Passos, poesia de Henriqueta Lisboa

20 01 2022
Pintura de Cláudio Dantas (Brasil, 1959)
Passos

 

Henriqueta Lisboa

 

Passos de brinquedos, leves,

que não conhecem o chão.

É o bebê que faz a estréia

com sapatinhos de lã.

 

Passos que dizem bom-dia

de tão claros, tão alegres!

São as meninas crescidas

que voltaram do colégio.

 

Passos enérgicos, largos,

tremem as próprias paredes.

São os homens do trabalho,

que não têm tempo a perder.

 

Vagarosos passos últimos

arrastados em chinelos.

São as vovozinhas surdas

acalentando seus netos.

 

Em: O menino poeta, Henriqueta Lisboa, (Edição ampliada) Imprensa Oficial de Belo Horizonte, Governo do Estado de Minas Gerais: 1975, p. 141





Jardim, poesia infantil de Henriqueta Lisboa

22 07 2021
Ilustração de Corinne Malvern
 

Jardim

 

Henriqueta Lisboa

 

 

— Menina faceira

de laço de fita

não vás tão bonita

sozinha ao jardim.

Se pensar Beija-Flor

que teu laço é flor,

pelos ares levará

um anel dos teus cabelos.

 

— Mamãe, não tenha cuidado,

eu sei dar laço bem dado.

 

— Menina trigueira

de faces vermelhas

no jardim sem teu irmão

não fiques, não.

 

Se Beija-Flor imagina

que teu rosto é flor,

menina, minha menina,

de certo um beijo te dá.

 

— Quando ele me der um beijo,

nas minhas mãos estará.

 

Em: O menino poeta, Henriqueta Lisboa, (Edição ampliada) Imprensa Oficial de Belo Horizonte, Governo do Estado de Minas Gerais: 1975, pp 65-66





Patinhos na lagoa, poesia infantil de Henriqueta Lisboa

7 06 2021
Ilustração de Cicely Mary Barker (GB, 1895-1973)
 
Patinhos na lagoa

 

Henriqueta Lisboa

 

Chegam de manso, de manso,

finos pescoços esticam,

deslizando, deslizando,

ferem o espaço com o bico,

deslizando

na superfícies do vidro.

 

O espelho da água que ondula

reflete frocos de arminho

(arminho, paina, algodão).

E as nódoas brancas no azul

são delicadas carícias,

recordam jardins de inverno

quando há lã, cristais e neve.

 

Na lagoa muito fria,

sob o ouro do sol que brilha,

mora um céu:

navegam nuvens, navegam …

Doçura da hora que escoa

vagarosa, deslizando

como um pato na lagoa…

 

Em: O menino poeta, Henriqueta Lisboa, (Edição ampliada) Imprensa Oficial de Belo Horizonte, Governo do Estado de Minas Gerais: 1975, pp 59-60





“Lembrança do mundo antigo”, poema de Carlos Drummond de Andrade

5 02 2018

 

 

domingo claudio dantasDomingo

Cláudio Dantas (Brasil, 1959)

óleo sobre tela

 

 

Lembrança do mundo antigo

 

Carlos Drummond de Andrade

 

 

Clara passeava no jardim com as crianças.

O céu era verde sobre o gramado,

a água era dourada sob as pontes,

outros elementos eram azuis, róseos, alaranjados,

o guarda-civil sorria, passavam bicicletas,

a menina pisou na relva para pegar um pássaro.

O mundo inteiro, a Alemanha, a China, tudo era tranquilo ao redor de Clara.

As crianças olhavam para o céu… Não era proibido!

A boca, o nariz, os olhos estavam abertos…

Os perigos que Clara temia eram a gripe, o calor, os insetos.

Clara tinha medo de perder o bonde das 11 horas,

esperava cartas que custavam a chegar,

nem sempre podia usar vestido novo. Mas passeava no jardim pela manhã!!!

Havia jardins, havia manhãs, naquele tempo!!!

 

 

Em: Poemas para a Infância: antologia escolar, editado por Henriqueta Lisboa, s/d, São Paulo: Edições de Ouro, p. 26-7





Café, poesia de Ribeiro Couto

15 10 2016

 

cafe-uma-xicara-dePato Donald pede um café © Walt Disney
Café

Ribeiro Couto

Sabor de antigamente, sabor de família

Café que foi torrado em casa,

Que foi feito no fogão de casa com lenha do mato de casa.

Café para as visitas de cerimônia,

Café para as visitas de intimidade,

Café para os desconhecidos, para os que pedem pousada, para toda gente.

Café para de manhã, para de tardinha, para de noite,

Café para todas as horas do riso ou da pena,

Café para as mãos leais e os corações abertos,

Café da franqueza inefável,

Riqueza de todos os lares pobres,

Na luz hospitaleira do Brasil.

Em: Poemas para a Infância: antologia escolar, editado por Henriqueta Lisboa, s/d, São Paulo: Edições de Ouro, p. 50

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Canção da Primavera, poesia de Mário Quintana

2 10 2016

 

 

primavera-menina-com-boneca-marie-cramerPrimavera, ilustração de Marie Cramer.

 

 

Canção da Primavera

 

Mário Quintana

 

 

Primavera cruza o rio,

Cruza o sonho que tu sonhas.

Na cidade adormecida

Primavera vem chegando.

Catavento enlouqueceu,

Ficou girando, girando,

Em torno do catavento

Dançamos todos em bando.

 

Dancemos todos, dancemos,

Amadas, mortos, Amigos,

Dancemos todos até

Não mais saber o motivo….

Até que as paineiras tenham

Por sobre os muros florido!

 

 

Em: Antologia Poética para a Infância e a Juventude, Henriqueta Lisboa, Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Livro: 1961, pp: 121-2.





Tempestade, poesia infantil de Henriqueta Lisboa

5 10 2015

 

 

chuva a dois, freddie langelerIlustração Freddie Langeler.

 

 

Tempestade

 

Henriqueta Lisboa

 

— Menino, vem para dentro,

olha a chuva lá na serra,

olha como vem o vento!

 

— Ah, como a chuva é bonita

e como o vento é valente!

 

— Não sejas doido, menino,

esse vento te carrega,

essa chuva te derrete!

 

— Eu não sou feito de açúcar

para derreter na chuva.

Eu tenho força nas pernas

para lutar contra o vento!

 

E enquanto o vento soprava

e enquanto a chuva caía,

que nem um pinto molhado,

teimoso como ele só:

 

— Gosto de chuva com vento,

gosto de vento com chuva!

 

 

Em: Poesia Brasileira para a Infância, Cassiano Nunes e Mário da Silva Brito, São Paulo, Saraiva: 1967, Coleção Henriqueta, p. 170.





As virtudes, poesia de Alphonsus de Guimaraens

7 08 2015

 

3 girlsTrês meninas, autoria desconhecida.

 

As virtudes

 

Alphonsus de Guimaraens

 

 

São três irmãs, são três flores,

feitas de raios de luz.

Plantou-as, entre fulgores,

a mão santa de Jesus.

 

Uma é a Fé, outra, a Esperança,

vem a Caridade após…

Feliz de quem as alcança!

Vivem sempre junto a nós.

 

São belas como princesas.

A Caridade  é talvez,

neste mundo de incertezas,

a mais formosa das três.

 

 

Em: Antologia Poética para a Infância e a Juventude, Henriqueta Lisboa, Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Livro: 1961, pp: 62-3





As flores e os pinheiros, poema de Machado de Assis

23 06 2015

 

Guilherme Matter (1904 -1978) plantação de trigo no Paraná.Plantação de trigo no Paraná

Guilherme Matter (Brasil, 1904-1978)

óleo sobre tela

 

 

As flores e os pinheiros

Machado de Assis *

 
Vi os pinheiros no alto da montanha
Ouriçados e velhos;
E ao sopé da montanha, abrindo as flores
Os cálices vermelhos.

Contemplando os pinheiros da montanha,
As flores tresloucadas
Zombam deles enchendo o espaço em torno
De alegres gargalhadas.

Quando o outono voltou, vi na montanha
Os meus pinheiros vivos,
Brancos de neve, e meneando ao vento
Os galhos pensativos.

Volvi o olhar ao sítio onde escutara
Os risos mofadores;
Procurei-as em vão; tinham morrido
As zombeteiras flores.

 

*Este poema é a tradução de Machado de Assis do poema publicado em francês do poeta chinês Tin-Tun-Sing.

 

 

Em: Antologia Poética para a Infância e a Juventude, selecionado por Henriqueta Lisboa, Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Livro:1961,p. 173.





Ciranda de mariposas, poesia de Henriqueta Lisboa

14 04 2015

 

 

insetos se reunem, Hazel Frazee, Child Life 1927-03Insetos se reúnem, ilustração de Hazel Frazee, para a capa da Revista Child’s Life, março de 1927.

 

 

 

Ciranda de Mariposas

 

Henriqueta Lisboa

 

Vamos todos cirandar
ciranda de mariposas.
Mariposas na vidraça
são jóias, são brincos de ouro.

Ai! poeira de ouro translúcida
bailando em torno da lâmpada.
Ai! fulgurantes espelhos
refletindo asas que dançam.

Estrelas são mariposas
(faz tanto frio na rua!)
batem asas de esperança
contra as vidraças da lua.