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Escola em 1879, s/d
Morgan Weistling (EUA, contemporânea)
óleo sobre tela, 100 x 150 cm
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O pano de fundo da semana que passou foi a inépcia do ENEM e de todos os nossos dirigentes quanto ao estado desastroso da educação no país. Não fugindo a um dos objetivos desse blog (auxiliar a quem se dispõe a melhorar o ensino no Brasil) hoje posto um texto, talvez folclórico, talvez não, escrito por um escritor brasileiro que também se preocupava com a educação. Além de ser um bom texto escolar, ele lembra aos nossos governantes que um pouco de humildade e de consideração para com o povo brasileiro estão entre as menores das requisições que ainda fazemos deles. Que visitem as suas escolas e que se lembrem da confiança que depositamos em suas mãos quando os elegemos. A melhoria da nossa educação não é para o futuro, nem para hoje. É para ontem…
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A visita à escola
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Mário Sette
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Era uma escola humilde de arrabalde: sala ligeiramente caiada, movéis toscos, um desbotado mapa na parede, um crucifixo sobre a banca do professor.
As crianças, filhas de gente humilde, algumas descalças haviam chegado,tomando seus lugares, abrindo os livros, dispondo os cadernos e as canetas.
A manhã nascera ensolarada e bonita.
Pouco depois, o mestre, um senhor esguio, de maneiras calmas, batera palmas como sinal do início dos trabalhos escolares.
Um menino veio dar sua lição de leitura. Outros faziam contas nas pedras.
E, como sempre, o tempo ia passando naquela suave tarefa de aprender, no doce silêncio do arrabalde, raro a raro quebrado pelo pregão de um vendedor de frutas, pelo tropel de um cavalo.
Inesperadamente um carro parou à porta da escola. Aberta a portinhola, desceu primeiro um velho de fardão, e em seguida um homem de sobrecasaca e cartola, de barba loura, com ares muito simples.
O professor, que o vira pela janela, ergueu-se surpreso, exclamando:
— É Sua Majestade o Imperador!
Sabia, como toda gente, ser Pedro II hóspede de Pernambuco, havia dias; não ignorava que o monarca andava visitando os estabelecimentos de ensino, sempre interessado pelo estudo. Mas supor que fosse a modesta escola que regia também honrada com aquela visita, isso nunca supusera. Um recanto de subúrbio, tão longe da cidade, tão pobre!
O Imperador, de chapéu na mão, seguido pelo ministro, entrara na sala, cumprimentara ao mestre e fizera questão de se sentar ao seu lado, como simples inspetor, a fim de assistir a um pouco da aula.
Mostrava-se atento a tudo e balançava a cabeça, risonho, quando os alunos se saíam bem.
Depois, ele próprio, chamou o menino, perguntou-lhe:
— Qual o rio maior do Brasil?
E a outro:
— Faça-me esta conta de dividir.
Ainda a outro:
— Quais são os mandamento da lei de Deus?
Obtidas respostas certas, o monarca, passeando entre as bancas, examinara os cadernos de exercícios, corrigira uma letra, gabara um cursivo, acarinhara as cabeças das crianças que o olhavam cheias de espanto.
Um rei era assim tão bom e tão amigo dos pobres?! Faziam uma idéia diferente da realeza!
Afinal, o Imperador despediu-se, elogiando o professor, prometendo-lhe melhoramentos para sua escola.
Ao sair, o professor quis beijar a mão do soberano, em sinal de respeito, mas o Imperador, com ar de bondade, dispensou-o daquela homenagem dizendo-lhe:
— Os mestres é que precisam de que os alunos lhe beijem as mãos.
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Em: Encantos Literários: antologia, organizado pela Professora Deomira Stefani, São Paulo, Ática: s/d
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Mário Rodrigues Sette (Recife, PE 1886 — 1950) professor, jornalista, contista, cronista e romancista. Veja: www.mariosette.com.br
Obras:
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Ao clarão dos obuses, contos, 1914
Rosas e espinhos, contos, 1918
Senhora de engenho, romance, 1921
A filha de Dona Sinhá, romance, 1923
O vigia da casa grande, romance, 1924
O palanquim dourado, romance, 1921
Instrução Moral e Cívica, didático, 1926
Sombra de baraúnas, contos, 1927
Contas do Terço, romance, 1928,
A mulher do meu amigo, novela, 1933
João Inácio, novela, 1928
Seu Candinho da farmácia, romance, 1933
Terra pernambucana, didático, 1925
Brasil, minha terra! , didático, 1928)
Velhos azulejos, parábolas escolares, 1924
Os Azevedos do Poço,romance, 1938
A moça do sítio de Yoyô Coelho, contos, s/d
Maxambombas e maracatus, crônicas, 1935
Arruar, crônicas, 1948
Anquinhas de Bernardas, 1940
Barcas de vapor, 1945
Onde os avós passaram, s/d
Memórias íntimas,s/d







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