Pensando em Londres no último dia das Olimpíadas de 2012

12 08 2012

Catedral de São Paulo, vista da  Ponte de Waterloo, s/d

A. R. Quinton (Inglaterra, 1853-1934)

Gravura

Se eu ganhasse na loteria, compraria uma quitinete em Londres.  Fora o Rio de Janeiro é a minha cidade favorita.  Este lugar na minha preferência não foi atingido por uma idealização de adolescente.  Na minha primeira maturidade, lá pelos meus vinte anos, eu teria escolhido Paris.  Mas mudei.  Prazer e trabalho já me levaram muitas vezes a Londres e ao interior da Inglaterra.  Este é um dos poucos países que já visitei absolutamente sozinha, mais de uma vez.  E não foi para ficar no conforto de um hotel, participando de alguma conferência para depois voltar ao aeroporto e retornar ao aconchego de casa.  Não.  Já rodei estrada no país da Rainha Elizabeth II.  E vim a realmente gostar do interior da Inglaterra e sobretudo de Londres, talvez a mais internacional de todas as cidades europeias que conheço.  Hoje, não chego a ser uma anglófila, mas admiro muito da cultura inglesa, de sua literatura ao seu sistema judicial.  Foi pensando no final das Olimpíadas de 2012, quando os holofotes se apagarão sobre essa cidade, que voltei a ler Ponte-Rio Londres, de Elsie Lessa, e passo para vocês aqui, hoje, essa homenagem.  Elsie Lessa também amou essa cidade.  Talvez sua descrição pareça antiga, afinal é dos anos 80 do século passado, mas o que mudou não é suficientemente relevante para que não tenhamos uma boa visão do que é viver na capital inglesa.

Essa Londres que eu amo

“—Está na moda, a começar pelos próprios ingleses, falar mal dela, desta cidade maternal e poderosa que, ao envelhecer, é meio abandonada pelos filhos o que, afinal, acontece um pouco a todas as mães. E ao ser abandonada, ainda acha jeito de melhorar por isso, fica mais tranquila e digna, menos rumorosa e poluída. Dizem que está suja e desleixada, vai ver que está, para quem anda pelas ruas sujas, decerto as há. Suja comparada com que, ainda me pergunto.  Pois o que mais conheço dela são os seus parques e praças de árvores centenárias, em que daqui a pouco vai começar a mansa e lenta canção do cair das folhas. São os mais belos e bem tratados parques do mundo e, decerto, quem toma conta deles são gnomos e fadas, pois raramente se vê alguém podando a grama de veludo verde ou varrendo as aleias, fora o vento e as pombas.

Sim, Londres hoje é mais uma cidade de gente que não nasceu nela, como eu, e aqui veio para morar e estudar, trabalhar ou usufruir, turistas à procura do teatro e da televisão melhores do mundo, dessa riqueza parada à nossa espera de museus e galerias de arte, conferências e concertos.

Para quem mora, num dia-a-dia que nos engole, com as diferentes tarefas que é impossível deixar de fazer, bom mesmo é saber que ela está ali, prenhe de todas as possibilidades, exposições se renovando (os Picassos de Picasso, no momento, estão com filas à porta, como em Paris de onde veio). A cinema quase não vou, se tenho um leque farto de filme à escolha, só de girar o botão da televisão.

Minha Londres é vitoriana, até nos móveis que procuro, essa dos velhos casarões de alto pé-direito, com um palmo de jardim e quintal atrás. Meus bairros, desde que aqui cheguei, são South Kensington e Chelsea, dia que vou a Bond Street e me dou ao luxo turístico de um chá no Ritz me sinto desembarcada, viandante e passageira aqui, com todo o “excitement” de quem viaja. Onde estão seus quase oito milhões de habitantes, que não me perturbam com a sua presença, afinal? Em quatro anos, nunca vi um engarrafamento de tráfego digno desse nome, dia em que ouço buzina é um acontecimento, esbarrão na rua nunca levei.  É uma gente que fala baixo e não gosta de ouvir falar alto, numa terra em que barulho é palavrão. É escapar entre as nuvens um raio de sol, correm todos para os parques, sem fazer barulho. Espicham-se na grama, fazem piqueniques, aproveitam o que pensam que é verão.

Às vezes, de puro masoquismo, fico pensando nas saudades que terei, quando não estiver mais aqui e me for roubado este simples cotidiano, sem acontecimentos, de sacola na mão para as compras, numa rotina meio estafante, em que só saber que esta cidade está em roda me faz bem. Com todas as suas possibilidades, de que não irei desfrutar, mas que me fazem mais rica, como cidadã de passagem”.

Em: Ponte Rio-Londres, Elsie Lessa, Rio de Janeiro, Record: 1984


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2 responses

12 08 2012
Avatar de Luciana Pimentel Luciana Pimentel

Também adoro Londres! Estou com saudades pois não vou lá desde 98. Já me planejei e em fevereiro de 2013 estarei lá.

13 08 2012
Avatar de peregrinacultural peregrinacultural

Eu sabia que você tinha bom gosto!

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