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Idoso com chapéu de palha, 2012
Brad Schwede (Austrália, 1980)
Óleo
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Tinha que vir da Suécia a idéia de contar a história do século XX através das aventuras de um homem que faz bombas. Conversando com um amigo, num encontro semanal, fui lembrada da importância que a dinamite tem para a Suécia. O assunto veio à baila quando contava a ele a incrível aventura de ler O ancião que saiu pela janela e desapareceu, de Jonas Jonasson, escritor sueco, ex-jornalista, cujo primeiro romance já encantou mais de 4,5 milhões de leitores de acordo com a capa do livro. Foi aí que, de repente, ganhei uma nova visão do livro que eu acabara de ler. Por não ter me lembrado que Alfred B. Nobel, hoje famoso por ser criador do Prêmio Nobel, havia feito fortuna com a invenção da dinamite, perdi a conexão óbvia do ponto de vista da história do mundo através de olhos suecos. E por que isso seria importante para gostar ainda mais do livro? Não é importante. O livro é delicioso mesmo que se ignore esse fato. Mas lembrar disso enriquece o prazer, contextualiza a narrativa que tem como subtexto a evolução do século XX através dos olhos de quem construía bombas.
O ancião que saiu pela janela e desapareceu é escrito no tom impassível de quem conta histórias hilariantes com a seriedade dos acontecimentos reais. Esse tom nos induz a um sorriso largo e à expectativa a uma provável gargalhada, pois logo após as primeiras páginas percebemos que em seguida virá uma série interminável de aventuras cujo protagonista será um velhinho centenário. Isso é feito em dois tempos: as aventuras de Karl Karlsson no mês de maio de 2005, quando ele foge de um asilo onde uma festa para comemorar o seu centenário está prestes a começar e viaja com uma mala de cheia de dinheiro que não lhe pertence. E em capítulos entremeados, conhecemos a história de Karl Karlsson, especialista na fabricação de bombas, desde sua infância até o presente. Ambas são uma corrente sem fim de aventuras, altamente improváveis, que deliciam o leitor.
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Karl Karlsson é aquele homem que parece cair de pára-quedas nas situações mais inesperadas e sair delas com uma boa dose de atrevimento e fleuma. Acreditando que a vida é o que ela é, Karlsson encara o imprevisível tomando decisões simples e sagazes aplicadas de maneira impassível. Imperturbável, Karlsson acaba sendo de grande valia para os mais importantes líderes do século XX: Truman, Churchill, Mao, Lenine, Stalin entre outros. Ele se infiltra e contribui de maneira surpreendente até mesmo para o “Manhattan Project” durante o fabrico da primeira bomba atômica. Mas Karlsson só participa desses numerosos eventos, que mudam o rumo da história no século XX, pelo lado do avesso, pelas coxias, nos corredores palacianos; tudo porque está sempre metido em tanta confusão que precisa sistematicamente sair de uma situação difícil que o levará ao exílio ou à prisão. Eventualmente Karlsson se torna um poliglota que se sai bem das mais inverossímeis situações em qualquer canto do mundo. Vivendo perpetuamente em perigo, e saindo-se inalterado graças à própria ingenuidade Karlsson é um protótipo do anti-herói. O equilíbrio entre sua habilidade de prover governos com soluções que requerem sigilo, perigo e espionagem e a necessidade de fugir de um problema pessoal de grande desconforto – como a prisão – este jogo entre opostos, faz parte da brilhante narrativa que nos leva às gargalhadas.
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Jonas Jonasson
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Nessas circunstâncias há dezenas de ilegalidades cometidas, prevaricação, roubo e inverdades dia sim outro também, como deve acontecer em livros de aventuras. Quanto mais aventura maiores as mentiras, maiores as encrencas. O humor surge justamente do contraste entre o que o anti-herói faz e a moralidade do leitor das peripécias. Se você quer se divertir nesse inverno, sente-se em lugar confortável, debaixo de manta quentinha e divirta-se com esse senhor intrépido que aos cem anos de idade, ainda gosta de uma aventura e nada mais tem a perder. Vale a pena é puro divertimento.