e fértil maneira de expressão: imagens, figuras de linguagem soam novas, soam belas e vivazes. Permeando todo o texto há uma leve ironia, um humor fugaz que nos faz sorrir, quase rir em certos trechos sem, no entanto, termos diante de nós nada mais do que a mera e justa comédia humana. Sua pesquisa foi preciosa, o que tornou fácil imaginar as andanças pelas ruas do Rio de Janeiro, pela Lapa, pelo Catete, pela Praça Onze, mesmo que hoje esses locais sejam tão diferentes.
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A história tem início na década de 1930. Max Kutner sapateiro, imigrante e judeu polonês, que já havia estabelecido uma pequena clientela no centro do Rio de Janeiro, é convocado, durante o governo Vargas, para trabalhar na censura de cartas. Traduzir do iídiche para o português passa a ser sua segunda ocupação. Ele se enfronha na intimidade da comunidade judaica através das cartas que traduz. No processo, também se familiariza com as irmãs, Hannah e Guita, do Rio de Janeiro e de Buenos Aires, e se interessa em conhecer Hannah. Quando isso acontece, descobre que ela não era bem a pessoa que ele imaginava ser quando lia sua correspondência.
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Ronaldo Wrobel
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Deste momento em diante passamos a uma grande aventura em terras cariocas. Num ritmo galopante, vamos de espionagem a contra-espionagem. A cada capítulo uma surpresa e um aprofundamento da trama. Como num teste de visão, vamos corrigindo nossas lentes, passo a passo, enquanto acompanhamos o progresso de Max Kutner que, como nós, precisa acertar a combinação de lentes para ver, entender, compreender e digerir tudo que o rodeava. Traduzindo Hannah é uma pequena obra-prima burlesca, inteligente e histórica. Não deixe de ler. Um deleite!
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UMA ENTREVISTA COM O AUTOR
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