Serviço, uma arte em extinção no Rio de Janeiro

22 05 2014

 

 

Robin Cheers (EUA) browsing_the_stacks, 2007

Passando os olhos nas estantes, 2001

Robin Cheers (EUA, contemporânea)

www.robincheers.com

 

Na semana  passada uma amiga me recomendou a leitura do livro de Ana Miranda, O peso da luz:  Einstein no Ceará, publicado em 2013. Ela o estava lendo e gostando.  Saí do nosso encontro na sexta-feira e fui diretamente à uma pequena mas excelente livraria em um shopping ao lado de casa.  Eles não tinham e nunca tinham ouvido falar dessa publicação.  Esta é a minha livraria favorita por aqui, mas reconheço que é muito pequenina. O sistema eletrônico deles não é ligado ao mundo apesar de dar a impressão oposta por ter algumas telas de computação à vista.  Uma busca no meu celular mostrou que o livro havia sido publicado por uma pequena editora: Armazém da Cultura.  Nesta livraria ninguém se ofereceu para que eu encomendasse o livro através deles. Estranhei porque sou conhecida no local, freguesa antiga. Saí desapontada e me perguntando por que não havia interesse deles em satisfazer esta cliente?

Sábado pela manhã, saí para um passeio a pé e um almoço leve em uma livraria próxima, aqui na zona sul do Rio de Janeiro, no final do Leblon. Esta livraria é bem grande, tem um café-restaurante ao fundo onde sempre encontro amigos. Em geral é uma livraria bem badalada pela inteligência carioca frequentadora de noites de autógrafos diversas.  Lá, a mesma cena se repetiu. Não sabiam da existência do livro, não tinham ideia do que se tratava e, sinceramente, pela linguagem corporal não estavam interessados em saber do meu problema em localizar o livro. Ainda sugeriram que eu pudesse estar com nome do autor errado, porque o único livro recente de Ana Miranda era Semíramis. Desinteressados de verem o livro no meu celular eles trataram de me despachar o mais rápido possível. Esta livraria também não estava conectada à internet e não podia fazer uma busca para descobrir detalhes do livro. Rapidamente a atendente detrás do balcão de vendas para onde eu havia dirigido as minhas perguntas, se virou para o cliente seguinte, ignorando a minha frustração, incapaz de oferecer seus serviços para me ajudar nessa tarefa.

 

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Corri então a outra livraria, a dois quarteirões dali, no mesmo bairro. Essa é parte de uma cadeia grande. Situação semelhante.  Mas devo dizer, para ser justa, o tratamento foi muito mais afável e com maior calor humano.  Os empregados pelo menos fizeram um esforço para amenizar a minha frustração.  Haviam sido, obviamente, treinados para tentarem satisfazer o cliente.

Não entendo do que está por trás de uma livraria.  Não é meu papel saber as limitações de uma livraria, de seus problemas em representar uma editora. Isso é papel para o proprietário do estabelecimento.  O meu é vir com o dinheiro e comprar aquilo que eles aparentemente se propõem a vender.  Não acreditei que eu não pudesse achar um livro de uma escritora brasileira do calibre de Ana Miranda, em todas as livrarias do Rio de Janeiro.  Mas este sendo o caso, não entendo os motivos que fizeram com que não houvesse interesse em preencher o meu pedido em qualquer uma das três livrarias visitadas. Não se tratava de um “João da Silva” que publicou seu livro na impressora de casa.

Acabei achando o livro, em uma livraria bem maior.  Esta tem o catálogo online, possui um acervo generoso e conexões no Brasil inteiro. Entendo que algumas livrarias não tenham livros de editoras menores ou menos conhecidas. Principalmente livrarias independentes. Mas me aborrece ver que ninguém teve o interesse de me SERVIR, ou seja de achar para mim aquilo que eu procurava. Nenhuma  das três se ofereceu para que eu encomendasse com elas a compra do livro.  Francamente esse comportamento não acontece em uma livraria no exterior.

Falta aqui aquele senso de que custa muito dinheiro ao proprietário do estabelecimento trazer o cliente à sua porta. É dinheiro investido em anúncios, em manter a loja aberta, os empregados trabalhando; investimento na página da internet, na página das redes sociais [mesmo que as redes sociais sejam gratuitas, há que colocar uma pessoa trabalhando nessas páginas] e até mesmo o custo do aluguel numa das áreas mais nobres da cidade. Tudo isso é custo.  E é alto. Quando aquele cliente entra na loja precisa sair satisfeito com o tratamento que teve. Todas três livrarias foram reprovadas porque nenhuma delas ofereceu uma solução, criativa ou não, para esta cliente que queria comprar.

Em outros países um telefonema para a competição estaria em ordem.  A livraria reservaria o livro lá no outro estabelecimento, que compete com ela. Ou pediria  a alguém, um empregado, que fosse à livraria competidora e comprasse o livro. Sim, eles não teriam o lucro imediato, mas teriam a minha fidelidade.  Em outros países, não deixar o cliente sair sem uma solução para o seu problema é o lema do comércio. “Pode deixar, teremos o volume aqui, amanhã de manhã“, ou “a Sra. fique tranquila, levamos o volume até sua casa amanhã“.  Ao invés de criticar em um tom irônico o cliente que deseja o livro de uma pequena editora, como me aconteceu na segunda parada, o vendedor diria: “interessante esta editora, precisaremos ver que mais podem ter em seu catálogo…”  Mesmo que seja simplesmente por educação. Em outros lugares do mundo, já tive livros entregues no meu hotel, até mesmo na próxima cidade da viagem… É essa a atenção de que o cliente precisa. Enfim o cliente é rei, ele manda, porque é ele quem compra. Sem o consumidor não há comércio. Depois, no futuro, essas livrarias irão reclamar, dizer que as vendas online as obrigaram a fechar.  Dirão que não aguentaram porque a competição era muito grande. Mas o que faltou foi a consciência de que o cliente que entrou naquele estabelecimento precisa sair satisfeito, não importa a dificuldade, o exotismo de sua necessidade.

Ainda não comecei a ler o livro de Ana Miranda. Ele se encontra entre outros cinco livros comprados na mesma tarde, na livraria em que o encontrei. Estão empilhados porque compro muitos livros. Repousam sobre a mesa de trabalho, ao lado do computador.





O que é um sucesso editorial no Brasil?

9 08 2013

Yan-Nascimbene-19 Yan Nascimbene

Ilustração Yan Nascimbene.

Nesta semana o jornal gaúcho Zero Hora publicou duas matérias de interesse para quem se preocupa com a baixa taxa de leitura no Brasil.  O foco de ambas as publicações foi o número de volumes impressos por título.  Nos grandes centros do Brasil, parece que a leitura anda aumentando.  Cá pela zona sul do Rio de Janeiro, ir a uma livraria no fim de semana é ocasião certa de encontrar dezenas de pessoas se acotovelando, como se livros estivessem sendo distribuídos gratuitamente.  Além disso, podemos ter a certeza de encontrar casualmente vizinhos, amigos, colegas de trabalho que, sem combinação prévia, acabam emendando a compra de um livro em um bate-papo informal no café da livraria ou no café mais próximo.  Quer a livraria fique num shopping ou tenha portas abertas para a rua, o burburinho no local é de aquecer o coração de quem se preocupa com a educação brasileira.

Mas observando o número de exemplares publicados nas nossas edições de sucesso, os números parecem ridiculamente pequenos para o tamanho da nossa população.  As maiores tiragens de livros no país são de 600.000 – seiscentos mil – volumes.  Nesse nicho ficam os autores de grandes vendas internacionais como a trilogia iniciada com o volume 50 tons de cinza de E. L. James. O último volume da trilogia, 50 tons de liberdade, já saiu com mais de 500.000 – quinhentos mil —  exemplares impressos. Parece muito não é mesmo?  Mas somos 197.000.000  — cento e noventa e sete milhões – 600.000 exemplares são equivalentes a  ⅓ de 1%.  Parece insignificante.  E essa é a maior tiragem de um livro no Brasil.  Triste.

adam_pekalski menino dragãoIlustração Adam Pekalski.

Grandes sucessos editoriais de autores brasileiros têm ainda menores tiragens.  Aqui focamos nos brasileiros. Os dois títulos de maior tiragem são elevados pelas religiões em que se firmam.

Ágape, do padre Marcelo Rossi – 500.000

Casamento blindado de Cristiane e Ricardo Cardoso – filha e genro do Bispo Edir Macedo – 230.000

Só depois é que encontramos o mega-seller Laurentino Gomes.

1889 – tem edição de 200.000

Seguido por:

Manuscrito encontrado em Accra de Paulo Coelho  — 100.000

Luís Fernando Veríssimo – novo título ainda não divulgado – sairá com 100.000 também

Carcereiros de Dráuzio Varella – 80.000

Guia politicamente incorreto da filosofia – Luís Felipe Pondé – 50.000

A graça da coisa de Martha Medeiros – 50.000

Mas há também o que poderíamos chamar de círculo vicioso.  De acordo com o Consultor Editorial Carlos Carrenho, as tiragens grandes não refletem só a expectativa das editoras.  As livrarias também preferem os livros com maior tiragem.  De acordo com ele “A primeira coisa que as livrarias perguntam é qual a tiragem inicial. Usam a informação para avaliar o tamanho da aposta naquele título.”

Assim fica difícil quebrar barreiras.  Se as livrarias não estão interessadas em tiragens menores, como pode o autor aumentar as suas vendas até que consiga um número razoável em volume de venda?  Porque diferente de outros países as nossas editoras não se dedicam a promover os títulos que publicam.  Comparo com os Estados Unidos, onde morei por muitos anos, e não vejo por aqui a dedicação que as editoras de lá dão ao promover os livros que publicam.  É claro que lá também se pede muito dos escritores.  Eles viajam de uma costa a outra do país dando entrevistas e se encontrando com leitores em livrarias, cafés, grupos de leitura, exaustivamente.  Isso não vejo acontecer por aqui fora do eixo Rio-São Paulo.  Ocasionalmente sim, mas não regularmente.

Temos ainda muito o que fazer no Brasil.

FONTES:

Saiba quais são os livros de maior tiragem no Brasil

Tiragens iniciais gigantescas de livros indicam tendências de mercado e estratégia de vendas





O mundo dos livros nos EUA preocupado: editoras e livrarias.

20 12 2008

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Biblioteca, 1949

Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992)

Óleo sobre tela

As grandes casas editoriais nos EUA tais como a Random House estão em pleno processo de cortar seus orçamentos, de cortar o número de empregados e estão também em processo de re-estruturação organizacional.  A Houghton Mifflin Harcourt parou de adquirir manuscritos para o resto do ano.  

 

O mundo editorial ainda está tentando absorver as más notícias do início do mês quando foi anunciado que diversas editoras começaram a despedir seus empregados e congelar os salários daqueles que permaneceram com estas companhias.  Tudo isso está acontecendo em pleno período natalino, responsável por 25% de todas as vendas do ano para as editoras.  

Ninguém pensou que as editoras fossem passar pelo período de declínio econômico no país sem sofrerem algumas conseqüências.   Mas quando as mudanças na Random House foram anunciadas no mesmo dia em que a Simon & Schuster e a companhia de publicações cristãs de Thomas Nelson, anunciaram também redução do quadro de empregados dessas companhias, o setor editorial dos EUA levou um choque,

Mesmo tomando conhecimento dos problemas da economia, a maioria das pessoas no mundo editorial ainda mantinha um enfoque otimista.  Livros, eles sabem de outras crises econômicas, são à prova de recessão, porque são baratos.  Pelo menos é este um dos princípios em que a indústria editorial americana sempre acreditou.  

Mas Larry Robin,  dono da livraria Robin’s Book que está no ramos desde 1960 não acredita que se possa acreditar mais nisso.  No mundo de hoje, livros já não são tão baratos.  Com o computador, com os Ipods, você consegue todo tipo de entretenimento barato.  Sua livraria que existe  no centro da cidade da Filadélfia desde 1936 está também fazendo uma re-estruturação.  Vai deixar de vender livros novos e se transformar num sebo.   Era uma questão de poder ficar ainda neste ramo por mais um ano.  Mas, não vejo futuro nisso.  Não vejo a economia melhorar em tão pouco tempo.   E tampouco vejo o modelo econômico de comércio a varejo como nós conhecíamos, voltando. 

Livrarias independentes há muito tempo que estão com dificuldades de sobrevivência nos EUA.  Sofrem desde que apareceram as grandes cadeias que compram muitos volumes, conseguem descontos das editoras e revendem com uma margem muito menor do que a necessária para que uma livraria independente sobreviva.   Mas hoje em dia, até as grandes cadeias de livrarias, tais como  Costco, Barnes & Noble, Borders e Books-a-million estão vendo suas vendas diminuindo, graças à concorrência das vendas on-line de companhias como a Amazon.

 

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Este artigo é uma tradução liberal do artigo do site da NPR,  National Public Radio, em Washington DC.

Para ler este artigo da NPR na íntegra, clique AQUI.