Profundamente, poesia de Manoel Bandeira

24 06 2024

Festa de São João, 1967

Adelson do Prado (Brasil, 1944 – 2013)

óleo sobre tela, 100 X 73 cm

 

Profundamente
 


Manoel Bandeira

 

Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Estrondos de bombas luzes de Bengala
Vozes, cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.

No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam, errantes

Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?

— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.

Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci

Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?

— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.





São João

24 06 2024

Mastro de São João, 2000

Yara Tupynambá  (Brasil, 1932)

acrílica sobre tela, 90 x 100 cm